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Capítulo XIX - Como andar tristonho e mal-disposto em agosto…com a Língua Portuguesa

 

Neste décimo nono capítulo desta série de verão “Como andar tristonho e mal-disposto em agosto” vamos falar-vos do nosso idioma, o português, coisa que nos tempos que correm não é certamente um assunto alegre.

Podemos começar por falar-vos de como a língua portuguesa é tão mal tratada, ou será que é antes maltratada? Na nossa opinião, ambas. Pode escrever-se maltratada, que é o particípio passado de maltratar, e mal tratada, com o advérbio mal a preceder o particípio passado de tratar. São formas semanticamente semelhantes, que por vezes se confundem, mas que apresentam pequenas diferenças sintáticas.

Digamos que tais pormenores, é coisa a que hoje em dia ninguém liga. Nem se liga a esses pormenores, nem se liga a coisas muito maiores. Basta dar uma olhadela pela imprensa, já para não falar nas redes sociais, e desde momento que se tenha concluído a escolaridade obrigatória, não há como tal deixar de constatar.

Ao contrário do que muitas vezes se pensa, o problema não é apenas de ortografia, o maior mal é que se usam as palavras à balda, sem respeito nenhum sobre o que elas querem dizer.
Vejamos um exemplo, entre tantos outros possíveis. Será impressão nossa ou é impossível estrangular alguém com uma navalha? Se calhar em Alcobaça, consegue-se!



Mas não é deste e de outros tipos de detalhes, aquilo acerca do qual vos queremos mesmo falar, o assunto é outro, mais importante e vasto. O nosso tema é o destino da língua portuguesa, algo que incluí, mas de forma alguma se resume, à sua gramática, ortografia, semântica e sintaxe.

Já agora, mais um pormenor, ou seja, mais um exemplo para se ver que, não é só na imprensa que são dadas enormes calinadas, também se as dão num qualquer café ou papelaria onde se vendam raspadinhas ou a lotaria.

Isto do jogo, seja ele raspadinhas, lotaria ou qualquer outro, resume-se naquele ancestral dito: quem não arrisca não petisca. No fundo, é uma questão de se ir arriscando uma e outra vez, que um dia há de sair-nos a sorte grande, tem é de se insistir, ou será antes que tem é de se existir? Fica a pergunta. Aceitam-se apostas.



Um dia, um dos maiores poetas de língua portuguesa de sempre, Herberto Hélder, escreveu assim num verso “…os grandes poemas desaparecem nas grandes línguas que desaparecem…”

Já agora transcrevemos um excerto desse poema, que se intitula “Paixão Grega”:

Li algures que os gregos antigos não escreviam necrológios,
quando alguém morria perguntavam apenas:
tinha paixão?
quando alguém morre também eu quero saber da qualidade da sua paixão:
se tinha paixão pelas coisas gerais,
água,
música,
pelo talento de algumas palavras para se moverem no caos,
pelo corpo salvo dos seus precipícios com destino à glória,
paixão pela paixão,
tinha?
e então indago de mim se eu próprio tenho paixão,
se posso morrer gregamente,
que paixão?
os grandes animais selvagens extinguem-se na terra,
os grandes poemas desaparecem nas grandes línguas que desaparecem…

O poema de Herberto Hélder continua, mas, por falar em morrer e em línguas mortas, deem lá um pouco de atenção à foto abaixo, ou se calhar, deiam:



Não sei se alguém em Portugal já reparou nisso, mas os grandes jornais globais têm versões on-line em várias línguas, sendo que uma delas, é precisamente o português. No entanto, não o português de Portugal, mas sim o português do Brasil.

Um artigo já antigo do El Pais, um jornal global, intitulava-se assim: “A cada 14 dias morre um idioma”. No subtítulo escrevia-se o seguinte: “Nos últimos 10 anos mais de 100 línguas desapareceram”.


Vem tudo isto a propósito de uma entrevista de Sérgio Rodrigues na última edição do jornal Expresso. Sérgio Rodrigues é um excelente escritor brasileiro, em 2014 venceu o prémio Portugal Telecom de Literatura pelo seu magnífico romance “O Drible”, o que foi inteiramente justo, uma vez que é um dos melhores livros de ficção escritos em português no século XXI.



