A imagem acima é a da estação de metro situada perto do sítio onde dantes em Nova Iorque se erguiam as Twin Towers. A estação foi desenhada e concebida de modo a simbolizar uma ave mítica, Fénix, a renascida das cinzas.
Há sítios e edifícios que são votados ao abandono, pois a dado momento já não servem a função para a qual foram originalmente concebidos. Outros colapsam, seja tal pela ação humana, seja pela das forças da natureza. Há ainda outros que simplesmente se vão desvanecendo com o decorrer do tempo, até pouco mais serem que uma mera ruína.
No entanto, e dito isto, há sítios e edifícios que resistem, e que, mesmo sendo abandonados, fustigados por chuvas e ventos, e sofrendo com a passagem do tempo, se reerguem, qual fénix das cinzas renascida. Nova Iorque é lugar óptimo para isso.
Num vale por onde corre o rio Hudson, a cerca de uma hora de distância a norte de Nova Iorque, decidiram em 1929 erguer uma fábrica de caixas de cartão para os biscoitos da marca Nabisco, uma das mais conhecidas da América. A fábrica trabalhou ininterruptamente desde essa data até 1990, tendo chegado a empregar mais de seiscentos homens em simultâneo.
Depois a fábrica fechou e o edifício por ali ficou, com a sua arquitetura feita sobretudo de tijolo e aço. Permaneceu como a memória de um momento marcante da melhor arquitetura industrial norte-americana.
Construída na terceira década do século XX, The High Line era uma linha férrea que atravessava todo o West Side de Nova Iorque. Uma vez em funcionamento, dia e noite por ela passavam continuamente comboios de mercadorias e de passageiros desde a 33rd Street até à 14th Street, que ficam bastante longe uma da outra.
Toda essa zona era densamente povoada, com imensos prédios de um e outro lado da linha, sendo que, por lá as casas eram mais em conta, pois que, a toda hora abanavam com a vibração das carruagens.
As gentes habitantes do sítio, fosse de manhã, de tarde ou de madrugada, despertavam continuamente à passagem de cada comboio. Concluindo, em redor da The High Line dormiu-se mal por muitas e várias décadas do século XX.
Foi no inicio da década de oitenta que passou o último comboio pela The High Line, uma vez que já não era economicamente rentável. Assim sendo, foi encerrada. Uma vez abandonada, o tempo foi passando, a natureza foi tomando conta da The High Line e, quando se chegou ao século XXI, quase que parecia que havia uma floresta selvagem num sítio não muito distante do centro de Nova Iorque.
Em 11 de setembro de 2001, as Twin Towers vieram abaixo, ninguém se esquece disso. O fotógrafo Joel Meyerowitz foi quem melhor soube captar a atmosfera irreal desse funesto acontecimento.
Ninguém como Meyerowitz conseguiu criar imagens que, mesmo sendo de um acontecimento único, tivessem em si qualquer coisa de universal que atravessasse a história da humanidade.
Se imaginássemos que quando se deu a queda dos grandes impérios da antiguidade, como o do Egipto, da Grécia ou de Roma, já existisse a fotografia, certamente que as imagens que então seriam captadas, teriam muitas afinidades com as que Meyerowitz captou após o 11 de setembro.
Temos portanto três exemplos, uma fábrica abandonada a norte de Nova Iorque, uma linha férrea inutilizada e deixada à sua sorte e um atentado terrorista que mais pareceu um cataclismo de dimensão universal, tal foi a destruição que causou.
Vamos agora verificar como todos, qual fénix renascida, se reergueram. Comecemos pela fábrica de caixas de biscoitos. Tendo sido o edifício abandonado em 1990, em 2003 reabriu como um imenso museu de arte contemporânea. Tão grande, que sozinho, tem mais espaço que quase todos os museus de arte contemporânea juntos de Nova Iorque.
A Dia Art Foundation adquiriu o espaço, para que artistas cujas instalações fossem grandes, ou mesmo enormes, pudessem ter um local para expor as suas obras de um modo permanente.
Abaixo uma obra do escultor Richard Serra (1938-2024), um artista que com as suas esculturas de aço maciço testava os limites da gravidade.
O imenso espaço industrial da antiga fábrica de caixas de biscoitos, é hoje em dia um lugar de cultura, contudo, a sua renovação não esconde o seu passado e as suas origens. Quem entra no local, sabe imediatamente que está a introduzir-se numa antiga unidade industrial, não tem quaisquer dúvidas acerca de tal.
Abaixo uma obra de Louise Bourgeois (1911-2010), “Crouching Spider” de 2003.
A segunda situação é a The High Line. Após ter sido encerrada, foi condenada ao desdém. A natureza tomou conta dela, e os comerciantes das redondezas e vizinhos começaram a requerer às autoridades locais que ela fosse demolida.
Porém, houve quem tivesse tido ideia melhor. A sugestão foi a de que, e se ao invés se proceder à demolição da The High Line, ela fosse antes transformada num extenso jardim horizontal que se prolongasse por quilómetros.
Por uma vez, a utopia venceu. Surpreendentemente, a The High Line foi renovada, e passados apenas uns poucos meses dessa renovação, passou a ser um dos mais populares locais para se passear em Nova Iorque. Abaixo uma foto.
Na verdade, The High Line passou não só a ser um local para se passear, mas também para se estar e conversar. É um daqueles raros milagres em que algo que estava destinado a desaparecer para sempre, renasce.
Não há dúvidas que há de ser belo passear uns bons metros acima do solo, tendo pela frente largas vistas, e por entre altos andares, tipo um sexto, um sétimo ou até décimo quinto. A seguir mais uma foto The High Line, sítio onde a vegetação muda de cor e de aspeto conforme a estação, não a de comboio, mas a do ano.
O que queremos dizer com este segundo exemplo, o The High Line, é exatamente o mesmo que quisemos dizer com a antes fábrica, e hoje museu da Dia Art Foundation, ou seja, que ambas qual fénix renasceram das cinzas, mas que o fizeram não eliminando as suas origens e memórias.
Assim como quem entra na Dia Art Foundation sabe imediatamente que entrou num antigo espaço industrial, também quem percorre o jardim de The High Line sabe logo que está numa obsoleta linha de comboio.
Por fim, vamos ao terceiro sítio, ao local onde antes se erguiam as Twin Towers, as quais, a 11 de setembro de 2001 foram destruídas e derrubadas num atentado terrorista.
No chamado “Ground Zero”, erguem-se agora todas as noites dois feixes de luz, que de algum modo fazem renascer as Twin Towers que antes ali estavam.
Mas depois, nesse mesmo sítio, há imensos memoriais, que não apagando o que ali se passou, trazem ainda assim a quem lá vai o consolo, de que todos os que no dia 11 de setembro de 2001 desapareceram, não desapareceram, ou seja, que aquele lugar serve única e exclusivamente para os recordar.
Em síntese, os muitos que nesse dia desapareceram, através da arquitetura que renovou o sítio, o “Ground Zero”, renascem a cada dia no olhar e na memória de todos que por ali passam. Em resumo, também aqui, como nos nossos dois exemplos anteriores, a renovação do local incorporou em si a sua origem, história, feridas e cicatrizes.
Terminamos com os sites destas três fénix’s renascidas:
Comentários
Enviar um comentário