A nossa mensagem de Natal centra-se nas alterações climáticas, um tema que urge tomar em consideração. A fotografia acima é da histórica vila portuguesa de Óbidos, que por esta altura do ano está transformada na Vila Natal. Por uma módica quantia, que anda mais ou menos pelos 10€, é possível a pequenos e a graúdos viver uma autêntica experiência natalícia.
Na Vila Natal de Óbidos há uma rampa de gelo, uma pista de gelo, a aldeia dos patinadores, a planície gelada dos elfos, a montanha gelada e uma escola das fadas da neve.
Se porventura formos a Oeiras, que por esta época é a capital do Natal, o site do Câmara Municipal diz-nos que “Aqui, crianças e adultos poderão admirar esculturas de gelo e brincar com neve no Palácio dos Guardiões da Neve, dançar no gelo com uma vista única para o Espelho Mágico dos Sonhos, descer as Montanhas do Vento Corajoso e entrar na Grande Roda do Ártico”.
Fazendo mais umas pesquisas, ficamos a saber que “O Centro Comercial Colombo, um dos maiores do país, por estes dias tem neve de hora em hora na sua praça central, para celebrar o espírito natalício.”
Continuando a pesquisar, descobrimos que há neve e gelo no Parque dos Sonhos da Chamusca, na Aldeia do Rodolfo na Anadia, no Castelo Mágico em Montemor-O-Velho, no Wow é Natal em Vila Nova de Gaia e em muitos lugares do país. Merece um especial destaque, a Vila Natal Black Pig, que se situa em Santiago do Cacém!
Para quem não saiba, Black Pig é uma marca de gin alentejano. Chamar a um gin porco preto não era cool nem dava prestígio, vai daí o gin ficou Black Pig, que é mais fino. A marca de gin prospera e por isso decidiu montar a primeira pista de gelo no montado alentejano, que é a principal atração da Vila Natal Black Pig. Para além disso, há também neve disparada por canhões.
No espaço da Vila Natal Black Pig há uma quinta com porcos pretos, que são regularmente alimentados por um certo velhote generoso e barbudo, adivinhem lá quem é? Não estão a ver? Vá lá mais uma pista, diz-se que o velho para além de se dar com porcos, também se dá com renas. É o Pai Natal, pois claro.
Os mais crescidos, enquanto os pequenotes se divertem na neve, podem visitar a destilaria, fazer degustações de gin e outras experiências. Experiências essas cujo site da Vila Natal Black Pig não esclarece quais serão, mas que explícita que se destinam aos mais crescidos.
Ora bem, por esta nossa conversa, já todos terão percebido de que alterações climáticas falamos, na verdade há demasiado gelo e neve no Natal. Mas donde é que nos veio esta ideia de no Natal haver gelo e neve por todo o lado? Do Pai Natal? Da Lapónia? Lamentamos desiludir-vos, mas não.
O Pai Natal é uma representação de São Nicolau, que nasceu na antiga cidade de Patara, que se situa na atual Turquia. Não há registros sobre a data do seu nascimento, mas terá sido em torno do ano de 275.
São Nicolau foi sagrado bispo da Igreja Católica em Mira, cidade situada não muito longe de Patara, e morreu por volta do ano de 350 sem jamais ter ido à Lapónia. Na verdade, nem sabia que tal terra existia.
Abaixo fica uma imagem da bela Patara, uma cidade junto ao mar, com belas praias de areia branca e um clima quente, em síntese, um local onde não há nem jamais houve gelo, nem nunca nevou.
Segundo os historiadores, a vocação religiosa de São Nicolau revelou-se logo de pequeno. Conta-se que era um recém-nascido com excelentes qualidades e já inclinado à ascese, pois às quartas e sextas-feiras rejeitava o leite materno e jejuava.
