Aplicámos um guião de aprendizagem cujo um dos objetivos era que os alunos compreendessem que uma imagem, seja esta fotográfica, pictórica ou cinematográfica, é sempre determinada pela posição do enquadramento. O objetivo era que os alunos aprendessem a VER. Numa época em que como nunca antes na história, somos diariamente bombardeados com milhares de imagens, suspeitamos que a sociedade actual produz muito mais imagens do que aquelas que consegue saudavelmente digerir, consequentemente, deveria fazer parte da educação de qualquer criança aprender a lê-las e a selecioná-las.
São poucas as imagens inocentes, a maior parte delas quer algo de nós, seja convencer-nos que uma determinada política é a melhor ou seja vender-nos um certo produto. Há inclusivamente muitas imagens que nos querem dizer como devem ser os nossos corpos e o que devemos fazer para vivermos uma vida de felicidade total e absoluta. Por tudo isto, aprender a ler as imagens, é a única forma de resistir ao seu imenso poder sedução.
A mensagem que uma imagem nos transmite é muito diferente se esta for enquadrada de cima para baixo (Plongée) ou de baixo para cima (Contra-Plongée). Para os alunos, foi fácil compreender esta diferença.
No caso das imagens cinematográficas, não é apenas o enquadramento que importa, o números de planos e a ordem em que são montados, é também algo de estruturante.
Para nosso verdadeiro espanto, quase sem que ninguém lhes tivesse dito nada, os alunos intuíram imediatamente o que era um plano e como a ordem da montagem influía na narrativa. Sucedeu em várias turmas.
É espantoso que na nossa época, a noção de plano cinematográfico possa ser intuitiva nas crianças. É uma noção que em décadas não muito distantes da nossa, exigia algumas explicações complexas e algum grau de sofisticação no olhar. Que actualmente crianças de 8 ou 9 anos intuam tão facilmente o que é um plano, demonstra-nos que nos últimos tempos houve uma transformação radical na nossa relação com as imagens.
De tão habituadas a conviver com ecrãs desde a mais tenra idade, as crianças de hoje lidam com as imagens de um modo muito diferente daquele que nós, gente de outrora, lidávamos. Por isso, as olhámos com espanto.
A primeira exibição de um filme aconteceu no Salão Grand Café, em Paris, em 28 de dezembro de 1895. Só em 1925, três décadas depois, é que alguém percebeu que o número de planos e a ordem sequencial como se fazia a montagem, era algo de estruturante para realizar um filme. Esse alguém foi Serge Eisenstein, uma figura central na evolução da linguagem cinematográfica. Inventou uma nova conceção da montagem e do ritmo e ordem dos planos. O filme onde pela primeira vez Serge Eisenstein aplicou as suas teorias intitula-se “O Couraçado Potemkine”
A mais célebre sequência deste filme retrata um massacre na escadaria do porto de Odessa. É considerada uma das cenas mais influentes da história do cinema, pois nela podemos constatar como o número e a ordem da montagem dos planos é absolutamente determinante para o carácter dramático de toda a ação.
O que há um século foi uma descoberta fundamental para a constituição de uma nova linguagem, é hoje em dia apreendido por crianças de um modo quase intuitivo.
Citando Sá de Miranda, ’pasmado e duvidoso do que vi, m’espanto às vezes…
Aqui ficam os dez minutos mais marcantes da história do cinema, são imagens dramáticas da bela cidade de Odessa.
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