Na referida entrevista ao Expresso, Sérgio Rodrigues lamenta que em Portugal não se dê qualquer atenção à literatura brasileira contemporânea e, mais do que isso, diz desconfiar que tal facto, que é indiscutível, esteja associado a alguma má vontade.

No Expresso ele conta-nos a seguinte história, um dia estava a dar uma entrevista a um canal de televisão português. O entrevistador era o humorista(?) Fernando Alvim. Nesse contexto, o humorista(?) pergunta-lhe se a edição portuguesa do seu livro “O Drible” foi adaptada ao português de Portugal, Sérgio Rodrigues responde-lhe que não. Nisto, o humorista(?) atira com o livro para o chão e diz “Então já não o vou ler”.

Sérgio Rodrigues, que saliente-se é um escritor conceituado internacionalmente, ficou espantado, pensou em levantar-se e ir-se embora, mas acabou por se deixar ficar e levar a coisa para a brincadeira.

Certamente que seria uma brincadeira, pois que Fernando Alvim não é parvo nenhum e não faria uma coisa dessas a sério. Já agora um aparte, Fernando Alvim também não é humorista nenhum, pois que tal e qual como ninguém estrangula outro alguém com uma navalha, também ninguém é humorista não sabendo usar a língua para ter graça, sendo só boçal e malcriado.

Atirar um livro para o chão é o equivalente a coisas do mesmo género que os palhaços fazem quando atiram bolos, baldes de água e o mais que se quiser. Os palhaços fazem rir, mas o que não são é humoristas, para se o ser, convém saber-se usar a linguagem para se fazer uma piada, dir-se-ia mesmo que é uma condição “sine qua non”.

Piada tem, isso sim, ainda que involuntária, uma ervanária, que anuncia ao mundo dar consultas todas as quartas-feiras, mas apenas uma vez por mês. Pensando bem, se em Portugal uma ervanária consegue dar consultas todas as quartas-feiras apenas uma vez por mês, por que razão não há de alguém estrangular um outro com uma navalha ou Fernando Alvim ser humorista? Feitas contas, tudo é possível, até ganharmos um grande prémio na raspadinha e sair-nos a lotaria.



Mas voltemos ao nosso tema, ao destino da língua portuguesa. A avaliar pelo que Sérgio Rodrigues disse na entrevista, não vai ser lá essas coisas. O autor confessa-se um grande admirador e leitor de Camões, de Pessoa e de Saramago, como aliás também o são muitos dos seus compatriotas brasileiros, porém, constata que em Portugal, há pouco quem admire escritores brasileiros e, para além disso, há muito quem se amofine com o sotaque e as inovações linguísticas vindas da América do Sul.

Nós podemos confirmar a sua constatação, pois já vimos muito quem faça cara feia mal lê nos tons e sons vindos da terra de Vera Cruz. O que podemos dizer, é que temos pena que assim seja, pois é brasileiro o maior letrista de sempre na língua de Camões, o Chico Buarque de Holanda. Também é brasileiro o mais brilhante cronista de todos os tempos na língua de Pessoa, o Nelson Rodrigues. Sendo igualmente brasileiro, o maior romancista do século XIX na língua de Camilo e Eça, ou seja, o Machado de Assis (1839-1908).

Machado de Assis é até um caso exemplar, pois sendo por todo o lado considerado um escritor de relevância universal, em Portugal é praticamente um desconhecido. Na zona de Alvalade em Lisboa deram o seu nome a um largo, em Cascais a uma rua e em Coimbra a uma praça, de resto, zero.

Um dos seus principais livros é “Memórias póstumas de Brás Cubas” de 1880. O narrador é um morto que nos relata a sua vida, na qual não fez nada de especial, apaixonou-se por uma mulher casada e a coisa não deu em nada, fracassou completamente na carreira e nunca teve filhos. Depois disso morreu, e por consequência decidiu escrever as suas memórias.
Ficam também a saber, que como era de bom tom acontecer com os filhos das famílias finas do Brasil no século XIX, Brás Cubas veio estudar para Coimbra, onde ganhou fama de folião e de ser superficial e petulante. De lá retornou ao Brasil, levando na mala o diploma de bacharel, que em boa verdade não lhe serviu para nada.

