Quando éramos pequeninos e andávamos na escola, aprendíamos o aparelho digestivo e como era constituído. Entre as suas partes, estava o duodeno. Depois crescemos e nunca mais ouvimos falar do duodeno. É quase como se não existisse e tivesse ficado para sempre esquecido.
Hoje temos vontade de vos falar do duodeno. Fomos pesquisar e descobrimos que há poemas, canções, elegias e outras obras de arte dedicadas a praticamente todas as partes do corpo humano, contudo, para o duodeno, nada. Pelos vistos, o duodeno é coisa que ninguém elogia e exalta. Algo que, a nosso ver, é injusto e lamentável.
Os olhos são a janela da alma, o coração é nobre e puro, as mãos são belas e delicadas, os cabelos soltam-se aos ventos, os peitos são ardentes, os lábios são sensuais, os pés atraem todo o tipo de fetiches, sentimos borboletas no estômago, mas quanto ao duodeno, zero.
Há até quem tenha delírios poéticos com cus e, passamos a citar, se "inebrie com os seus odores a rosmaninho e a jasmim". Isto já para não nos referirmos aos órgãos genitais, que também eles parecem suscitar largos e vastos devaneios literários e artísticos, como por exemplo, aquela pintura de Gustave Courbet, que pode ser vista no Museu de Orsay em Paris, e se intitula “A Origem do Mundo”.
Até o Becas, o conhecido personagem infantil da Rua Sésamo, não resistiu a contemplar genitais e foi de visita ao Museu de Orsay. Abaixo o momento em que foi apanhado por um fotógrafo anónimo a longamente mirar “A Origem do Mundo”.
Ao que se diz, o Becas é um grande entusiasta da pintura naturalista do século XIX, e de Gustave Courbet muito em particular. Para o caso de alguém querer saber, o Egas ficou no hotel a ver televisão. O Egas não é grande apreciador da arte oitocentista gaulesa. Mais perde.
Já terão reparado, que quer as partes do corpo habitualmente menos expostas aos olhares, quer as que estão à vista de toda a gente, todas têm direito ao estrelato poético e artístico, só o duodeno é que não.
Só numa estrofe de Fernando Pessoa, escolhida quase ao acaso, encontrámos logo referências a quatro, assim do nada: ao estômago, aos intestinos, à garganta e aos pés:
Que tudo quanto fui se me atou aos pés,
Como a serapilheira para embrulhar coisa nenhuma!
Que tudo quanto pensei me faz cócegas na garganta
E me quer fazer vomitar sem eu ter comido nada!
Graças a Deus, porque, como na bebedeira,
Isto é uma solução.
Arre, encontrei uma solução, e foi preciso o estômago!
Encontrei uma verdade, senti-a com os intestinos!
Mas e então e o pobre duodeno, voltamos nós a insistir. Como é que é? Uns são filhos e outros são enteados? Não só nada se diz do duodeno, como igualmente nada se fala dos seus mais diretos parceiros, o jejuno e o íleo, as restantes partes de que é composto o intestino delgado.
O jejuno é um órgão responsável pela absorção de aminoácidos e lipídios. O Íleo tem funções que incluem a regulação do refluxo e a assimilação dos nutrientes do quimo. Ou é isso, ou é algo de parecido, não temos bem a certeza. Já andámos na escola há muito tempo, não nos lembramos bem. Para além disso, preocupamos-nos mais com as potencialidades artísticas e poéticas do duodeno, do que propriamente com as suas funções fisiológicas.
Ainda assim, e feitas as contas, o certo é que o duodeno e “sus muchachos” jejuno e íleo, não fazem coisa pouca. Sem eles, a digestão complicava-se a olhos vistos e andávamos todos para aí aflitos.
Falando nisso, e cumprido a nossa missão de prestarmos um serviço útil, caso necessitem, no site abaixo, que é exclusivamente dedicado à anatomia humana, poderão encontrar toda a informação relativa a complicações intestinais:
Para quem eventualmente não tenho ido ver o site, nós fazemos a gentileza de transcrever a ideia principal. Assim, segundo os melhores especialistas em anatomia, “Disfunções do intestino delgado podem levar a experiências bem desagradáveis, como uma diarreia durante uma viagem, ou pior, durante um encontro.”
O alerta está dado. Imagine-se por exemplo, que se faz uma viagem romântica a Paris, se vai visitar o Museu de Orsay para se contemplar “A Origem do Mundo”, e é precisamente nesse momento de contemplação que temos uma disfunção! Imagine-se o que era!
Às tantas foi por isso que o Egas ficou no hotel, por estar disfuncional, e não para ver TV, como disse. Com o Egas nunca se sabe, é um boneco muito temperamental.
