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Se Portugal não tivesse imigrantes, não havia cá nada para ver, nem sequer bisontes.


Saíram ontem notícias em todos os jornais, que há bisontes em Portugal. Há uma grande alegria no ar, pois aparentemente os bichos são potenciais heróis climáticos. Como são grandes herbívoros, diminuirão o risco de incêndios ao reduzirem a vegetação inflamável e criarem corta-fogos naturais.

Os bisontes não nasceram cá, vieram da Polónia, são imigrantes. O que nós podemos dizer, é que vieram no dia certo, o Dia de Portugal.


É 10 de junho, Dia de Portugal, e o que há a fazer é celebrar os estrangeiros que por cá se instalaram. Sem eles, praticamente tudo o que nos define não existiria, nem património, nem monumentos e nem sequer hino.

Há por aí muito quem diga, que a vinda de imigrantes é necessária por causa dos seus descontos para a segurança social, pela falta de mão-de-obra e pelas baixas taxas de natalidade, nós dizemos mais, sem eles, nem sabíamos quem éramos e qual a nossa história, tanto agora, como dantes.
É precisamente por essa razão, que neste longo texto vamos celebrar uns quantos, mais especificamente seis, ou seja, cinco mais um, no caso, uma. Cinco históricos e uma atual.

Comecemos por celebrar um imigrante vindo dos antigos países de leste, Martell Károly. Um húngaro que nasceu em 1695 em Bratislava, hoje capital da Eslováquia, mas que à data fazia parte da Hungria. Já com 38 anos de idade veio para Portugal à procura de trabalho.

Uns tempos depois, foi nomeado para o cargo de Arquiteto dos Paços Reais e das Ordens Militares. Foi no exercício dessas suas funções, que teve um papel absolutamente crucial na reconstrução de Lisboa, após o terramoto de 1755.
Com efeito, aquilo a que chamamos Baixa Pombalina, foi uma uma invenção surgida da intensa colaboração de dois arquitetos, o português Eugénio dos Santos e o estrangeiro Martell Károly.

O traçado inovador, geométrico e racionalista, com ruas largas, alinhadas e quarteirões homogéneos, prédios de fachadas simples que repetem uma harmonia de proporções, demonstra-nos que a preocupação dos arquitetos não foi apenas a de reconstruir, mas também a de renovar e de reinventar.

O plano concebido para a baixa da cidade revela-nos o espírito verdadeiramente vanguardista de quem o desenhou, pois para a época, tudo isso era algo de completamente radical, que assentava numa visão urbanística e arquitetónica sem precedentes.

Em síntese, sem a imigração vinda leste, a Baixa Pombalina tal como hoje a conhecemos, certamente não existiria, e haveria em Portugal muito menos que ver.

Mas para além disso, Martell Károly, cujo nome com o tempo se aportuguesou para Carlos Mardel, foi também um dos responsáveis pelo desenho do Aqueduto das Águas Livres, tendo sido ele apenas e enfrentado duríssimas críticas, quem concebeu e decidiu instalar a Mãe d'Água junto ao Jardim das Amoreiras em Lisboa.

A arquitetura desse lugar, que assinala o fim do aqueduto e o término da viagem da água desde as nascentes até à cidade, tem o seu quê de encantatório, pois as sólidas pedras com que se ergue, espelham-se na liquidez da água, originando assim uma infinitude de imprevisíveis reflexos que quase se diria serem mágicos.

Apesar de ser um sítio pouco conhecido, a Mãe d’Água é um dos lugares de Portugal onde mais há para ver.


Viajemos agora até ao norte do país, ao Porto. Quem vem e atravessa o rio, para a outra margem do Douro, estando junto às caves onde o vinho envelhece, vê um velho casario que se estende até ao mar, ao alto coroado por uma enorme torre.

É esse o perfil da cidade do Porto que todos reconhecem e querem ver, ruelas e calçadas da Ribeira até à Foz, pedras sujas e gastas, lampiões tristes e sós, um ar grave e sério num rosto de cantaria, que pelas colinas acima se eleva até ao seu ponto máximo, ao seu pináculo, a Torre dos Clérigos.


Nascido em 1691 em San Giovanni Valdarno na Toscana, Nicolau teve uma vida de imigrante e andou por vários lugares, mas sabe-se que em novembro de 1725 já estava no Porto, onde acabou por se fixar para sempre.

