Anda por aí
uma grande infodemia e não se sabe bem como a controlar, estranhamente, ninguém
parece estar particularmente preocupado com assunto.
Antes de continuarmos, e para o caso de alguém desconhecer o conceito, é preciso que se saiba que uma infodemia é um enorme fluxo de informações sobre um qualquer assunto, que aumenta velozmente num curto período e se prolonga indefinidamente no tempo.
Consequentemente, em tal situação, diante uma avalanche informativa, torna-se muito difícil a toda a gente distinguir as informações de confiança das que não o são.
Sendo igualmente complicado, acompanhar incessantemente todas as novidades que ao longo do tempo vão sucedendo.
Não será
despropositado afirmar, que nos dois últimos anos, os temas que em Portugal
continuamente mais geraram fluxos informativos foram a saúde e a educação.
É certo que
nesse entretanto houve um ou outro escândalo de corrupção, umas quantas
eleições, uns tantos campeonatos de futebol vencidos ou perdidos, penáltis por
assinalar, e que, alegadamente, o José Castelo Branco bateu na mulher. Contudo,
nada disso constituiu uma constante, ou seja, não originou uma ininterrupta e
duradoura torrente de notícias durante estes dois últimos anos.
Era previsível que assim acontecesse, pois no decorrer da pandemia de covid-19, foram efetivamente esses os setores mais afetados. Os hospitais encheram-se de gente e as escolas encerraram durante largos períodos de tempo, com todos os nefastos efeitos que daí advieram. É portanto natural que as atenções se tivessem concentrado nesses sectores.
Claro que os
ginásios e discotecas também sofreram, mas ainda assim, a sociedade portuguesa
não é tão inconsciente, que não saiba diferenciar o acessório do essencial.
Estabeleçamos
portanto, que neste tempo pós-covid, o que mais preocupa a nação são os setores
da saúde e da educação, sendo por consequência perfeitamente lógico, que os
maiores fluxos de informação se centrem nesses assuntos.
Por assim
ser, ou seja por haver grandes fluxos informativos sobre esses temas, caiu-se
numa infodemia, sendo portanto agora bastante complicado distinguir as
informações de confiança das que não o são, e igualmente acompanhar todas as
consecutivas novidades respeitantes à saúde e à educação.
Greves nas
escolas e hospitais, urgências encerradas, manifestações, contestações,
constantes debates políticos, discussões nas redes sociais, comentários
televisivos e artigos de opinião nos jornais, fizeram com que fosse
praticamente impossível ao cidadão comum estar completamente consciente de tudo
o que estava a suceder.
Em síntese, o excesso de informações teve o efeito oposto ao que era suposto, ao invés de ficarmos bem informados, ficámos antes perplexos e confusos, o mesmo é dizer, a padecer de infodemia.
Um dos
problemas do excesso de informação é o quão urgente tudo parece. Basta
pormo-nos a ver na televisão os canais de notícias por cabo durante umas
horas, para nos darmos conta da quantidade de vezes que ao longo do dia aparece
um ALERTA.
Começa a chover a potes em Alguidares-de-Baixo, há um alerta. Uma grávida de Sacavém vai dar à luz no Carregado, há um alerta. A seleção de futebol vai apanhar o avião ao aeroporto, há um alerta. O Presidente prestou declarações na Feira da Agricultura acerca do gado bovino, há um alerta. Numa qualquer escola deste país o Joãozinho durante o recreio deu uma lamparina na Joaquina, há um alerta. Lá para os lados onde diabo perdeu a mãe, o Sr.º Avelino saiu da taberna, pegou no trator e embateu em cheio num chaparro, há um alerta. Alerta, alerta, alerta...
Dadas as
circunstâncias, já ninguém liga nenhuma aos alertas, pois havendo tantos, torna-se
impossível distinguir os verdadeiramente importantes dos completamente
irrelevantes.
Nesta
vertigem noticiosa, em que tudo é urgente, há acontecimentos relevantes, ou
mais que não seja interessantes, que acabam por passar despercebidos. Sendo
esse um outro claro sintoma de que estamos em plena infodemia.