Woody Allen considerou-o um dos seus livros preferidos e uma obra-prima muito original, pois nele há capítulos em branco, outros sem utilidade alguma, para além de muitas outras excentricidades literárias.
Para Harold Bloom, o crítico e académico que estabeleceu de uma vez por todas qual é o cânone literário do ocidente e quais são as obras cuja leitura é obrigatória, “Memórias póstumas de Brás Cubas” é um livro cómico, inteligente, evasivo e muito divertido de se ler. Por tudo isso e muito mais que agora não dizemos, Machado Assis entrou para o cânone ocidental como um dos cem maiores génios literários de sempre.

Por um mero acaso, ficámos a saber que atualmente em Nova Iorque e no resto da América, Machado Assis está em voga, atingiu o topo de vendas. Fica a notícia:



Mas regressemos à entrevista de Sérgio Rodrigues ao Expresso. Nela o escritor fala-nos de um artigo que há tempos escreveu na Folha de São Paulo (um outro jornal global) intitulado “Adeus, Lusofonia!”.

A tese que em estilo algo jocoso Sérgio Rodrigues defendeu nesse artigo, é a de que o Brasil deveria ter a sua própria língua. A ideia é a de que o português brasileiro precisa ser reconhecido como uma nova língua, pois as diferenças em relação ao português de Portugal são vastas, sendo tanto de ordem gramatical, como morfológica, lexical, fonética e sintática.

Na entrevista ao Expresso Sérgio Rodrigues afirmou que essa proposta era mais uma provocação do que outra coisa qualquer, todavia, no Brasil houve quem o levasse a sério.
Dito isto, e sabendo todos nós, cá e lá, que o acordo ortográfico foi um rotundo fracasso, se porventura a língua portuguesa se desunir, o certo é que em tal caso, o português de Portugal em breve ficaria reduzido a um mero dialeto, e a mais longo prazo seria uma língua morta. Como dizia o poeta, “os grandes poemas desaparecem nas grandes línguas que desaparecem…”

Uma vez que em Portugal há muito quem não tenha a menor consciência que a força e o vigor da língua portuguesa passam inevitavelmente pelo Brasil, a pergunta que se impõe é: Onde é que os portugueses foram buscar a ideia, que o português de Portugal é superior ao português do Brasil?

Com certeza não foi às plataformas digitais, pois aí, seja no YouTube, no TikTok, no Facebook ou noutra qualquer, a quantidade e a qualidade dos conteúdos disponibilizados em português do Brasil supera muito largamente os disponíveis em português de Portugal.
Também não terá sido às TV’s, pois é sabido que as telenovelas brasileiras são desde há décadas exibidas com enorme sucesso em países tão distintos como Arménia, Sérvia, Argentina, Indonésia, Israel, Holanda, Costa do Marfim, Equador, Canadá, China, Colômbia, Estados Unidos e França. Certamente que nenhuma telenovela portuguesa ou qualquer outro produto televisivo nacional é sequer comparável em termos de sucesso global, é outro campeonato.

A suposta superioridade do português de Portugal em relação ao do Brasil, também não estará assente na música popular e nas letras que se escrevem, pensar o contrário até dá vontade de rir. Para o confirmar basta ler as lindas letras do Toy ou do Tony Carreira e compara-las com as vindas do Brasil, mais uma vez, é outro campeonato.

É visível a olho nu, que o português brasileiro é mais expedito, dinâmico e inventivo, sendo que, o português de Portugal assume uma pose aristocrática sem que nada o justifique. Enquanto no Brasil a língua adquiriu agilidade, leveza e graça, em Portugal a língua tornou-se rígida, chata e pouco maleável. Ainda por cima, não raras vezes, quando quem escreve tenta ser engraçado, fá-lo a despropósito e acabam por sair parvoíces do género desta que se segue:



A pergunta agora, é como é que a língua de Camões, de Pessoa, de Eça, de Camilo e de Saramago, que em todos esses autores é tão engraçada, jeitosa e inventiva, se transformou nesta coisa tristonha e desenxabida que vemos no nosso dia a dia.

Vamos arriscar uma hipótese de resposta , pois como é uso dizer-se, quem não arrisca não petisca. A nosso ver, uma das principais razões está na escola.

