Há por esse país afora uma corrente pedagógica, segundo a qual as aprendizagens seriam tão mais significativas, quanto o currículo de cada escola estivesse adaptado à realidade económica do local onde se situa. Neste sentido, ao dia de hoje, no Algarve haveria um currículo em cujo turismo fosse o tema central, na Serra da Estrela seria a pastorícia e na região do Douro era o vinho o que mais importava.
Não discordamos totalmente da ideia. Em boa verdade, gostamos de ir a banhos ao Algarve, de saborear um bom queijo da serra e consideramos que uma pinga de vinho nunca fez mal a ninguém. Consequentemente, se a escola puder contribuir para que as atividades locais prosperem e sejam fonte de riqueza e desenvolvimento das populações, por nós, tudo a favor. Dito isto, ainda bem que somos de Lisboa.
E ainda bem porquê? Não por termos um qualquer complexo de superioridade relativamente à província, não é disso que se trata, as nossas razões são poéticas e de espanto. Não somos contra a articulação entre a escola e a economia local, cremos é que a mais nobre função da escola é a de transformar o conhecimento da realidade em poesia e espanto. É a isso que chamamos aprendizagens significativas.
Uma aprendizagem significativa não se esquece. Funda-se num instante poético, ou seja, num momento de espanto que nos marca para sempre ao rasgar os nossos horizontes e nos leva a conhecer o que desconhecemos e as viagens por lugares onde nunca fomos. Uma aprendizagem significativa, dá-se quando com espanto poético, a mente se põe a vadiar e, para vadiagens, não há outro lugar como Lisboa e o Tejo.
Aprender tendo como base a realidade económica de uma localidade ou região será importante, aprender sendo-se sensível à poesia de todas as coisas e com espanto pela vastidão do que existe, é muito mais do que isso, é fundamental.
É certo que haverá espanto e poesia em escolas de um qualquer local de Trás-os-Montes, do Minho ou do Alentejo, todavia, em Lisboa temos o privilégio de termos uma bússola nos indica o caminho para onde navegarmos. Existe o Tejo que nos convida a todas as descobertas ao abrir-nos horizontes sem fim. O Tejo que é como um cais de espanto e poesia, um porto de partida para outros lugares. Dizia Pessoa, “Pelo Tejo vai-se para o mundo”
Como facilmente poderão verificar, Lisboa é uma presença constante nos muitos guiões de aprendizagem que neste blog já publicámos. Contudo, não é propriamente a realidade económica local, o que mais nos interessa. A nós interessa-nos o que permanece e tem um significado fundo. Por consequência, a nossa aposta pedagógica centra-se em aprendizagens duradoiras que não sejam arrastadas pela corrente. Aprendizagens que nos acompanhem ao longa de uma vida. Tal e qual o Tejo, rio que mesmo vadio, acompanha Lisboa ao longo de toda a sua história.
Não é da sua arquitetura de que agora desejamos falar, mas sim do seu trabalho como fotógrafo. Em 1958 deu-se um acontecimento histórico para a cidade. Não um daqueles acontecimentos que diária e repetidamente, os noticiários nos anunciam em grandes parangonas como sendo “histórico” e rapidamente é arrastado pela corrente e cai no esquecimento. Deu-se um acontecimento verdadeiramente significativo. Passou quase inapercebido, mas diante dele há um antes e um depois. Conjuntamente com o também arquiteto e fotógrafo Costa Martins, Victor Palla concebeu o mais importante e aclamado Photobook português, o histórico “Lisboa cidade triste e alegre”.
Nesse livro, as fotos de Lisboa e do Tejo convivem com poemas de Fernando Pessoa, Almada Negreiros, Gil Vicente, Camilo Pessanha, Mário de Sá-Carneiro e Cesário Verde. Recentemente, a RTP 2 transmitiu um documentário acerca desse livro. Pode ser visto em:
Vale pena vê-lo para sabermos quem antes éramos, quem depois fomos e o quão significativa é a nossa história. Vale pena vê-lo para nos espantarmos com a cidade e sentirmos a poesia desse rio que desde tempos imemoriais nos atravessa e nos acompanha.
Só nós e alguns vadios te queremos, ó Tejo.
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