Os professores ganham pouco, os
futebolistas ganham bem mais. Porque será?
Um professor é essencial para educar as futuras gerações, é um pilar da sociedade, uma referência e etc e tal, consequentemente, em termos ético-sociais, vale muito. Já em termos de carcanhol, não vale lá essas coisas. Um futebolista mais não faz do que andar em trajes menores a correr atrás de uma bola, o que pouco ou nada adianta à humanidade, contudo, em termos de dinheirito, vale milhões.
Sendo este o contexto, somos tentados a
acreditar que nenhum futebolista tem problemas financeiros, o que nem sempre é
verdade. George Best (1946-2005) é talvez o mais claro exemplo disso mesmo.
Best foi um dos melhores futebolistas de sempre. Mas foi muito mais do que
isso, foi uma autêntica estrela à escala planetária. Ganhou rios de dinheiro e
no final da década de 60 era conhecido como o quinto Beatle. Não porque tivesse
qualquer talento musical, mas sim pela fama e estilo de vida que ostentava.
Anos depois de se ter retirado, as suas finanças andavam pelas ruas da amargura. Questionado por um jornalista sobre o destino que tinha dado ao dinheiro, respondeu: “Gastei a maior parte em carros desportivos, mulheres e álcool. O resto desperdicei”.
Os professores (ou as professoras, para
o caso é igual) jamais poderão dizer o mesmo, o mais que eventualmente poderão
dizer é: “Gastei a maior parte do dinheiro no supermercado, na prestação da
casa, na água, na luz, na eletricidade e na gasolina. O resto…mas qual resto.”
Perante esta disparidade, é normal que a
classe docente se interrogue sobre os motivos pelos quais não aufere
rendimentos semelhantes aos de um futebolista. Porque não têm os professores
(ou as professoras, para o caso é igual) direito a ter carros de luxo, a
namoriscar com super-modelos e a beber do bom e do melhor? Porque têm os
professores portugueses (ou as professoras, para o caso é igual) de se resignar
com um veículo utilitário, com um cônjuge de trazer por casa e com zurrapas
feitas com tudo, até com uvas? É uma grande injustiça, essa é que essa.
Fôssemos nós comentadores televisivos especializados
em economia, e diríamos que esta situação tem que ser vista num contexto mais
amplo e global, a saber, ao nível da macroeconomia. A macroeconomia é o “nec
plus ultra” (o mais que tudo, traduzimos nós, para algum eventual nosso leitor
não versado no latim) do comentário económico.
Na macroeconomia impera a lei fundamental do capitalismo, a lei da oferta e da procura. Qualquer pessoa, economista ou não, é capaz de a entender. À medida que a oferta de um bem aumenta, o seu preço cai, e à medida que a procura por um bem aumenta, o seu preço também aumenta.
Mesmo sendo fácil de entender, não nos
escusamos a dar-vos um exemplo, é a nossa veia pedagógica a manifestar-se.
Imaginemos que numa livraria há dois livros cujos custos de produção foram exatamente
idênticos. Imaginemos que um dos livros é a obra da apresentadora televisiva
Cristina Ferreira, muito enfaticamente intitulada “Para cima de put…”.
Para termos uma ideia de que trata o
livro, recorramos às palavras da muito conhecida autora: “Muitos considerarão
que este título e o que aqui mostro constituem mais uma provocação. É verdade,
este livro é uma provocação, uma chamada de atenção. Mas é também um testemunho
que acredito que posso deixar. O que aqui mostro pretende ser uma abertura de caminho
para uma análise sociológica que é preciso fazer”.
Imaginemos que o segundo livro é uma
edição dos sonetos do escritor português Luís Vaz de Camões. À semelhança do
que fizemos com a muita conhecida Cristina Ferreira, deixamos-vos também aqui
algumas palavras deste menos conhecido autor, neste caso em forma de verso:
Os bons vi sempre passar
No mundo graves tormentos;
E para mais me espantar
Os maus vi sempre nadar
Em mar de contentamentos.
Apesar de os dois livros terem tido
idênticos custos de produção, os seus preços de venda são diferentes: a obra de
Cristina Ferreira possui um preço alto, 17.70 €, enquanto a obra de
Luís Vaz de Camões possui um preço baixo, 7.25€. Isto sucede porque as obras
Cristina Ferreira são muito procuradas e vendem centenas de milhares de
exemplares, havendo um público imenso disposto a adquiri-las. Por outro lado, as
obras de Luís Vaz de Camões, não obtém o mesmo sucesso. São pouco procuradas e
a oferta chega e sobra para as encomendas, sendo por isso, que custa bastante
menos.
