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Ó Herman faz-me lá um Haiku…

 



Quem é Herman Van Rompuy? Quem??? Herman o quê??? Repetimos, Herman Van Rompuy? Será Herman Van Rompuy um belo príncipe? Um refinado ladrão de jóias? Um jovem ferido num duelo pela honra da sua amada? Será porventura um rico industrial de salsichas enlatadas? Ou talvez seja um afamado cabeleireiro de senhoras?

Em síntese, não sabem, pois não? Isso já nós sabíamos. Mas não se preocupem, que nós estamos aqui para vos apoiar e dizer-vos quem é Herman Van Rompuy.

Herman Van Rompuy foi o Primeiro Ministro da Bélgica entre 2008 e 2009. Foi igualmente o Presidente do Conselho Europeu desde 2009 até 2014. 

Pronto, agora já todos sabem quem é Herman Van Rompuy. Mas, dito isto, e depois? Que acrescenta isso à nossa felicidade? 

Há umas semanas, Herman Van Rompuy esteve na cidade japonesa de Onjuku, não como político, pois já se retirou dessas andanças, mas sim como embaixador internacional da poesia Haiku. Atualmente dedica-se a promover pelo mundo inteiro esta ancestral forma de poesia japonesa, para que venha a ser considerada Património Cultural Imaterial da Humanidade. 

Ao falar de Haikus, Herman Van Rompuy entusiasma-se e transforma-se em alguém muito distinto da imagem pública com que se apresentava na época em que foi Primeiro Ministro belga e líder da União Europeia. É muito natural que assim seja, afinal de contas, quem é que não se entusiasma a falar de Haikus?

Vejamos um exemplo de um Haiku:

Ah este caminho

que já ninguém percorre

a não ser o crepúsculo

Enquanto politico, os seus discursos, fosse em reuniões de trabalho ou em conferências de imprensa, eram muito breves e concisos. Iam directamente ao ponto, ou seja, ao cerne do questão, não se perdendo em assuntos laterais ou em polémicas vãs.

Há por aí apaixonados das tecnologias digitais, que consideram a poesia Haiku como uma espécie de antecedente longínquo das mensagens curtas das redes sociais. Razão pela qual, comparam os actuas Tweets aos ancestrais poemas Haiku. Concluem então, que se na antiguidade já existissem Smartphones, não se teriam escritos Haikus, mas sim Tweets. Consequentemente, não valeria a pena perdermos tempo com velharias orientais, uma vez que temos algo de equivalente e muito mais moderno. 

Tal como nas mensagens curtas das redes, os Haikus são textos concisos, onde só podem ser usadas um número limitado de palavras. Por consequência, em ambos os casos, trata-se de textos quase minimalistas, mas simultaneamente carregados de sentido e que vão directamente ao cerne da questão.

Vejamos dois exemplos da semelhança entre a brevidade verbal da poesia Haiku e as mensagens das redes sociais. Comecemos com um breve e conciso Haiku do grande mestre Matsuo Bashô (1644-1694):

Quero ainda ver
nas flores no amanhecer
a face de um deus.

Vejamos um igualmente breve e conciso Tweet do antigo Presidente dos Estados Unidos da América, Donald J. Trump:

Sorry losers and haters, but my IQ is one of the

highest -and you all know it! Please don't feel so

stupid or insecure, it's not your fault

Apesar das óbvias semelhanças em brevidade e concisão, é nosso entender que as dissemelhança são mais importantes. Ao contrário do que genericamente sucede nos bombásticos textos das redes sociais, na poesia Haiku cultiva-se antes a delicadeza ao invés da estridência. Os Haikus desvelam significados não através de palavras fortes e expressões indignadas, mas sim como se evocassem frágeis fragrâncias. Não estimulam discussões acintosas, nem ofensas, nem maledicências. Estimulam sim o silêncio, o recolhimento interior e a imaginação de quem lê ou escuta. 

A poesia Haiku baseia-se fundamentalmente em imagens simples e melancólicas da natureza. Há Haikus que nos falam do canto das cigarras, outros do verão e de finos quimonos de algodão, ou ainda outros que referem a cor das hortênsias e o esvoaçar das mariposas.

A poesia Haiku teve origem nos templos do Japão. Templos para onde os monges se recolhiam para meditar e contemplar a harmonia da natureza nos seus mais ínfimos  detalhes. Era no meio desse silêncio que os rodeava, que escutavam a sua voz interior, essa mesmo que lhes sussurrava os seus breves poemas. 



Se nos quisermos afastar da cacofonia das redes sociais e dos muitos outros ruídos  comunicacionais e auditivos que repetidamente nos consomem, há lugares em Portugal e no mundo para o fazermos. Lugares místicos, de silêncio e de recolhimento interior, onde ao invés de estarmos continuamente agarrados aos Smarthphones, podemos voltar a escutar.

Deixamos-vos duas reportagens com sugestões de viagens:

https://elpais.com/eps/2022-04-10/en-busca-del-silencio.html

https://brasil.elpais.com/brasil/2015/12/21/elviajero/1450698035_756826.html

Alguém ainda sabe quem é Herman Van Rompuy? Não. Pois então tomem lá mais uns Haikus:

caídas as flores 

de cerejeira, eis o templo -

através dos ramos

Que glória

as folhas verdes as folhas novas

sob a luz do sol

Silêncio:

as cigarras escutam

o canto entre as rochas


No guião de aprendizagem "O Mundo Flutuante", tentámos que  ouvissem o silêncio, que recolhessem e contactassem com o seu interior, e que escrevessem haikus. 


Guião de aprendizagem " O Mundo Flutuante"


https://drive.google.com/file/d/1abcrohCFGBMCLPszbVPKklpTIgz7qKFr/view?usp=sharing




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