Continuamos a nossa temporada estival fechados em casa, não vale a pena tentarem convencer-nos a sair, a ir passear, pois temos uma disciplina férrea, um espírito militar e do lar nestas férias, ninguém nos vai tirar.
Posto isto, estamos prontos para iniciarmos o oitavo episódio desta nossa série de verão, “Como fazer turismo sem sair de casa”.
Para celebrarmos a nossa determinação e inquebrável vontade de não sair de casa, nada melhor do que viajarmos até à Alemanha, uma nação onde impera o rigor, a exigência e a auto-disciplina, até parece uma prestigiada escola privada.
A Alemanha é muito grande, constituiu-se no século XIX, a partir da junção de vários reinos e principados. É maior que todos os distritos de Portugal juntos, mais os arquipélagos da Madeira e dos Açores. Vejam lá bem o tamanho que aquilo tem!
À partida a Baviera, no sul, é uma das escolhas óbvias, pois é a região mais turística e linda da Alemanha. Tem a sua maior fronteira com a também linda Áustria, e como que a prolonga.
Os Alpes, os lagos, os bosques e uma certa doçura e musicalidade no modo de viver, são afins de um e do outro lado da fronteira, quer na Baviera, quer na Áustria. Aliás, um dos maiores ícones da Áustria, Sissi a jovem imperatriz, nasceu, cresceu e viveu na Baviera, até ao momento de partir para Viena, para esposar o Imperador Austro-húngaro Franz Joseph I. Evento e casamento dos quais nunca se recompôs plenamente durante a vida inteira.
A outra grande figura da Áustria, Wolfgang Amadeus Mozart, era filho de Leopold e Anna Maria, ambos bávaros. Também ele passou grande parte da sua infância e juventude na Baviera, local no qual foi feliz e a que voltou frequentemente ao longo da sua breve existência.
Em certo sentido, os austríacos foram espertos, anteciparam-se e “roubaram” o lucrativo negócio do merchandise de Sissi e Mozart aos bávaros, transformando-os a ambos em ícones da Áustria.
‘Tá mal, não se faz.
Em certo sentido, Walt Disney lucrou muito mais com a exploração comercial da imagem da Baviera, do que os próprios bávaros.
‘Tá mal, não se faz.
Nós solidarizamo-nos com os bávaros e contamos com o apoio de quem nos lê, portanto, nem mais um filme de desenhos animados da Disney. A partir de agora, cinema de animação, só filmes experimentais alemães, como um de Hans Ritcher, de precisamente há um século, “Rhythm 23”.
Seja a pequenada, sejam os mais graúdos, tudo se vai divertir a valer com as aventuras e desventuras de uns quantos quadrados brancos e de outros tantos retângulos negros. É ver:
Abaixo, uma foto do Castelo de Neuschwanstein, mandado erguer por Ludwig II, o antepenúltimo monarca da Baviera. Depois dele houve outros dois, mas em 1914 o reino foi desfeito e a Baviera passou a ser parte da República Federal da Alemanha.
Os bávaros nunca estiveram particularmente interessados em fazer parte integrante da Alemanha. Serem parte de uma nação de comedores de salsichas, não era algo que lhes agradasse, todavia, não tiveram outra hipótese, a força das armas impôs-se.
O Chanceler Otto von Bismarck (1815-1898) e o Kaiser Guilherme II (1859-1941), ambos prussianos, foram muito insistentes no convite e não houve outro remédio, que não aceitar.
A Baviera sempre foi a região mais próspera da Alemanha. Entre as empresas bávaras contam-se algumas tão conhecidas como a BMW, a Audi, a Adidas, a Puma, a Allianz, a Siemens e a Knorr. Poder-se-ia acrescentar a esta lista o Bayern de Munique, de longe o mais poderoso clube de futebol alemão, vencedor do campeonato germânico há onze anos seguidos.
A Alemanha beneficia enormemente da contribuição da Baviera para a sua imagem e para o seu o PIB, o contrário é que já não se pode afirmar. A injustiça é tanta, que é na Baviera que se produz a maior parte da riqueza alemã, mas não foi lá, como seria natural, que as autoridades governamentais decidiram instalar o Deutsche Bank e as principais instituições financeiras do país, mas sim em Frankfurt. Em certo sentido, poder-se-ia dizer que ‘tá mal, não se faz.
Os bávaros que estejam descansados, que mais uma vez contam com a nossa solidariedade e também com a dos nossos leitores. Nem mais uma lata de salsichas de Frankfurt havemos de comprar, a partir de agora, salsichas, só do talho.