O nome original deste imigrante era Niccoló, e o seu apelido Nasoni. Foi ele quem projetou a Igreja dos Clérigos e a respetiva torre. Uma vez terminada a igreja, iniciaram-se em 1754 as obras daquela que viria a ser a mais bela e altaneira torre, dominando toda a paisagem urbana do Porto. Ergue-se a uma altura de 75 metros, terminando num belo e audacioso coroamento.

Sem o imigrante Nicolau Nasoni, o que haveria no Porto para se ver seria bem distinto do que há. Não seria certamente semelhante à Torre dos Clérigos para a qual Jorge de Sena escreveu um sentido e complexo poema:

Para a minha alma eu queria uma torre como esta,
assim alta,
assim de névoa acompanhando o rio.

Estou tão longe da margem que as pessoas passam
e as luzes se reflectem na água.

E, contudo, a margem não pertence ao rio
nem o rio está em mim como a torre estaria
se eu a soubesse ter...
uma luz desce o rio
gente passa e não sabe
que eu quero uma torre tão alta que as aves não passem
as nuvens não passem
tão alta tão alta
que a solidão possa tornar-se humana.

Nicolau Nasoni está sepultado na Igreja dos Clérigos, mesmo junto à torre que desenhou.


Ferdinand August Franz Anton Koháry von Sachsen-Coburg-Gotha nasceu em Viena em 1816, todavia, ao ser-lhe concedida a nacionalidade portuguesa em virtude de se ter casado com a rainha D. Maria II, instalou-se por cá, tendo chegado a Lisboa a 8 de abril de 1836 com os papéis já todos tratados.

Uma vez acomodado, Ferdinand August Franz Anton Koháry von Sachsen-Coburg-Gotha foi dar uma volta pelo país de que era rei por casamento. Assim sendo, visitou o Convento de Mafra, o Convento de Cristo em Tomar e o Mosteiro da Batalha.

Ferdinand August Franz Anton Koháry von Sachsen-Coburg-Gotha reparou que todos esses monumentos estavam praticamente abandonados e num estado semi-ruinoso.

Abaixo uma gravura do Século XIX do Mosteiro da Batalha.


Tendo então Ferdinand August Franz Anton Koháry von Sachsen-Coburg-Gotha concluído a sua volta por Portugal, visitou seguidamente na capital o Mosteiro dos Jerónimos, a Torre de Belém e a Sé, tendo verificado que estes monumentos não estavam em melhor estado do que os restantes edifícios históricos de outras zonas do país.

Vai daí, o homem teve uma ideia que em Portugal nunca a ninguém tinha ocorrido, ou seja, pôr em marcha projetos de restauração e manutenção dos monumentos. E se bem o pensou, melhor o fez. Estamos em crer, que se porventura não o tivesse feito, hoje em dia em nenhum desses locais haveria algo para ver além de pedras soltas e ervas daninhas.

Contudo, Ferdinand August Franz Anton Koháry von Sachsen-Coburg-Goth marcou também a paisagem nacional de uma outra maneira. Com efeito, foi ele que mandou construir o Palácio da Pena em Sintra e assim iniciou a fama romântica dessa vila. Para tal recorreu a mão-de-obra estrangeira, mais concretamente ao arquiteto alemão Wilhelm Ludwig von Eschwege.


Em 1850 o alfaiate Hans-Christian Keil, que tempos antes tinha emigrado da Alemanha para Portugal, teve um filho ao qual chamou Alfredo. Uns quantos anos mais tarde, Hans mandou o filho Alfredo para Nuremberga, para que ele aí estudasse desenho e música.

Alfredo regressa a Portugal com vinte anos, e dedica o resto da sua vida à pintura, à poesia e à música. O seu trabalho obteve um apreciável sucesso tanto de público, como de crítica. As suas principais obras pictóricas podem atualmente ser vistas ou no Museu do Chiado ou na Casa-Museu Dr° Anastácio Gonçalves.


Contudo, Alfredo Keil passou à posteridade sobretudo por em 1890 ter composto a melodia de “A Portuguesa”, ou seja, o atual hino nacional. A canção não foi originalmente escrita para hino, isso só sucedeu vinte anos depois, em 5 de outubro de 1910. Porém, Alfredo Keil nunca o chegou a saber pois morreu em Hamburgo, a 4 de outubro de 1907, onde tinha ido submeter-se a uma operação cirúrgica.

Neste momento já acolhemos no nosso texto imigrantes de leste, bem como do norte e do sul da Europa, temos agora um vindo do Médio-Oriente, Calouste Gulbenkian.