A bem do
nosso argumento e para não nos afastarmos do contexto, vejamos agora duas
recentes notícias dos sectores da saúde e da educação, que passaram
praticamente inapercebidas.
Comecemos pela área da saúde: “O recurso às urgências em Portugal é quase o dobro do registado nos países da OCDE. Os dados do ano passado revelam que mais de 44 por cento dos doentes que recorreram aos serviços receberam as pulseiras azuis, verdes ou brancas, ou seja, não eram casos urgentes.”
Quem queira ver com mais detalhe esta notícia, pode fazê-lo em:
Se pararmos
para pensar, a dedução lógica que podemos realizar, é a de que as urgências
hospitalares estão a abarrotar, não tanto por falta de recursos, mas mais por a
população delas não fazer um adequado uso.
Quarenta e
quatro por cento de uso indevido, significa que quase metade das gentes que
enchem as urgências não necessitava de lá estar, ou seja, que só estão a
atrapalhar.
Haverá
muitas razões que expliquem esta corrida às urgências, mas uma delas é
certamente o facto de televisões, jornais e redes sociais estarem
constantemente a lançar alertas.
Quando o
assunto de uma notícia é a saúde, se este porventura for noticiado na TV num
contexto de alerta ou urgência, uma pessoa que esteja em casa a assistir fica
logo assustada. Mesmo que não tenha nada, ao mínimo espirro ou comichão, desata
logo a correr para hospital a pensar que está para morrer.
Nós próprios
sabemos bem o que isso é, pois há uns bons anos, aquando do início da doença
das vacas loucas, ingerimos inconscientemente um belo bitoque com a carne mal
passada, quase em sangue. Umas horas depois, ficámos indispostos. Como ainda
não havia muita informação sobre as vacas, estávamos tranquilos.
No entanto, quando à hora do telejornal começam a aparecer abundantes notícias sobre as vacas loucas na televisão, pensámos logo que também estávamos doidos de todo, e que tínhamos sido contaminados com a bovina patologia. Fomos disparados para a urgência, não queríamos perder o juízo por causa de um mero bitoque. Feito o diagnóstico, afinal não era nada, só azia.
O nosso
ponto, é que demasiadas informações, durante longo tempo, sem critério
distintivo sobre o que é substancial e o que não o é, só criam frenesim e
alvoroço. Mas mais do que isso, provocam igualmente alheamento e indiferença
relativamente a notícias potencialmente significativas.
Com efeito, é ou não importante que todos saibam que as urgências hospitalares estão congestionadas sem necessidade? E passa ou não essa notícia mais ou menos inapercebida? A nosso ver, a resposta a ambas as perguntas é sim.
Mas vejamos agora uma notícia da área da educação, que no intenso fluxo noticioso existente, também não teve particular destaque. A diretora da Escola EB 2,3 Júlio Dinis em Gondomar foi suspensa devido a ter permitido que na fronte do edifício escolar, estivesse colocada uma tarja negra onde se podia ler: "Estamos a dar a aula mais importante das nossas vidas".
Saliente-se que dita tarja foi colocada no contexto
das greves de docentes realizadas ao longo destes dois últimos anos. Não cremos
que a aula mais importante da vida de qualquer professor, possa ser a dos dias
em que fez greve. Seria o mesmo que disséssemos que o mais apetitoso bitoque
que alguma vez comemos, foi quando estávamos de jejum. Mas dito isto, também não nos parece que os exageros
retóricos próprios das lutas laborais, pudessem ser razão para uma suspensão
disciplinar.
Independentemente da nossa opinião, que para o caso
não importa, o facto é que esta notícia nos parece relevante, no entanto, foi
dada tipo assim “en passant”.
Posto isto, regressemos ao título deste nosso texto, no qual se fala em vacinas, mais concretamente, na falta das ditas contra a infodemia.
Perguntar-se-ão os nossos leitores o que temos em mente, será que queremos inocular quem vê TV, lê jornais e frequenta as redes sociais?
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