Há atualmente em exibição, um filme que conta a história de um arquiteto, e que tem obtido até ao momento, um imenso sucesso entre o grande público. Sendo mesmo o dito filme, o principal candidato ao triunfo nos Óscares de Hollywood. O nome da referida película é “O Brutalista”.
A nós parece-nos importante, que a arquitetura não seja um assunto exclusivo de arquitetos e especialistas, mas sim que seja um tema para o público em geral. Por assim ser, agrada-nos o êxito de “O Brutalista”, pois cremos que todos devem poder usufruir, falar, apreciar e discutir arquitetura, e isto não só em termos utilitários, mas também e sobretudo, em termos estéticos.
É no usufruto estético da arquitetura, que vamos centrar este nosso texto. Começamos por afirmar, que aprender a usufruir esteticamente de um edifício, é algo que deve ser ensinado tanto quanto possível a jovens e adultos, mas igualmente a crianças.
Todavia, ao contrário do que sucede noutras paragens, não há em Portugal suficientes atividades ou materiais dedicados ao público infantil cujo tema seja a arquitetura. Há umas quantas coisas acerca dos principais edifícios históricos, como o Mosteiro das Jerónimos, o da Batalha ou o Convento de Tomar, mas de resto, pouco mais.
No que se refere a atividades ou materiais sobre arquitetura moderna e contemporânea para crianças, no nosso país não há praticamente nada, é quase um deserto. No entanto, há um excelente livro editado em 2015, que constitui uma meritória excepção a este triste panorama: “Mãos à obra: cada casa a seu dono” de Didier Cornille.
O livro apresenta às crianças onze casas que marcaram a arquitectura moderna e contemporânea, desde o século XX até ao início do século XXI. Casas essas, que foram concebidas e projetadas por arquitectos tão célebres, como por exemplo, Le Corbusier, Frank Lloyd Wright, Mies Van Der Rohe, Frank Gehry ou Siza Vieira.
Mas se não há grande coisa disponível para crianças e jovens, também não há muito mais para adultos. Infelizmente, em Portugal, a arquitetura é um tema que interessa a muito poucos. Exceptuando especialistas e as gentes que são do ofício, não há assim muitos mais.
Noutros países, a fruição estética da arquitetura é um tema relativamente corrente. Só a título de comparação com o que sucede na nossa nação, veja-se que o jornal espanhol com maior circulação, no caso o El Pais, publicou nas suas páginas um artigo intitulado “Os 20 melhores edifícios do século XX”:
Ainda a título de comparação, veja-se que um jornal tão popular como o britânico The Guardian, publicou uma lista com os melhores edifícios do século XXI:
Só para terminar as comparações entre a nossa e as outras nações, constate-se que em França, até uma revista de moda, como a Vogue, tem também uma reportagem dedicada aos melhores edifícios modernos e contemporâneos de Paris:
O que estes três exemplos nos demonstram, é que a arquitetura noutros países não é um tema exclusivo de especialistas, mas sim um assunto para toda a gente e por isso aparece em revistas e jornais de grande tiragem.
A esse mesmo propósito, repare-se que a Unesco, a organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura, decidiu há uns anos que a cada triénio deveria existir uma Capital Mundial da Arquitetura, uma iniciativa que visa divulgar e preservar o património arquitetónico urbano e dá-lo a conhecer ao maior número de pessoas possível.
Em 2026 a Capital Mundial da Arquitetura será Barcelona, em 2023 foi Copenhaga e em 2020 foi o Rio de Janeiro. Abaixo o Museu de Arte Contemporânea de Niterói desenhado por Oscar Niemeyer.
Por cá, a arquitetura continua a ser tema para um público restrito, e salvo raríssimas excepções as iniciativas e publicações que existem destinam-se sobretudo a especialistas. No entanto, um português não-arquitecto, pode aprender algo sobre essa disciplina vendo filmes.
Ainda não vimos “O Brutalista” portanto acerca dele não temos muito para dizer, mas vimos outros filmes antes, e sabemos que com esses é possível ir aprendendo a ver arquitetura.
Vamos a três exemplos. Comecemos por “La Sapienzia”, um filme de 2014 realizado por Eugène Green. A história narra-nos as desventuras conjugais de Alexandre, um arquiteto de meia-idade. Todavia, em certas cenas Alexandre reflete sobre as formas e significados que podemos vislumbrar em determinados edifícios.
A Roma barroca, as suas fontes, palácios e igrejas, foi quase toda ela inventada por dois arquitetos rivais, Borromini (1599-1667) e Bernini (1598-1680). Na cena abaixo, Alexandre disserta sobre o uso que ambos fazem das ovais e elipses, e de como tudo isso se interliga intimamente com as distintas, e até opostas, personalidades de Bernini e Borromini:
Um segundo filme que nos ensina a ver arquitetura é "The Fountainhead", em português, "A vontade indómita". Foi realizado em 1949 por King Vidor, e conta-nos a história de um arquiteto que atribui mais importância aos seus ideais éticos e estéticos, do que propriamente ao facto de ter ou não ter clientes.
Howard Roark é um arquiteto com pouco trabalho devido ao facto dos seus desenhos serem ousados e bastante originais. Mas dito isto, mesmo com poucas ou nenhumas encomendas, há muito quem lhe reconheça o brilhantismo.
Nisto, o concelho de administração de um importante banco aprova o seu projeto para construir uma nova e grandiosa sede. Claro que Howard fica contente, contudo, por pouco tempo.
Na cena abaixo vemos o momento em que é comunicado a Howard que o seu projeto foi aprovado, todavia, logo de seguida, propõem-lhe umas "pequenas" alterações, isto de modo a que o edifício tenha um aspeto mais clássico. Howard, que é um profundo crente nas linhas e estruturas modernas, fica chocado e acaba por recusar uma tão grande oportunidade. Em síntese, nesta cena podemos compreender como a estética arquitetónica moderna e contemporânea é por vezes abastardada com intenção de agradar ao suposto gosto do grande público.
O terceiro e último exemplo cinematográfico que nos ensina a contemplar arquitetura é o filme de Jacques Tati, "Playtime". O que nele podemos ver é como a arquitetura e o design moderno também têm os seus problemas. É ver para perceber.
Com estes três excertos de filmes, mesmo não sendo nós especialistas em arquitetura, conseguimos perceber a rebeldia presente numa elipse, a hierarquia estabelecida por uma forma oval, como o classicismo pode ser um sintoma de conformismo e mau gosto e, por fim, como os excessos do modernismo por vezes nos deixam atrapalhados e confusos. Em síntese, aprendemos a apreciar esteticamente construções e edifícios.
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