Mas voltemos ao duodeno. Já que falámos de Paris, pensemos na Mona Lisa, o retrato pintado por Leonardo da Vinci, que está no Museu do Louvre. Durante séculos elogiaram-lhe o suave olhar, o plácido rosto, o fugaz sorriso, os longos cabelos, a nobre testa e a elegância das mãos. Alguém falou do seu duodeno? Nada, zero.
Retorquirá quem nos lê, que pois claro, que ninguém fala do duodeno da Mona Lisa, porque no quadro este não se vê. Ai sim? Dizemos nós. E então os seus mamilos, por acaso estão à vista de quem passa? Não, pois não. Mas isso não é impeditivo que se fale neles e até se diga que são róseos. Há vários exemplos disso mesmo, aqui fica um:
Terá o autor do artigo acima visão Raio X para saber que os mamilos da Mona Lisa são róseos? Na verdade não, o que se passa é que encontraram por esse mundo fora alguns retratos nus que supostamente se assemelham à Mona Lisa, e vai daí começaram a dizer que se tratava da mesma pessoa.
Há uns anos em Itália fizeram mesmo uma exposição cujo tema era esse: “Joconde - Da Monna Lisa alla Gioconda Nuda»
Repare-se que não há certeza alguma, que as supostas Monas Lisas nuas, o sejam efetivamente. Muito pelo contrário, a maior parte dos especialistas, assim como dos historiadores de arte, recusam totalmente tal tese. Ainda assim, há quem se permita, e não são poucos, falar dos mamilos róseos da senhora.
Mas se assim é, porque não também falarmos do seu duodeno? Leonardo da Vinci, para além de artista, foi também um anatomista. Ao longo de 15 anos (de 1498 a 1513), Leonardo desenhou órgãos e elementos dos sistemas anatomofuncionais do corpo humano. Ao contrário de muitos outros, Leonardo não se esqueceu do duodeno e desenhou-o em diversas ocasiões.
Se assim foi, porque não colocarmos a hipótese que um desses desenhos represente o duodeno da Mona Lisa, por exemplo este:
E com isto temos o duodeno colocado no sítio certo, no mais célebre quadro do mundo. Alguma justiça foi feita, mas não toda, por assim ser, continuamos a nossa luta contra o esquecimento a que é votado o duodeno.
Em 1968 o músico Frank Zappa compôs um tema instrumental de cerca de um minuto e trinta e dois segundos, a que deu o título “Duodenum”. O dito tema faz parte do álbum “Lumpy Gravy”.
Aparentemente, poderíamos considerar que este artista não desdenhou do duodeno como tantos fizeram, contudo, e apesar disso, também ele cometeu uma grave desconsideração para com o duodeno.
Com efeito, em 1971, numa gravação ao vivo do álbum “Fillmore East -June 1971”, houve uma performance do tema “Duodenum”, só que desta vez foram acrescentadas palavras à melodia e dado-lhe um sub-título, “Bwana Dik”. Vejamos como ficou o refrão:
“I am bwana dik
Me bwana dik
My dick is a monster
Give me your heart
My dick is a harley
You kick it to start”
Ora bem, por caso há alguma referência ao duodeno? Não. Refere-se de um modo digamos coloquial, uma outra parte da anatomia humana, equiparando-a a um monstro, fala-se também do coração, mas do duodeno, zero.
Está mal, corrijamos mais essa injustiça ao duodeno, ouvindo o tema original em que não se falava cá de “dik’s” nem de coisas dessas. A música é mais ou menos assim, Tan-tan-tan-tan, pam-pam-pam-pam:
E pronto, acho que já conseguimos repor alguma justiça relativamente ao modo como o duodeno é tratado. Como dissemos no início deste texto, outrora quando éramos pequeninos e andávamos na escola, falaram-nos do duodeno, mas depois disso, pouco ou nada. Talvez este texto possa ser lido aos mais pequeninos de agora para que eles jamais se esqueçam do duodeno ao longo das suas vidas.
(Quando dizemos mais pequeninos, referimos-nos aos que andam na escola, bem-entendido, não aos mais pequeninos que não podem dizer “My dick is a monster”)
Mesmo para terminar, não podia faltar um poema, um em inglês e tudo, dedicado ao duodeno. O autor desconhecemos quem seja:
Ooh give me the juices of the stomach
I want to feel my meal tonight
the acidic fluid that hits me
makes my chemical digestion thrive
give me meat I'll melt it
theirs nothing I cannot dissolve
what ever is left goes to my friend
micro villi to take what molecules it has
chocolate is my favorite it so sweet and divine
not so much the veggies
but hey we all need to survive
give me something rotten
germs will be set free
they'll back up my front door
sometimes cause duodenal ulcers
that bleed and make you soar
so now let me rest
until your next big meal
make sure it's ok
I'll see you tomorrow
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