Aqui há uns tempos, no passado mês de Julho, anunciámos neste blog, que a imprensa internacional estava ao rubro, pois um recente estudo científico publicado no conceituado Journal of Experimental Psychology tinha conseguido definir de uma vez por todas, quais são as características “sine qua non”, para que alguém seja cool.
Dissemos então que na América, o The New York Times titulou em grandes parangonas: “What Makes Someone Cool? A New Study Offers Clues”, que em Londres foi o mesmo e o The Guardian anunciou com estilo, “You know it when you see it, experts size up scientists attempt to define cool”, e que aqui mesmo ao lado, em Madrid, também o El Pais difundiu a enorme novidade, “La ciencia de lo cool: las seis actitudes que te hacen irresistible”.
Mas dissemos mais, pois dissemos também que em Portugal, esse tão importante estudo científico sobre o que é ser cool, foi olimpicamente ignorado por praticamente toda a nossa comunicação social.
Se traduzíssemos o termo cool para português, algo que não se deve fazer, a palavra mais aproximada que encontraríamos seria fixe. Não sendo bem a mesma coisa, ainda assim, um tipo fixe é o que fica mais perto de um tipo cool.
Isto em português de Portugal, pois caso seja em português do Brasil, a expressão que mais se aproxima de cool, é legal. Um tipo cool no Brasil é um cara legal.
Esclareça-se que segundo o estudo, ser um tipo fixe ou um cara legal, não é o equivalente a ser-se uma boa pessoa. Quer isto dizer, que um tipo pode ser uma boa pessoa, mas não ser nada cool.
Com efeito, as chamadas boas pessoas, são vistas como sendo simultaneamente conformistas, tradicionais, estáveis, calorosas, empáticas, conscienciosas e tranquilas, já as pessoas cool possuem outras características, ou seja, são vistas sobretudo como sendo independentes, irreverentes e ousadas.
Quem nos lê, há de estar a perguntar-se mas a que propósito vem agora esta conversa acerca de quem é e não é cool. Ora bem, como antes dissemos, este estudo do Journal of Experimental Psychology foi ignorado pela quase totalidade da comunicação social nacional, facto que indicia que os portugueses se estão nas tintas para este assunto do cool, contudo, eis que esta semana sucedeu algo inusitado, os Anjos são cool.
Não é ao duo musical Anjos que nos referimos, nem aos seres celestes, mas sim ao bairro lisboeta com esse mesmo nome. O bairro dos Anjos estende-se desde a velha Rua da Palma, Almirante Reis acima, de um lado para o Desterro e do outro para o Largo do Intendente, prolongando-se colina acima até à Penha de França e à Graça, onde finda.
Aqui fica um vídeo, ainda do tempo da pandemia, que explica em sessenta segundos, a essência dos Anjos:
Mas por qual razão são os Anjos cool? A resposta é simples. A revista Time Out internacional, publica anualmente em Setembro, uma lista com “The coolest neighborhoods in the World”.
O resultado de 2025 saiu na passada semana, sendo que, os Anjos ficaram num honroso décimo segundo lugar. É o único bairro de Portugal, e de toda a Península Ibérica, que consta da dita lista.
Dessa lista constam nos primeiros lugares bairros como o de Jimbōchō em Tóquio, o Barra Funda em São Paulo, o Camberwell em Londres, o Mullae-dong em Seul, o Ménilmontant em Paris e o Nakatsu em Osaka. Depois desses vem o bairro dos Anjos, que tem atrás de si na lista sítios tão célebres como o Red Hook em Nova Iorque, o Portales no México, o Little River em Miami, Botafogo no Rio e Sheung Wan em Hong Kong.
Ora bem, se os Anjos são o bairro mais cool de Portugal e de toda a Península Ibérica, e o décimo segundo do mundo, há de ser porque tem algumas das características, que o Journal of Experimental Psychology identificou como sendo as próprias das gentes cool.
Recordemos que as principais características das pessoas cool é serem gente independente, irreverente e ousada. Os que assim são, diz o estudo, são vistos pelos outros como sendo atraentes, capazes de inspirar, seduzir ou liderar. São igualmente vistos como gente pouco dada a agir conforme a regras estabelecidas.
