Uma das maiores ambições deste blog, é a de conseguir que as mais audazes e
originais obras de arte, ou seja, aquelas que à primeira vista parecem ser
incompreensíveis, sejam entendidas por todos, mesmo por quem não é nada dado a
intelectualidades.
Nesse contexto, hoje queremos explicar a toda a gente, a razão pela qual, a
arte conceptual, ao contrário do que se possa pensar, nos fala afinal da vida
comum e do quotidiano de qualquer um.
Quem nos quiser acompanhar, vai ter de se encher de paciência, pois o
caminho a fazer é longo, no entanto, ao chegarmos ao final, vão ver que valeu
bem a pena, e que muitos perceberão o que não percebiam, no que concerne à arte
conceptual.
No nosso último texto, falámos acerca de nada, referimo-nos então a um
museu em Zurique, na Suíça, cujo nome é No Show Museum.
É um museu onde as peças expostas são todas conceptuais, sendo o seu tema o
nada. É portanto o sítio ideal, para fazermos esta nossa viagem.
O No Show Museum é a primeira e única instituição do mundo, dedicada ao
nada e às suas múltiplas manifestações. Abaixo, a vitrina de uma das salas do
No Show Museum, na qual está perfeitamente à vista, que nada lá está exposto, o
mesmo é dizer, que não há nada para ver.
Sendo arte conceptual, o suposto é mesmo não haver, nada para ver.
Ora bem, um museu dedicado a nada, à partida não parece ser coisa muito
compreensível ou interessante, ou então, parece ser algo só para gente
intelectual, mas não, se nos seguirem até ao final, vão ver que não é esse o
caso.
Como iremos perceber, as obras do No Show Museum falam-nos das mais banais
coisas do dia-a-dia, daquelas que a todos acontecem, e às quais dedicamos
grande parte dos nossos pensamentos e conversas habituais.
Ah sim, a arte conceptual, mesmo não parecendo, fala-nos da vidinha,
daquilo que no dia-a-dia nos vai sucedendo, ou seja, no que pensamos ao
adormecer, do que nos lembramos ao acordar, e das conversas que vamos tendo por
ali e por acolá.
Mas antes de tudo o mais, é preciso saber-se que o nada, em termos conceptuais, pode ser visto sobre diversas perspectivas, tendo-se o No Show Museum concentrado nas seguintes oito, que são aquelas às quais, também nós dedicaremos a nossa atenção:
- O nada como Recusa: A Arte de Não Fazer Nada
- O nada como Aniquilação: A Arte da Destruição
- O nada como Vazio: A Arte da Ausência
- O nada como Invisibilidade: A Arte do Imperceptível, do Invisível e do
Oculto
- O nada como a Redução: A Arte do Minimalismo
- O nada como Lacuna: A Arte da Omissão
- O nada como Declaração: A Arte de Não Dizer Nada
- O nada como Noção: A Arte da Pura Imaginação
Para esta nossa viagem não se tornar demasiado
longa e eventualmente maçadora, ao dia de hoje, vamos dedicar-nos às primeiras
cinco, e num próximo dia, logo nos dedicaremos às restantes três.
Posto isto, vamos lá agora nós, conversar sobre cada uma dessas
perspectivas acima enumeradas. Assim sendo, comecemos pela primeira: “O nada
como Recusa: A Arte de Não Fazer Nada”.
A qualquer um de nós, numa ou noutra ocasião, já nos apeteceu nada fazer.
Quem é que em algum momento, não disse para si mesmo, ou para quem em redor
quisesse ouvir, hoje recuso-me a fazer seja o que for?
Estamos perfeitamente convencidos, que haverá pouco quem, em determinadas
ocasiões, não se tenha recusado a fazer o que havia para fazer.
Dadas as devidas circunstâncias, qualquer pessoa, ou porque está estafada,
ou porque está chateada, ou porque não lhe apetece, ou simplesmente porque quer
ser embirrante, há um dia em que declara assertivamente: “Hoje não faço nada!”
Em tais ocasiões, ou bem que o jantar fica por confeccionar, ou bem que a
loiça fica por lavar, ou bem que as contas ficam por pagar, ou bem que a casa
fica por arrumar, ou bem que nem sequer se aparece ao serviço. Acontece.
Posto isto, cremos que neste momento, quem nos lê, e mesmo que não seja
dado a conceptualismos, encontra-se já em perfeitas condições de perceber a
obra conceptual abaixo, da autoria de Laurie Parsons, que data de 1990.
A dita artista recusou-se a fazer seja o que for, e assim sendo, apresentou
como obra sua, uma sala de um museu completamente vazia. Feitas as contas, não
é assim tão diferente de se deixar de fazer o jantar, de não se lavar a loiça,
ou simplesmente de se faltar ao emprego só porque sim.
Passemos agora à segunda perspectiva das oito que antes enumerámos, a
saber, O nada como Aniquilação: A Arte da Destruição.