Adulto, tornou-se sacerdote e acabou sendo nomeado bispo. Era tido como um homem muito bondoso. Certo dia, um vizinho decidiu que as suas três filhas virgens fossem para prostitutas. São Nicolau que era amigo das moças, foi disfarçadamente à meia-noite a casa das ditas e deixou-lhes três sacos cheios de valiosas prendas. Com essas ofertas as raparigas conseguiram safar-se do destino que o pai lhes queria impor e arranjaram bons maridos.
Como já terão percebido, a tradição do saco de prendas e do Pai Natal aparecer disfarçadamente a meio da noite, veio desse episódio da vida de São Nicolau. Esta era um bela história para se contar às crianças na consoada, “Era uma vez três raparigas, cujo pai era proxeneta e as mandou para a prostituição, vai daí, à meia-noite o Pai Natal (São Nicolau) veio sorrateiramente e…”
Abaixo uma pintura de 1435 de Bicci di Lorenzo na qual se vê São Nicolau (o Pai Natal) a dar os sacos de prendas às três raparigas.
A imagem do Pai Natal vestido de vermelho, a viver no frio e na neve e usando um trenó puxado por renas, apareceu pela primeira vez num cartoon de Thomas Nast no dia 1 de janeiro de 1863.
Mais tarde, em 1931, uma muito bem sucedida campanha publicitária da Coca-Cola divulgou durante anos essa imagem pelo mundo, e a partir daí foi um ver se te avias de rampas e pistas de gelo, de canhões que lançam neve, de pistas de patinagem e de tudo o mais.
A campanha foi idealizada pelo ilustrador Haddon Sundblom. Desde esse momento o Pai Natal (São Nicolau) deixou de estar associado à quente cidade de Patara e a pouco e pouco, aproveitando uma figura pagã semelhante que havia lá para a Finlândia, foram-no relacionando com a fria Lapónia.
Como é evidente, à Coca-Cola dava-lhe jeito que o Natal estivesse associado ao frio e ao gelo e não só ao do dos frigoríficos.
Em 2021 a NOS fez uma campanha publicitária na qual se contava a história de uma criança que ficava repetidas vezes desiludida com os presentes de Natal que os pais lhe ofereciam. O que ela queria era neve verdadeira, ficou finalmente feliz quando recebeu uns óculos de realidade virtual, que lhe permitiram ver neve “verdadeira”.
Aqui fica o anúncio, para quem dele já não se recorda:
Este anúncio é um dos mais inspiradores de sempre, pois a criança desdenha continuamente de todo o real esforço feito pelos pais, e só se contenta mesmo com o que lhe é oferecido pela realidade virtual.
A este propósito, poder-se-ia contar às crianças na consoada mais uma história, que se resume assim: “Era uma vez uma criança que nasceu em Belém numa manjedoura. Vieram três reis magos e ofereceram-lhe mirra, incenso e ouro”.
Imaginem que às crianças atuais, alguém ofereceria pelo Natal ouro, incenso e mirra. Os petizes provavelmente ainda conseguiriam ver alguma utilidade no ouro, ainda assim dependendo da cotação que o metal atingisse nas bolsas internacionais, mas perante o incenso e mirra, certamente que deles desdenhariam e diriam “Mas o que é isto? Não foi nada disto que eu pedi ao Pai Natal (ou ao Menino Jesus, conforme os casos)"
Será que há algum pai ou mãe que conseguiria responder ao desdém da criançada da seguinte forma: “Se é bom para o Menino Jesus, também é bom para ti”. Claro que não, como é evidente.
Que moral ou lição retirar disso, não sabemos. Sabemos sim que em Belém na Palestina, a temperatura é relativamente quente nesta época do ano e que por lá não neva nem faz frio.
Terminamos esta mensagem de Natal com uma das mais belas pinturas com tema da Natividade, uma de Piero della Francesca de 1475. Como se vê o Menino Jesus está perfeitamente à fresquinha e ninguém se chateia com isso, é uma imagem anterior ao tempo das alterações climáticas.
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