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Ir a Paris e não ver a Torre Eiffel

Que piada terá ir à Torre Eiffel? É muito alta? Pois claro que sim. Tem muito ferro? Isso também. Dá uma bela foto? Ninguém duvida. Mas dito isso, a coisa está feita. Pior ainda, é ir ver a Mona Lisa. Mas para quê? Apenas para ver uma multidão que se esgadanha toda e acotovela só para tirar uma selfie? Tenham dó.
Dizíamos ontem que não gostamos da disneyficação das cidades! Não gostamos que estejam progressivamente a ser transformadas numa espécie de parques temáticos. A esse propósito falámos de Roma e de como nalguns filmes conseguimos percorrer as histórias da cidade eterna, aquelas que jamais se percorrerão nos massificados percursos e circuitos turísticos.

Hoje faremos o mesmo com Paris, mas não com filmes e sim com duas ou três fotografias clássicas e umas quantas canções parisienses. Chamam-na a cidade-luz ou a cidade do amor, são meros clichês, estafados lugares-comuns. No entanto, também nós vos vamos contar uma história, que é ela própria um clichê: um homem, uma mulher e Paris. Uma história contada e recontada milhares de vezes em livros, filmes e canções.

Não somos guias turísticos, mas a história como que sugere dois lugares a ir numa visita a Paris. Não são lugares secretos, mas também não são lugares comuns, a Île Saint-Louis e o Jardim das Tulherias.

A história começa com o sol que se eleva e acaricia os telhados, é Paris ao nascer do dia. Segue com o Sena que se passeia e nos guia, é a Paris de sempre. Prossegue quando o meu coração se detém ao ver o teu que sorria, é Paris a dizer bom dia. A tua mão na minha mão a prometer um sim, é Paris uma paixão. Um primeiro encontro na Ilha de Saint-Louis e é Paris a começar. Um beijo roubado no Jardim das Tulherias, é Paris repleta de alegrias.
A história avança com os nossos rostos que se viram para ver Versailles, é Paris e a França. São dias esquecidos que não esqueceremos, é Paris plena de esperança. Horas em que os nossos olhares foram um só olhar, é Paris a mirar-se. E o dia em que por fim tu dizes sim, é Paris pela noite. Um quarto um tanto triste, mas é Paris só os dois. Um olhar que contém toda a ternura do mundo e é Paris nos teus olhos. E saber que amanhã também será assim, é Paris a ser maravilhosa para mim.

Chega o final da viagem, o final da canção e Paris escurece. Último dia, última hora e primeira lágrima também, Paris chuvisca. Os jardins não têm nenhum encanto, Paris aborrece-me. A gare onde se consuma a despedida, é Paris o fim.
Longe dos olhos, longe do coração, um paraíso perdido, Paris é triste. Mas uma carta de ti que me diz sim e é Paris já amanhã. Cidades e vilas desfilam, é Paris a caminho. E tu, que me aguardavas lá onde tudo recomeça e é Paris que regressa.

Toda esta história não fomos nós que a inventámos, foi Jacques Brel numa canção que se chama “Les prénoms de Paris”. Os “prénoms” são na verdade outras coisas que se podem dizer de Paris, para além das muito gastas expressões cidade-luz ou cidade do amor. Aqui fica a canção, onde Brel conta a mesma história, mas muito melhor do que nós a contámos:


A quinta-essência de Paris é Edith Piaf. A sua voz grave e rouca é a imagem de marca de um certo modo de viver parisiense. As letras das suas canções contam-nos as histórias de sempre da vida dessa cidade.
Há a boémia e as gentes simples dos velhos bairros, onde no bistrot tudo decorre ao sabor de um bom de vinho e acompanhado pelo som de um acordeon. Mas há também filósofos que se sentam sozinhos para pensar junto à Ponte de Bercy. Inevitavelmente, há amantes, dramas, traições e ciúmes, tudo isto se passa amiúde “Sous le ciel de Paris”:

https://www.youtube.com/watch?v=kouTi-0csLg

Se alguém pensar que as histórias que Piaf nos canta e nos conta nas suas canções, são histórias de outrora, de uma Paris de clichê para consumo turístico, desengane-se.

Sendo os parisienses como são nas coisas de amor, e ainda para mais dados a filosofias, estão-se sempre a questionar sobre o que é e não é normal, o que querem e não querem, entre ficar ou partir, por consequência, muitas das suas histórias, antes como agora, terminam em lágrimas. Não admirando portanto que tudo compliquem e andem constantemente cheios de cicatrizes.

São este género de histórias que acabámos de descrever, que a banda “La Femme” nos apresenta. Em junho de 2016, o grupo lançou o tema “Où va le monde?”. Tratando o tema da premente questão filosófica acerca de para onde se dirige o mundo e falando simultaneamente de mulheres de coração cruel, de gente infiel e de perguntas para as quais não há respostas, o resultado só podia ser um estrondoso sucesso por Paris inteira:


Mas não vamos terminar este texto com “Oú va le monde?”, saindo infelizes de Paris. Está bem que este nosso passeio não é um daqueles festivos e divertidos tours turísticos, mas ainda assim, também não vale a pena ir a Paris e vir de lá com a neura.

Terminaremos portanto com um filme musical de 2007, muito apropriadamente intitulado Les Chansons d'amour. Conta-nos a história de Julie e Ismaë que são namorados. Mas conta-nos também a história de Alice, amiga de ambos, que lhe propõe que vivam uma relação a três.

Não vos vamos contar o resto da história que não queremos ser spoilers, deixamos-vos apenas a canção Je n'aime que toi, que se passa no Boulevard de Strasbourg, quando os três saem à noite de um bar e começam a conversar do assunto.

Na cena, a Julie parece que não está pelos ajustes. Ismaë jura-lhe que só a ama a ela. Alice medeia a discussão e diz-lhes que tudo se arranjará. Aqui fica:

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