Transcrevemos parte de um recente artigo do jornal Público intitulado “A urgência de ensinarmos o pensamento crítico”. Aqui vai: “Pedro decidiu regressar ao ensino superior depois de três anos de interregno. Viu todas as opções e decidiu que o melhor seria voltar a fazer o exame nacional de Português, essencial para o ingresso no curso que queria. Falou com professores seus amigos, amigos dos seus professores e todos o aconselharam a... Ser mediano. A mãe contava-me a história do exame de Português do Pedro e eu ia abrindo a boca de espanto. Professor atrás de professor a aconselhar o rapaz a não dar respostas fora da caixa, mesmo que conseguisse justificar bem o seu argumento. Não inventes, é o resumo. Não ser crítico nem criativo porque, pasme-se, diziam os mesmos professores, não é isso que ensinamos aos alunos.”

Com esta transcrição, cremos que está tudo dito, o conselho dos docentes ao Pedro foi não arrisques, limita-te a dizer obviedades. Com tais conselhos, como há de o português de Portugal ser uma língua viva, ágil, inventiva e divertida? Não podi, né.

Mas mesmo estando tudo dito, nós queremos dizer mais umas coisas. Uma delas é que é comum ouvir-se afirmar acerca do único Prémio Nobel da literatura português, José Saramago, que não se o consegue ler, pois que as suas frases são muito longas e ele não usa pontuação.

O que está presente nesse desdém que muitos manifestam pela escrita de Saramago, é um antigo paradigma sobre o que é escrever-se bem. Durante décadas, e se calhar atualmente, ensina-se nas escolas que para se escrever bem, as frases devem ser curtas e frequentemente pontuadas.
É um paradigma antigo e por aí não vem grande mal ao mundo, contudo, não é o único e nem sequer o melhor, e isso é precisamente o que muitos esquecem. Há quem escreva de modo excelente usando longuíssimas frases, assim como também há quem escreva muito bem quase não usando, ou não usando de todo, pontuação.

Em síntese, escrever bem em português não se restringe de modo algum a cautelosamente se usar frases curtas e a rigidamente se colocar pontos e virgulas nos respetivos sítios. Em certo sentido, dizemos nós, o domínio quase exclusivo desse medroso paradigma é umas das principais causas para a língua portuguesa se ter tornado nesta coisa tristonha e desenxabida com que diariamente convivemos.

O paradigma das frases curtas e frequentemente pontuadas também vem da escola. Logo nos primeiros anos de escolaridade, o recorrente conselho dos docentes aos alunos é o de usarem frases curtas, que assim há menos possibilidades de haver erros, sejam eles ortográficos, de concordância ou quaisquer outros.
Para além disso, complementam tal conselho dizendo que frequentes pontos e vírgulas, auxiliam os alunos a não se perderem no que estão a escrever, e assim não se desviarem do assunto. É muito importante não se desviar do assunto, como todos sabemos.

Em resumo, aprende-se logo desde pequenino a não se arriscar muito ao escrever-se não vá o diabo tece-las e estar errado ou ter-se começado a deambular por outros temas. Assim sendo, todos aprendem de petizes, que no diz respeita à língua portuguesa, o dito mais certo é “quem não arrisca, petisca”.

Abaixo um texto final da disciplina de português. O aluno escolheu como tema um petisco de que muito gostamos, enguias, sobretudo da caldeirada das ditas. Só por isso já lhe dávamos um vinte. Todavia, admire-se também a concisão das frases, a frequente pontuação e o modo como em momento algum há o mais leve desvio do assunto.
É um texto que dá gosto ler, pois da redação não emana a mais leve criatividade ou inventividade, e também não há qualquer rasgo de humor ou de poesia. Aqui fica para se deliciarem, “A enguia “:



Como nós não queremos ficar atrás do autor de “A enguia” não nos vamos desviar do tema, por assim ser, vamos coerentemente terminar este nosso texto cujo assunto é a língua portuguesa, com um poeta da Nicarágua, Ernesto Cardenal (1925-2020).

No poema que escolhemos, Ernesto Cardenal fala-nos acerca do quão arriscado é escrever e de como não se sendo coerente nem se estando com atenção, facilmente começamos a divagar e nos perdemos. A consequência disso, é que ao lerem-nos, tanto na escola como na vida, nos dizem que errámos e, por vezes, até nos põem de castigo.

Aqui fica o poema autobiográfico de Ernesto Cardenal, “Ao perder-te…”



E pronto, em breve neste blog, num outro dia, seguir-se-á o vigésimo capítulo desta série de verão, “Como andar tristonho e mal-disposto em agosto”.

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