Estamos em crer que o atual impasse nas negociações na área da educação entre o ministério, os sindicatos e os professores, se deve à fraca qualidade e inventividade das cadeiras onde todos se sentam. Fossem as cadeiras melhores, mais divertidas e originais e tudo seria certamente diferente.
Que parvoíce, pensarão alguns dos nossos leitores. Qual é efetivamente a importância de uma cadeira? Talvez quem nos leia estranhe esta questão, pois estará habituado a que, o que aqui escrevemos, se foque em temas de grande elevação intelectual e metafísica, e não propriamente em corriqueiras peças de mobiliário.
Talvez quem nos
leia, creia que uma cadeira é um objeto meramente utilitário, uma coisa
quotidiana, de trazer por casa, que serve tão-somente para nos sentarmos e com
a qual nem valeria a pena gastarmos o nosso latim, nem os leitores perderem o
seu tempo.
Mas desengane-se quem assim pensa, pois o facto, é que uma cadeira é por vezes algo de tão decisivo nas nossas vidas, que chega a ser uma questão de vida ou de morte.
Prometemos aos nosso leitores, que ao escrevermos sobre cadeiras, proporcionaremos a quem nos lê uma profunda e acurada reflexão transversal, que irá desde a vida de cada indivíduo como um ser único e insubstituível, até à vida de todos nós como um coletivo nacional e, inclusivamente, transnacional. Não fazemos a coisa por menos.
Duvidam? Acham
que é perda de tempo falar de cadeiras? Estão cépticos? Pois então
acompanhem-nos.
Comecemos por um
exemplo. Imaginemos que estamos sentados numa cadeira de uma qualquer sala de
espera de uma repartição pública. É muito provável, que em tal ocasião, nem
sequer se repare na cadeira onde se está sentado.
Não é de estranhar que assim seja, pois a sala de espera de uma repartição pública, é um local místico, perfeito para os espíritos contemplativos. Ficamos para ali à espera, absortos, a ver as horas passar e “a pensar na morte da bezerra”. Como que nos abstraímos do nosso próprio corpo e de tudo em seu redor. Consequentemente, nem sequer nos apercebemos se a cadeira onde estamos sentados é de madeira, de plástico ou de um outro qualquer material.
Cá está,
pensarão agora os nossos leitores mais cépticos, bem dizíamos que não valia a
pena perdermos tempo com este assunto. Como o próprio exemplo apresentado
demonstra, argumentarão esses mesmos leitores, as cadeiras não têm grande
importância.
Mas não se vão
já embora, pedimos encarecidamente nós, esperem mais um poucochinho, deixem-nos
expor as nossas razões. Tenham fé.
Voltemos à sala
de espera de uma repartição pública. Nós, quem vos escreve, quando temos
oportunidade de ir até esse local tratar de algum premente assunto legal, é
certo e sabido que vamos lá passar o dia sentados.
Gostamos especialmente de olhar para o monitor onde vão surgindo os números das senhas de atendimento. Esse olhar, é um prolongado prazer que se estende no tempo e nos faz atingir um estado quase Zen: 21…22…47…98…153…
- Ah, que bom! E ainda faltam outros 153 números para chegar a nossa vez. Excelente, magnífico. Temos ainda umas horas de continuado deleite pela frente…172…201…
Poderíamos
continuar pela vida fora, sentados numa repartição pública, como que em êxtase,
a olhar para os números do monitor, todavia, quando a espera se torna muito
longa, o corpo começa a dar de si.
Pensarão os
nossos leitores, que é por causa da idade, que o corpo começa a dar de si. Que
quando éramos mais novos, podíamos até passar vários dias seguidos sentados
numa repartição pública, que andávamos frescos. Só que não, o problema não é de
todo em todo esse. É outro. O problema são as cadeiras.
Ao fim de umas tantas horas sentados, os ossos do corpinho começam a estalar e parecem já não encaixar uns nos outros. Começamos então a sentir, aquilo a que tecnicamente se designa como “estar descadeirado”.
Ora bem, aqui
chegados, começa a ser evidente, até para os nossos leitores mais cépticos, o
papel crucial que uma cadeira pode ter para o desenvolvimento e prosperidade da
nação.
Ponhamos o
seguinte cenário: um político ou um empresário de sucesso desloca-se a uma
repartição pública para declarar os seus rendimentos, bens e pagar os
respetivos impostos.
Está todo
contente da vida por fazer as suas contribuições fiscais, nisto, passam-se umas
tantos horas e o político ou empresário de sucesso fica descadeirado. Pronto,
está tudo estragado. Não aguenta o desconforto, tem de recolher ao seu doce lar
para se repousar e, ainda antes de conseguir voltar à repartição, há alguém na
comunicação social que descobre que o homem não tem a papelada em ordem e zás.
Temos escândalo a abrir os noticiários.
Nada disso
sucederia se porventura as cadeiras da repartição pública fossem mais
confortáveis. Muitas das recentes polémicas e escândalos tinham sido evitados.
Todos teriam a situação fiscal regularizada e não haveria esta sensação de que
toda a gente é corrupta e etc e tal.
