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A mostrar mensagens de setembro, 2022

Tudo a saltar do lugar

  Pensemos na cidade de Maastricht... Nada nos ocorre.  Pensar em Maastricht é pensar em nada. Se pensarmos em Veneza, Paris, Nova Iorque ou no Rio, imediatamente evocamos imagens, sons e histórias, mas com Maastricht não. Pensemos, por exemplo, em Roma. Lembramo-nos das suas ruínas, das suas fontes barrocas, e dos tantos gatos que passeiam pelos becos e vielas e vão saltando de telhado em telhado. Para os gatos de Roma, a cidade eterna não tem fronteiras. Em Maastricht não há gatos pelas ruas. Mas que sabemos nós de Maastricht?  Sabemos que deu o seu nome a um tratado europeu. Durante anos, os noticiários falavam com bastante frequência do Tratado de Maastricht. Que mais sabemos nós? Sabemos que fica na Holanda. Melhor dizendo, nos Países Baixos, designação oficial do país que até há pouco se chamava Holanda. Que estranho povo deve ser esse, para ao fim de séculos, decidir administrativamente trocar o nome do seu país. Holanda é um nome bonito, Países Baixos nem tanto.  Que destino ma

Será a transdisciplinaridade sexy ou leviana?

  Será a transdisciplinaridade sexy ou leviana? Que estranha questão! Que relação terá uma coisa a ver com as outras? É o que agora vamos descobrir. Ponhamos outros exemplos de relações pouco evidentes: o que tem a EMAEI a ver com a EMEL? E a LPNM com a LGBT? E a CP com o CCB? Em princípio, nenhumas destas coisas terá muito que ver com as outras, exceto todas serem designadas por siglas. E que relação há entre um ser monocelular, um monobloco, um monocórdico e um monodocente? Também neste caso, em princípio, não há nenhuma relação óbvia, exceto o prefixo mono. Mas se porventura usarmos a imaginação, facilmente estabelecemos relações verosímeis entre coisas aparentemente díspares: “Era uma vez um monodocente monocórdico que estava a dar uma aula de ciências num monobloco sobre seres monocelulares…” Claro que monobloco, monocelular , monocórdico e monodocente não são palavras particularmente estimulantes nem excitantes. São palavras que pouco apelam aos sentidos, palavras nada sensuais.

Dar a matéria é fácil, o difícil é não a dar

  “We choose to go to the moon in this decade and do the other things, not because they are easy, but because they are hard."   Completaram-se, no passado dia 12 de setembro, seis décadas desde que o Presidente John F. Kennedy proferiu estas históricas palavras perante uma multidão em Houston.  À época, para o homem comum, ir à Lua parecia uma coisa fantasiosa e destinada a fracassar. Com tantas coisas úteis e prementes que havia para se fazer na Terra, a que propósito se iria gastar tempo e recursos para se ir à Lua? Ainda para mais, sem sequer se ter qualquer certeza que efetivamente se conseguiria lá chegar. Todavia, em 1969, a Apolo 11 aterrou na superfície lunar e toda a humanidade aclamou entusiasticamente esse enorme feito. O que antes parecia uma excentricidade, ou seja, ir à Lua, é o que hoje nos permite comunicar quase instantaneamente com alguém que está do outro lado do mundo. Como seriam as comunicações neste nosso século XXI, se há décadas atrás ninguém tivesse lança

All you need is a Girl and Gun

  Era assim que Godard, o mais inovador, iconoclasta e provocador de todos os cineastas vivos ou mortos, definia a essência do cinema: a girl and a gun. Fez o que queria, tornou-se imortal e depois morreu. Foi assim que no dia do seu desaparecimento, um título de jornal resumiu quem ele era numa só frase. No nosso tempo vivemos completamente submersos por imagens. Uma criança dos dias de hoje, vê mais imagens num só dia, do que os homens de séculos antigos viam numa vida inteira. Até ao final do século XIX e à invenção da fotografia, as imagens eram coisas raras, frequentemente sagradas. Apenas as havia nas igrejas, nos palácios e nas casas de nobres ou de ricos mercadores.  Que efeitos terá na nossa consciência, na nossa condição humana, em síntese, em quem somos, o facto de estarmos constantemente rodeados por imagens desde a mais tenra idade? A resposta a isso, ainda ninguém a sabe, mas Godard foi um dos primeiros a lançar ao mundo essa interrogação. Os seus filmes são tentativas de

Polícias e ladrões

  Morreu um dos maiores fotógrafos de sempre, William Klein (Nova Iorque 1926 - Paris 2022). Foi um original e inovador fotógrafo de moda, mas foi sobretudo um grande retratista da vida urbana.  As ruas e avenidas das grandes urbes, nomeadamente as de Manhattan, são o seu grande tema, a matéria com qual compõe a sua poesia visual. Ao longo do século XX, Nova Iorque foi continuamente povoando os nossos sonhos e pesadelos. Transformou para sempre a dimensão e estilo daquilo que tememos e daquilo com que sonhamos. Redefiniu a nossa ideia de beleza com as imagens de glamour vindas da moda, Wall Street ampliou imensamente o nosso conceito de o que é ser rico e dos esplendores e misérias que lhe andam associados, o cinema fez-nos acreditar em histórias de amor “Bigger than life” e, por fim, assombrou-nos com pesadelos a uma escala inimaginável em qualquer outro lugar, como aquele que ainda há poucos dias se assinalou, o 11 de setembro. William Klein foi um dos que mais e melhor contribuíram

Que grande tourada para aqui vai!

  Quem foi jovem na década de 60 do século XX, é provável que se recorde de Bob Dylan. Um cantor que revolucionou a música popular e que representava a rebeldia dessa época. Não foram nada poucas as touradas em que esteve envolvido. A sua vida, estilo, poesia e música são um autêntico catálogo de como se ser anti-sistema.  As suas letras são de alto calibre literário, já as suas qualidades vocais são questionáveis. Tanto assim, que alguém carinhosamente o alcunhou como o fanhoso do Minnesota (a sua terra natal). Não é uma alcunha simpática, como nunca são, mas podia ter sido pior. O que nos importa aqui, é que com passar do tempo, quer o grande público, quer as mais nobres instituições políticas e sociais, deixaram de o considerar um rebelde e um anti-sistema e integraram-no. Atribuíram-lhe as mais altas honrarias do estado norte-americano e, inclusivamente, e para surpresa geral, foi laureado com o Prémio Nobel da Literatura.  O homem não compareceu à cerimónia de entrega do Prémio No