Feita a síntese, vejamos em que medida o bairro dos Anjos detém as referidas características: independência, irreverência e ousadia. Citemos a Time Out, que a propósito dos Anjos diz o seguinte: “There’s no doubt that setting the table is the local past-time, from boards of petiscos to fusion cuisine, not forgetting pizzas, speciality coffee and the sandwiches of the moment.”
Só por esta citação, já se percebe, que nos Anjos se come de tudo, ninguém tem receios de experimentar tudo o que houver para papar, seja a comida de fusão, venha da China, da Índia ou do Nepal, ou seja um petisco tradicional.
Há nos Anjos um restaurante-bar bastante irreverente, que junta música e plantas, e que por vezes apresenta até música para plantas, tal local chama-se “A Mata” e serve pratos como salada de bufala, tzatziki e doces do Zukar.
Não muito longe de “A Mata”, situa-se o “Maria Food Hub”, cuja cozinha é de inspiração internacional, mas cujos ingredientes são portugueses. É um sítio conhecido pela combinação de ostras e vinho.
Por falar em vinho, falemos de Abbie Gill, que nos diz o seguinte: “A minha tia tem uma pequena pastelaria em Londres e o meu bisavô e trisavô tinham uma garrafeira em Liverpool para a qual importam vinhos portugueses, desde a Segunda Guerra Mundial”. Vai daí, Abbie decidiu abrir um bar de vinhos portugueses nos Anjos, o “Nata”, que fica no Largo de Santa Bárbara.
Abbie Gill quer contar a história de cada pequeno produtor de vinho e surpreender os seus clientes com sabores, tons ou proveniências muito diferentes dos habituais.
Mas não se pense que os Anjos são cool apenas por causa da comida e da bebida, nada disso, pois também existem umas quantas galerias de arte que se afirmam pela sua independência e ousadia, como é o caso da “Passevite”, que é um espaço com uma programação própria, com exposições individuais e colectivas de autores nacionais e internacionais, de vários géneros artísticos, havendo dias em que a Passevite se transforma em Cine-Passevite.
Abaixo uma foto da Galeria Passevite em dia de inauguração de uma exposição.
Em Portugal nunca se leu muito, razão pela qual, abrir uma livraria sempre um passo ousado, todavia, nestes tempos em que muita gente passa largo tempo a olhar para os ecrãs, abrir uma livraria é quase um acto irreverente. Mais o é ainda, no caso da livraria Greta, que também se situa nos Anjos.
A decorar o espaço da livraria Greta, há fotografias, ilustrações e posters feitos por mulheres. sendo que só se vendem livros também eles escritos exclusivamente por mulheres. Para além disso, o acervo conta igualmente com fanzines e revistas produzidas por mulheres.
A uns metros da Greta situa-se a It's a Book, uma livraria inteiramente dedicada a livros de literatura infantil. Não muito longe, mas já na Avenida Almirante Reis, fica a Kingpin Books, um espaço de 215 metros quadrados, todo ele dedicado à banda desenhada.
Poderíamos ainda falar-vos de outros locais nos Anjos independentes, irreverentes e ousados, sítios como a loja de vestuário e calçado vegano “Couve”, ou o “Rude” que serve apenas queijos, enchidos, conservas a acompanhar com vinho, ou ainda e por fim, a “Antecâmara”, um atelier de arquitectura que funciona numa antiga padaria, e cujo interior apresenta fornos e salas de amassadeiras, existindo ainda uma galeria de arte na frente do espaço, virada para a rua, situada exactamente no local onde antes se vendia o pão.
Em resumo, o que não falta nos Anjos é gente independente, irreverente e ousada, o mesmo é dizer cool. Por assim ser, cremos que é merecida e justa a distinção concedida ao bairro pela Time Out internacional, esperemos agora que outros bairros de Portugal sigam o exemplo dos Anjos.
Para finalizarmos, deixamos-vos a lista com “The 39 coolest neighbourhoods in the world in 2025”:
https://www.timeout.com/travel/coolest-neighbourhoods-in-the-world-2025
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