Acreditamos que ninguém ponha em causa
que o valor literário da obra de Camões é superior ao do da Cristina Ferreira,
porém, não é disso que aqui tratamos, mas sim do valor monetário.
O que a lei da oferta e da procura nos
demonstra, é que o valor monetário de um serviço ou produto não é objetivo, mas
sim subjetivo. O valor monetário de um serviço ou produto é determinado pela
intensidade e quantidade de pessoas que (subjetivamente) acreditam ou não, que
valha a pena adquiri-lo.
Vivendo nós num sistema capitalista,
ficar indignado pelo facto de aquele ser humano que estudou boa parte da sua
vida, tem uma rotina cansativa e trabalha para educar as futuras gerações,
ganhe um salário inferior comparado com com o de um futebolista, cuja função
não é tão importantes para a sociedade quanto a do docente, é uma ingenuidade.
Para quem eventualmente seja assim tão ingénuo, não aconselhamos nem a Cristina Ferreira nem o Camões, aconselhamos sim a leitura atenta de um livro inspirado pela influente Escola Austríaca de Economia, que logo no início do século XX conceptualizou a teoria do valor subjetivo. O livro intitula-se “Subjektive Werttheorie - Entsehung, Zielsetzung, Kritik”. Não cremos que esteja editado em português, mas aprendemos com Cristina Ferreira que com boa vontade, esforço e trabalho tudo se consegue. Força.
Um professor ganha menos que um
futebolista, porque o mercado futebolístico possui mais valor do que o mercado
educativo, ou seja, há um número incomparavelmente maior de pessoas que
preferem gastar o seu tempo e dinheiro com o futebol do que com a educação.
Nos sistemas capitalistas, o que
efetivamente determina a remuneração, não é a importância da profissão, mas sim
o valor monetário que essa atividade consegue gerar. Um bom professor pode
realmente gerar valor monetário para seus alunos, mas gera valor apenas para
uma pequena quantidade de pessoas ao ano. Os futebolistas têm um alcance nacional,
alguns mundial. Milhões de pessoas consomem os seus serviços, gerando assim
enormes receitas para os seus empregadores e patrocinadores, que, por
consequência, não hesitam em pagar-lhes salários elevados.
Em Portugal, um futebolista da terceira
de divisão ganha em média entre dois mil e tal a três mil euros, limpos. Da
terceira divisão, note-se bem. Claro que se for um futebolista da segunda
divisão ganhará bastante mais, da primeira ainda mais e se for à seleção tem
a vida feita.
Em Portugal, os rendimentos dos
professores estão tabelados. Em termos salariais tanto faz faltar muito como
faltar pouco, que os alunos aprendam como não aprendam, dá igual, no fim do mês
ganha-se o mesmo. Acrescente-se a isto, um sistema de avaliação docente absolutamente
ridículo.
No Japão, há bónus salariais e
possibilidade de acelerar a progressão na carreira para os professores que
queiram ir dar aulas nas escolas mais problemáticas do país, facto que tornou
esses lugares muito concorridos.
Na Estónia, houve uma grande evolução
salarial atribuída a professores de escolas que arriscassem inventar e aplicar
métodos criativos de ensino. O resultado foi que a carreira de professor passou
a ser uma das mais cobiçadas.
Na década de 70, a Finlândia tinha um
sistema educativo medíocre e ineficaz. Em poucas décadas alçou-se ao topo dos
rankings mundiais. A educação foi a base que fez com que um país pobre e
atrasado, se transformasse numa economia sofisticada e altamente
industrializada.
A autora Pasi Sahlberg escreveu um livro
sobre esse tema, livro que também aconselhamos: “Finnish Lessons”. Citemos uma
passagem: “A preocupação central da escola finlandesa não é atingir recordes de
desempenho escolar, mas sim ajudar a desenvolver as aptidões de uma criança a
fim de formar indivíduos capazes de viver vidas felizes, dentro e fora da
escola".
A receita finlandesa incluiu também
reduzir o número de horas de aulas, limitar ao mínimo os trabalhos de casa, os
testes e os exames escolares.
A carreira de professor é atualmente a
preferida entre os jovens finlandeses, à frente de profissões como Medicina,
Direito e Arquitetura.
E em Portugal? Aparentemente vamos
vivendo como habitualmente, por tempo indeterminado...
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