Sendo este o
contexto, hão de os nossos leitores concordar, que as cadeiras são fundamentais
para o bem-estar da nação. É ou não é? Ah, pois é! Não tinham pensado nisto,
pois não? Confessem lá!
Contudo, as
cadeiras onde nos sentamos, não são apenas uma questão que influencia a nossa
vida coletiva, a sua influência é também decisiva a um nível estritamente
individual.
Em termos
pessoais, uma cadeira pode ter consequências bem mais ponderosas do que apenas
uma passageira desarticulação da ossatura ou uns meros impostos por pagar.
Imaginemos que, por algum mal fadado acaso do destino, como acontece amiúde nos
filmes americanos, fôssemos condenados por um juiz a sentarmo-nos numa cadeira
eléctrica! Safa! Cruz credo!
Seria altamente improvável, que numa situação dessas, não considerássemos a cadeira na qual nos iríamos sentar como um dos momentos mais importantes e decisivos das nossas vidas. Certo?
Cremos que o
nosso ponto inicial está provado. Mesmo os mais cépticos dos nossos leitores,
estarão agora plenamente convencidos, que uma cadeira não é um objeto
despiciendo, que pode eventualmente até ser uma questão de vida ou de morte.
Por consequência, estarão agora de acordo, que afinal de contas é um tema sobre
o qual vale a pena trocar umas ideias. É ou não é?
Para quem não
saiba, fica agora a saber, que as cadeiras são também grandes protagonistas da
história. Há uma cadeira que está indissociavelmente ligada à história do
século XX português. É a cadeira da qual Salazar literalmente caiu. A queda
teve como consequência, que o então Presidente do Conselho de Ministros sofresse
uma série de lesões cerebrais, que obrigaram o regime a afastá-lo do poder.
Em certo
sentido, é possível afirmar que a transição do Estado Novo para a democracia,
se iniciou com uma cadeira. Abaixo, uma foto da época com a histórica cadeira.
Bem sabemos que
o símbolo da transição para a democracia são os cravos, porém, também ninguém
poderia levar a mal, se ao invés dos cravos, o símbolo dessa transição fosse
uma cadeira. Talvez com o interior forrado a vermelho, porque não?
Uma vez estabelecida
teoricamente e com consistentes exemplos a extrema importância das cadeiras
para a vida coletiva das nações e para a vida individual de cada cidadão,
poderíamos então terminar o nosso texto por aqui, mas não.
Como nós também
gostamos de propor atividades para os tempos livres de quem nos lê, damos-vos
uma sugestão para um “Weekend-Break”, que isto a vida não é só trabalho.
Sugerimos a
cidade de Copenhague, capital do reino da Dinamarca. Qualquer turista menos
avisado de visita a Copenhague, vai inevitavelmente querer tirar uma selfie
junto a um dos seus mais conhecidos monumentos, a estátua da Pequena Sereia,
personagem principal da história com o mesmo nome, escrita por Hans Christian
Anderson, o mais ilustre cidadão de Copenhague.
Não o façam, é o
nosso conselho, deixem-se de histórias.
Concentrem-se
antes no segundo mais ilustre cidadão de Copenhague, o arquiteto e designer
Arno Jacobsen. Em 1957 projetou uma escola que ainda hoje é uma referência pela
sua modernidade, a Munkegårdsskolen.
A arquitetura
desta escola primária foi pioneira, porque cada uma das salas de aula tem
acesso direto ao exterior, algo que acontece em muitas poucas escolas por esse
mundo fora.
Em Portugal, há um exemplo de uma escola cuja arquitetura foi inspirada por Arno Jacobsen, a Escola Teixeira de Pascoais. Citemos um estudo:
“Teixeira de Pascoaes School,
Lisbon, 1956–1961, (…) focuses on unity and introspection. This project is very similar, in terms of
typology, to that of the Munkegaard school by Arne Jacobsen.
The school is structured around a
common yard and canteen, which acts as a joint. From there, the school is
divided into the boys’ and girls’ wings. Each wing has its own classrooms and
each classroom a patio. Each patio has a tree and eye contact with the open
playground by means of a brise-soleil . From the outside, the school is a
repetition of volumes which do not reveal their purpose. Horizontal movement is
achieved through long corridors leading to the introspective space of each
classroom”.
Quem quiser ler
mais pode fazê-lo em:
https://www.docomomo.pt/wp-content/uploads/2019/04/DocomomoJournal55_2016_RCarvalho.pdf
Para
verdadeiramente aproveitarem o “Weekend-Break” em Copenhague, o melhor é
instalarem-se no SAS Royal Hotel. Foi para este hotel que Arno Jacobsen
desenhou a sua mais célebre obra, a que o tornou mundialmente conhecido, uma
cadeira, a Egg Chair.
Assim sendo, e por todas as razões de elevada importância que as cadeiras têm para a nação, estivemos uma manhã inteira a falar de cadeiras aos nossos alunos...
Guião de aprendizagem "Tudo sentado"
https://drive.google.com/file/d/1_BG-JqfUDSNVc5rjsANK6LvrtUGSjaT0/view?usp=sharing
Ficha de exploração "Tudo sentado"
https://drive.google.com/file/d/1TPEFE3AL4FF6krxw8_aZH2kMz85psAPn/view?usp=sharing
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