Foi uma sorte imensa, que na Primavera de 1942, acompanhado pela mulher, a secretária francesa, um cozinheiro oriental, um massagista e um criado, Gulbenkian chegasse a Lisboa. Quando desembarcou, o Tejo ter-lhe-á trazido à memória a sua Constantinopla de infância e por isso decidiu ficar.

Ficando, legou a Portugal uma vasta coleção de arte, que nos permite contemplar em território nacional artistas tão importantes como Rembrandt, Rubens, Guardi, Turner, Monet e Manet.

É bom de ver, que noutras cidades europeias, como Londres, Paris, Madrid, Florença, Munique, Viena, Amsterdão, Bruxelas ou Estocolmo há extensas coleções de arte dos grandes mestres. No entanto, em Portugal, ao longo da história, nem a realeza, nem a nobreza, nem a aristocracia foram dadas a coisas espirituais, razão pela qual, com excepção do digno Museu Nacional de Arte Antiga, pouco por cá há para ver. Valeu-nos um imigrante vindo de Oriente para haver por aqui algo que se veja.


Já indo este texto deste dia 10 de junho longo, vamos terminar, mas não sem antes celebrarmos uma imigrante do século XXI. A nossa escolha é Golgona Anghel, uma poeta portuguesa que nasceu na Roménia.

Nascida em 1979 veio ainda em criança para Portugal e por cá cresceu e se fez poeta e mulher. Como é evidente, Golgona Anghel ainda não teve tempo para atingir a dimensão e a importância dos restantes imigrantes históricos de que hoje falámos, mas não faz mal, um dia lá chegará.

A poeta é autora de livros como “Crematório sentimental” de 2007, “Vim porque me pagavam” de 2011, “Como uma flor de plástico na montra do talho” de 2013 ou “Nadar na piscina dos pequenos” de 2018.

Vejamos uns tantos poemas de Golgona Anghel, três, que foi a conta que Deus fez. O primeiro intitula-se “Esta é a melhor altura do ano”:

Esta é a melhor altura do ano
para cortar o cabelo, profere Sandy,
remexendo com a ponta dos dedos
alguns fiozinhos na testa.
A porra da lua atrai as marés,
cria tsunamis, invade o Japão,
provoca uma crise nuclear,
porque é que não haveria de fazer
crescer o cabelo?

Deus puxa os poetas pelos cabelos, explica Hölderlin
acrescento então,
preocupada com a importância literária do assunto.
Mas, para ter a certeza,
quis perguntar a um especialista,
isto é, a qualquer uma das mulheres
que estavam agora a fazer fila
à entrada do Ginásio Clube Português
como os grandes bandos de antílopes Impala
à beira de um pântano,
num documentário na Animal Planet.

Quis dizer-lhes que o dinheiro, a idade não conta,
que amanhã é outro dia,
mas depois lembrei-me dos terramotos,
da crise nuclear, do IVA,
e fiquei calada.

Agora um segundo poema, este chama-se “Poeta na Praça da Alegria” e muito a propósito do dia de hoje, diz-nos algo sobre o que é ser português:

Não sou infeliz. Não, não me quero matar. 
Tenho até uma certa simpatia por esta vida
passada nos autocarros,
para cima e para baixo.
Gosto das minhas férias 
em frente da televisão.
Adoro essas mulheres com ar banal
que entram em directo no canal.
Gosto desses homens com bigodes e pulseiras grossas. 
Acredito nos milagres de Fátima
e no bacalhau com broa. 
Gosto dessa gente toda.
Quero ser um deles. 

Por fim, o terceiro e último poema, “Antigamente os bisontes eram gente”:

Antigamente os bisontes eram gente
e namoravam as raparigas
mais bonitas da aldeia.
Os judeus tinham cauda e
os homens menstruavam duas vezes por mês.

Ninguém se queixava de nada.
Tudo tinha o seu lugar.
Líamos Tolstoi num Skoda,
Hölderlin num Trabant descapotável,
Joyce num Aston Martin,
Camões num UMM.

As grandes emoções
vinham das palavras longas:
astralopitecos, jerusalamaleques,
extremaunçãoparaumapernadepau, etc.
Isto explica tanta coisa,
mas não vem nos livros de história.
A história faz apenas ecoar o passado.
Como um búzio.
O passado é o lugar onde os nossos ex
se juntam aos mamutes, à Céline Dion
e ao Windowns XP.


E pronto, terminamos como começámos o texto deste Dia de Portugal, com bisontes.

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