Se querem saber, a nossa tese é a de que bebem para esquecer, que ao longo da história têm sido constantemente enganados. Ele foram os austríacos com merchandise da Sissi e do Mozart, ele foi o Walt Disney com os palácios e castelos e ele foi o Deutsche Bank Depois de tudo isto, o melhor mesmo é mandar vir mais umas quantas canecas.
Os bávaros sofrem muito, pois por todo o mundo, todos os associam ao estereótipo do típico alemão: um ser frio, distante e autoritário. Contudo, eles dizem-se ser um povo de poetas, de artistas, de músicos e de sonhadores.
Não temos como discordar, não por acaso, o maior dos pintores germânicos, Abrecht Dürer, era bávaro. Assim como o era Richard Strauss, cuja música é de um lirismo absoluto. Era-o também o cineasta Rainer Werner Fassbinder, que realizou um dos grandes êxitos de sempre do cinema alemão, o muito melodramático “Lili Marleen”.
Mas donde veio então essa fama dos alemães de serem frios, distantes e autoritários? A resposta óbvia é a de que veio da época dos horrores do Terceiro Reich. No entanto, essa fama já vinha de antes e teve origem na Prússia do século XIX, durante a época do Chanceler Otto Von Bismarck.
Bismarck impôs-se pela força, para isso necessitou da determinação, do rigor e da disciplina do exército da Prússia. Em síntese, “to make a long history short”, o estereótipo do típico alemão frio, distante e autoritário, baseia-se na política prussiana de então.
A secular capital da Prússia, atual capital da Alemanha, é Berlim. É essa a nossa segunda escolha, a última paragem desta nossa viagem. Mas descansem, que não nos vamos demorar muito, só lá vamos para apanhar o avião.
O ex-líbris de Berlim é o muro que durante décadas a dividiu. Desde que caiu, é possível adquirir os seus pedaços por uma quantia bastante razoável, que vai desde os dez aos trinta Euros.
Se porventura os nossos leitores quiserem adquirir pedaços do muro de Berlim, podem contatar-nos. Nós temos milhares de bocados desse entulho. Podem confiar na sua autenticidade e, sobretudo, não vale a pena ligarem a boatos espalhados pela nossa maldosa vizinhança, de que cada um desses pedaços do muro de Berlim que vos dispensamos pela simbólica quantia de vinte cinco euros a peça, provém das obras que fizemos em nossa casa.
A nossa vizinhança é tão invejosa, que até diz, que neste verão ficámos em casa nas férias, porque gastámos um dinheirão em obras. É tudo mentira, ficam já a saber. Dito isto, aguardamos os vossos contatos. Aproveitem esta rara oportunidade para adquirirem um pedaço de História para o vosso lar.
Como é patente, nós temos os nossos leitores na conta de pessoas cultas e informadas, no entanto, só para o improvável caso de recebermos muitos contatos para comprar pedaços do muro de Berlim, avisamos desde já a clientela, que também possuímos um raro bikini usado por Sissi jovem imperatriz numa viagem secreta a Waikiki, assim como um par de ténis, que Mozart calçou quando compôs “Eine Kleine Nachtmusik”.
Os ténis estão um bocado usados, mas são um marco histórico. Se houver quem queira dar um milhar de euros por eles (valor negociável), nós estamos dispostos a cedê-los.
Mas o quê? A Nike pode e nós não? Se a Nike pode vender ténis ao som da música de Mozart, nós também podemos fazê-lo:
Bom, a ideia era pararmos em Berlim, mas só pelo tempo necessário para apanharmos o avião de regresso a casa. E que melhor sítio para o fazermos, do que o histórico aeroporto berlinense Tempelhof.
Tempelhof é um belíssimo aeroporto. Foi inaugurado em 1928. A História e as histórias que a si estão associadas, são imensas e absolutamente extraordinárias. Há uma fascinante visita guiada em que as contam. Há também quem lhe chame “a mãe” de todos os aeroportos.
O único problema de Tempelhof, é que desde há muitos anos, de lá não levanta nem aterra um único avião. Assim sendo, é perfeito para nós, que viajamos sem sair de casa, ou seja, tanto nos faz que haja ou não haja aviões.
E pronto é precisamente a partir de Tempelhof que fazemos a nossa viagem de regresso da Alemanha, aterramos no novo aeroporto de Lisboa, apanhamos um táxi e vamos para a casa, donde aliás nunca saímos.
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