Em 1967, num liceu de Palo Alto, no estado norte-americano da Califórnia, um professor deu uma lição de história aos alunos. Uma lição que ficou na história. O tema da aula era a Segunda Guerra Mundial. Nisto, houve uma aluna que questionou o professor sobre como tinha sido possível que os alemães tivessem apoiado o regime nazi, acrescentou que atualmente, em 1967, nos EUA, tal jamais sucederia.
O professor
quis-lhe provar que não tinha razão. Que regimes autoritários podem nascer e
crescer em qualquer época e em qualquer lugar. O professor, de seu nome Ron
Jones, propôs à turma uma experiência.
Na próxima aula, ele encarnaria o papel de um ditador e os alunos seriam os partidários do movimento que o apoiaria e seguiria. Os alunos que mais fiéis fossem ao líder e melhor cumprissem as suas ordens, receberiam a nota máxima, os que mais problemas lhe causassem, receberiam más notas.
Na aula seguinte, uma segunda-feira, Jones ordenou à turma que o passasse a tratar por "Mr. Jones", em vez do habitual "Ron". Fez-lhes uma preleção sobre os benefícios da disciplina e ordenou-lhes que treinassem um modo de se sentarem e se levantarem das cadeiras da sala de aula conjuntamente, em vez de um de cada vez. Ordenou-lhes também que mantivessem sempre uma postura rígida, que transmitisse uma imagem de concentração e rigor.
Os alunos realizaram de seguida repetidos exercícios em que se sentavam e levantavam das cadeiras. Fizeram-no até conseguirem sentar-se e levantar-se como um todo perfeitamente sincronizado.
Foi criado um
slogan, “Strengh through discipline”, e criadas uma série de regras que todos
deveriam escrupulosamente respeitar. Entre essas regras, havia uma na qual os
alunos se comprometiam a manterem sempre uma postura atenta e a nunca perderem
o foco relativamente ao que o professor dizia.
No final do dia,
a turma gritou de forma entusiástica e uníssona: "Strengh through discipline,
Strengh through discipline, Strengh through discipline…"
Afinal de contas, para os alunos estava em causa ter uma excelente nota e, por consequência, havia que demonstrar vontade, esforço e entusiasmo.
Ron pensou ter assim demonstrado o seu ponto, ou seja, ter dado uma lição sobre como é que os alemães tinham aderido ao nazismo e como é que algo semelhante poderia acontecer em qualquer época ou lugar.
Para seu
espanto, no dia seguinte, terça-feira, ao entrar na sala de aula, os alunos
continuaram a tratá-lo por Mr. Jones e a manter a rígida postura do dia
anterior. Ron decidiu improvisar e continuar com a experiência. A turma começou
a entoar o slogan "Strengh through discipline", ao qual foi acrescentado um
outro: "Strengh through community".
Durante essa
aula, decidiram ainda criar uma saudação de braço estendido e erguido e dar um
nome ao seu movimento: "The Third Wave". No final da aula, todos os alunos
espontaneamente saudaram num respeitoso silêncio o seu líder, o professor, com
o braço estendido e erguido.
No dia seguinte, quarta-feira, Ron Jones criou um cartão para quem quisesse ser membro efetivo do movimento Third Wave. Todos os alunos aderiram e receberam o respetivo cartão. Secretamente, elegeu três alunos para vigiarem os seus colegas e para os denunciar, caso algum deles se queixasse ou não cumprisse as regras do movimento. Regras que entretanto tinham crescido de forma exponencial. Quem quer que não cumprisse as regras seria sujeito a um julgamento.
Rapidamente houve denúncias e os respetivos julgamentos. Os acusados, uma vez julgados culpados, foram expulsos da sala de aula com toda turma a gritar "culpado, culpado, culpado…"
Nesse dia,
deu-se também um acontecimento importante, um dos alunos, por sua exclusiva
iniciativa, decidiu acompanhar Mr. Jones até à sala dos professores. Aí chegados, os outros professores informaram-no que não era suposto os alunos
entrarem nessa sala. O referido aluno não se deixou intimidar e fez saber que
ele não era um simples aluno, era o guarda-costas de Mr. Jones. Estava ali para
o proteger de eventuais ataques e conspirações dos restantes professores.
Alunos de outras
turmas começaram aderir ao movimento, e pelo final da semana a escola estava
mais tranquila, ordeira e disciplinada do que alguma vez fora. Nesse
entretanto, cerca de metade dos alunos tinham sido alvo de denúncias dos seus
colegas.
Jones convenceu
então os alunos de que o movimento Third Wave se tinha propagado as outras escolas
do país, e que na próxima sexta-feira haveria uma comunicação televisiva à
nação.
Na sexta-feira, o auditório do liceu de Palo Alto estava cheio. Centenas de alunos aguardavam pela comunicação ao país, no entanto, nada sucedeu, a emissão televisiva continuou como habitualmente. Foi então que Ron Jones, a todos revelou que tinham sido manipulados. Não havia nenhuma Third Wave e tudo se resumia a uma experiência para dar resposta à questão de uma aluna sobre como é que os alemães tinham apoiado o regime nazi.
Deixamos-vos a cronologia
dessa experiência:
À data, as
notícias destes acontecimentos só tiveram eco em dois pequenos jornais locais.
Ron Jones acabou por ser banido do ensino por um período de dez anos e nunca
mais ninguém falou disso.
Anos mais tarde,
Hollywood interessou-se por tudo o que então sucedeu e foram realizados vários
filmes sobre o assunto. Não só na América, como também noutros países. Uma
dessas películas estreou Portugal em 2008 com o título “A onda”:
Quer na Alemanha, quer em Israel, esta experiência pedagógica foi posteriormente integrada nos currículos escolares oficiais, a fim de demonstrar aos alunos a facilidade com que um regime autoritário se instala no poder.
Uma das
conclusões mais interessantes do que sucedeu em 1967 em Palo Alto, foi a de que
os melhores alunos foram todos denunciados e expulsos pelos seus colegas.
Muito mais
recentemente, quando Ron Jones foi entrevistado sobre esse facto e as causas
que o explicam, prestou as seguintes declarações:
“Sometimes as a teacher, you miss
the middle group, those who just want to be successful at something for once in
life. What was interesting during the Wave was that the very bright kids were
excluded and martialed out of the classroom by guards early on. That
left the middle group, who then felt empowered.”
O mais incrível de tudo isto, é que nesse mesmo ano, em 1967, muito pouco tempo depois e nesse mesmo estado da Califórnia e de seguida por toda a América, celebrou-se aquele que viria a ficar conhecido como “The Summer of Love”.
Milhões e milhões de jovens, provavelmente provenientes de todos os “middles groups” escolares que havia pelo país fora, viraram as costas à competitiva sociedade norte-americana de então, que não lhes interessava absolutamente para nada, e passaram a viver somente do alinhamento dos astros.
Terminamos com
um hino desses tempos, “The age of Aquarius”:
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