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Que futuro para a claque docente?

 



Não caros leitores, não nos equivocámos. Não queremos mesmo falar-vos da classe docente, queremos sim falar-vos da claque docente. Uma coisa não é o mesmo que a outra, mas descobrimos nos últimos tempos que há intersecções entre ambas.

 

Presumimos que parte dos nossos leitores, tal como nós, aos domingos à noite, assiste ao programa televisivo “Isto é gozar com quem trabalha”. Com toda a certeza que não havemos de estar muito enganados, uma vez que este é um dos programas que maior audiência tem.

Algo que nos chamou a atenção nas mais recentes emissões, foi que, de cada vez que o assunto em questão se relaciona com educação, a plateia que assiste ao referido programa ao vivo, manifesta-se ruidosamente com uns uh-uh-uh-uh e um longo eeehhh acompanhados de entusiásticas palmas.

Pelo desenrolar da situação, não ficam dúvidas absolutamente nenhumas, de que pertencem à classe docente, aqueles que assim se manifestam, e não à Juve Leo, aos No Name Boys ou aos Super Dragões.

Logo que ouvimos esses uh-uh-uh-uh e o jovial eeehhhh que os acompanha, sentimos uma incontrolável ternura pela classe docente presente na plateia, se manifestar como se uma claque docente fosse. É normal, quem não o sentiria?

 

Tal situação, trouxe-nos à lembrança, uma situação análoga num outro programa televisivo com enormes audiências: O Preço Certo.

Com efeito, sempre que no Preço Certo sobe ao palco um concorrente, digamos por exemplo de Alguidares-de-Baixo, regista-se imediatamente uma tremenda agitação na plateia. Com efeito, há sempre uma ruidosa claque que se manifesta primeiramente através de sons guturais de incentivo ao concorrente, a que se seguem enérgicos gritos de apoio a Alguidares-de-Baixo: Al-gui-da-res, Al-gui-da-res, Al-gui-da-res…

 

Outro tanto acontece, se por acaso o concorrente for residente ou originário de Vila-Velha-de-Cima, sendo que, neste caso, os não menos enérgicos gritos de apoio e incentivo serão os seguintes: Vila-Velha, Vila-Velha, Vila-Velha…

 

Como os nossos leitores já terão percebido, o mesmo princípio é aplicável a todos os lugarejos, aldeias e vilas deste país, ou seja, se um dos filhos de uma qualquer terra de Portugal sobe ao palco de o Preço Certo, os seus conterrâneos presentes na plateia fazem claque, enchem-se de brio e entusiasmo e lá vai disto: Fon-te San-ta, Fon-te San-ta, Fon-te San-ta…Al-dei-a Ve-lha, Al-dei-a Ve-lha, Al-dei-a Ve-lha…

 

O que tais manifestações nos demonstram, é que os portugueses, pertençam eles às classes intelectuais e ilustradas, como os docentes, ou às boas, simples e humildes gentes do povo, quando porventura se juntam, possuem sempre uma carinhosa e ternurenta tendência para agirem como se de uma claque se tratasse.

 

Atentemos numa outra peculiar manifestação da tendência lusitana para agir como uma claque que, tanto quanto sabemos, é uma especificidade exclusivamente nacional. 

Quando finda uma viagem de avião, as rodas do aparelho tocam no solo e a aterragem está praticamente concluída, se por acaso houver mais que meia-dúzia de portugueses a bordo, é de certeza absoluta que todos se vão comportar como uma claque e desatar a bater palmas (presume-se que de apoio ao piloto).

 

É uma coisa quase instintiva, basta um português começar a bater as primeiras palmas e zás, logo outros dois ou três o seguem e os restantes vão atrás.

Uns fazem-no cheios de vigor, como se assim afirmassem a sua portugalidade, identidade e quem efetivamente são. Outros fazem-no de forma quase envergonhada, como se dissessem para si mesmos: sim, os portugueses são uns poucochinho parolos, mas ainda assim, são os nossos parolos.

É como se todos fôssemos arrastados por uma misteriosa torrente que a todos nos liga e nos incita a agir como uma vigorosa claque.

 

Podemos estar em qualquer lugar do mundo, seja na América, seja na Ásia, sempre que num avião ouvimos palmas, sabemos imediatamente e sem margem para quaisquer dúvidas, que na aeronave nos acompanha um cantinho de Portugal e sentimo-nos subitamente emocionados e com saudades da pátria amada: Por-tu-gal, Por-tu-gal, Por-tu-gal…

 

Todavia, as claques também têm os seus inconvenientes. Por exemplo, continuando em matéria de viagens aéreas, as palmas são o menos, o pior é o resto. Se num avião só viajarem meia-dúzia de portugueses, pode ser que a coisa ainda se aguente, agora se for um número maior do que esse, é certo e sabido que o caldo está entornado.

 

Lembremos a esse propósito, uma exemplar crónica de Miguel Esteves Cardoso, escrita aquando do momento em que teve a feliz oportunidade de viajar num avião completamente cheio de portugueses.

A dita comitiva viajava em modo de claque para assistir a uma final das Taça dos Campeões Europeus onde participava o Benfica. Não por acaso, nós que vos escrevemos, também estivemos nessa final, e podemos portanto atestar a veracidade do relato descrito na crónica.

 

Contava então com muita graça Miguel Esteves Cardoso, que a determinado momento do voo, o comandante pediu aos passageiros que se sentassem por causa da turbulência. Dizia o autor do texto muito acertadamente, que pedir a um grupo alargado de portugueses, quanto mais benfiquistas, que se sentem durante um voo, é como chegar a um aquário e pedir às focas para saírem imediatamente da água. Nem ouvem.

 

O comandante bem podia insistir: “Já agora, por favor, agradecia que se sentassem”. Nada.

 

“Atenção senhores passageiros, devido à turbulência é imprescindível que os senhores passageiros estejam sentados”. Um alentejano agarrava a barriga e recomendava em voz alta, presumivelmente ao comandante: “Pára lá de andar com essa porra de um lado para o outro!” O comandante começou a utilizar o imperativo: “Sentem-se senhores passageiros, por favor!” Está quieto.

 

“Queiram olhar para o dístico à vossa frente! Queiram fazer o favor de apertar os vossos lugares.” Aí o povo riu-se desbragadamente com o engano, provando assim que todos estavam a ouvir. O comandante corrigiu: “Queiram apertar os vossos cintos”, e levou logo com um “Farto de apertar o cinto, tou eu!” Em síntese, com uma claque de tal calibre, o comandante nunca teve a mais leve das hipóteses.

 

Mas voltemos à classe docente, ou melhor dizendo, apenas a uma parte desta, ou seja, àquela que constitui a claque docente. Como perguntávamos no título deste texto, que futuro lhe estará reservado?

 

Não sendo nós bruxos, não o conseguimos adivinhar, porém, o que verdadeiramente conseguimos fazer, é propor um Plano de Inovação e Melhoria. Para tal, fomos colher inspiração às melhores práticas existentes a nível internacional, mais concretamente, às claques norte-americanas, as chamadas Cheerleaders.


Ora digam lá que se não seria uma enorme inovação e melhoria, se da próxima vez que houvesse uma manifestação no Marquês de Pombal, professores e professoras descessem a Avenida da Liberdade ostentando acessórios como pompons, tops e shorts?

Cada um dos múltiplos sindicatos escolheria uma cor diferente e desse modo dava-se um alegre e vistoso colorido a toda a avenida, que combinaria maravilhosamente com a época primaveril que agora vivemos.

Fica aqui a ideia à consideração dos nossos líderes sindicais. Talvez para o desfile do 25 de Abril.

 


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