Não é assim tão invulgar, que num ou noutro momento da nossa existência,
pratos sejam veementemente atirados pelo ar, roupas sejam raivosamente
rasgadas, objectos sejam ferozmente atirados pela janela fora, automóveis
apareçam riscados em toda a sua extensão e pertences pessoais muito queridos,
fiquem totalmente danificados para toda a eternidade. Acontece.
Em todos esses casos, estamos perante fenómenos que podem muito bem
equiparar-se à prática conceptual da Arte
da Destruição, ou também ao nada como
Aniquilação.
Na realidade, até as criancinhas gostam de destruir coisas, ou, pelo menos,
dantes gostavam. Não havia menina, que tendo uma boneca, não adorasse
arrancar-lhe as pernas e os braços, e mais tarde inclusivamente a cabeça. Assim
como também não havia rapaz, que tendo-lhe sido oferecido um carrinho eléctrico
para brincar, mais tarde ou mais cedo não o começasse a desmontar todo aos
bocados.
Significa isto, que O nada como Aniquilação: A Arte da
Destruição, é uma prática conceptual que nos acompanha desde a mais
tenra idade, e que se prolonga até à altura em que já somos maduros.
Por assim ser, e compreendido isso, já todos estamos em condições de
entender uma obra de vídeo-arte do artista Francis Alÿs.
Nela, ele pega num paralelepípedo de gelo, e arrasta-o pelas quentes ruas
da Cidade do México, até o destruir completamente, o mesmo é dizer, até que o
paralelepípedo de gelo derreta.
Francis Alÿs parece ter-se divertido tanto a arrastar um paralelepípedo de
gelo pela Cidade do México, quanto certas meninas se divertem a arrancar as
cabeças das suas bonecas, e o quanto alguns rapazes se divertem a desmontar
brinquedos aos bocados, ou ainda, o quanto certas pessoas se consolam de alguma
desdita, partindo a loiça toda.
Em resumo, temos aqui mais um exemplo, de como a arte conceptual, não é
assim tão distinta dos mais vulgares e comuns acontecimentos quotidianos.
Continuemos com o terceiro tema, a saber, O nada como Vazio: A Arte
da Ausência.
Nos quotidianos comuns, ausências é coisa que não falta. Há aquelas
ausências surpreendentes, tipo aquele típico caso do indivíduo que saiu para ir
ali à esquina comprar tabaco, e nunca mais se soube nada dele.
Mas depois, há também aquelas ausências circunstanciais, do tipo de quando
a esposa telefona ao seu fiel marido, a perguntar-lhe onde é que ele anda, que
nunca mais aparece em casa para jantar e que, dado o facto de ser já uma da
madrugada, quando regressar ao lar, o mais certo é encontrar apenas um prato
vazio, cheio de nada.
Há ainda muitas outras ausências no dia-a-dia, sendo uma das mais comuns a
dos empreiteiros e/ou mestres-de-obras. Não há quem já não tenha tido a
experiência de fazer obras em casa ou em qualquer outro lado, e após ter
contratado um empreiteiro ou mestre-de-obras, constate com espanto e
incredulidade, que no dia previamente combinado, o dito está ausente em parte
incerta.
Em boa verdade, é certo e sabido, que essa vai ser somente a primeira de
muitas ausências que se hão-de seguir. É uma longa tradição nacional, a de que
empreiteiros e mestres-de-obras se ausentem frequentemente da obra que
combinaram efectuar. Por isso se diz, que se sabe sempre quando uma obra
começa, nunca se sabe é quando é que ela acaba.
Dado o facto de todos nós, já termos tido este tipo de experiências,
torna-se-nos perfeitamente compreensível o sentido da obra conceptual abaixo,
da autoria do artista suíço Urs Fischer.
Sigamos em frente,
para a quarta perspectiva: O nada como Invisibilidade: A Arte do
Imperceptível, do Invisível e do Oculto.
Para se compreender
esta noção conceptual, nada melhor do que pensarmos naqueles momentos em que
vamos à procura de algo que arrumámos num qualquer local, e quando lá voltamos,
em busca desse algo que procuramos, ele não se encontra no sítio onde antes o
deixámos.
Pensemos por exemplo,
no parque estacionamento de uma grande superfície comercial. Estacionamos o
automóvel, vamos às compras, regressamos passadas umas horas e não é que a
viatura se tornou invisível.
Andamos de um lado
para o outro, para trás e para a frente, e nada, o raio do carro insiste em
permanecer oculto.
Coisa semelhante, é
quando guardamos um documento numa gaveta, e passado um tempo o vamos procurar
nessa mesma gaveta e, para a nossa surpresa e posterior irritação, nada, o
papel desapareceu, e não está onde devia estar.
Um outro exemplo
possível, são as chaves. Quantas e quantas vezes as chaves desaparecem sem
razão aparente. Colocamo-las numa mala ou numa pasta, e quando precisamos
delas, vasculhamos e nada, tornaram-se completamente invisíveis.
Todas estas situações
quotidianas, apresentam-se-nos como uma experiência equivalente daquilo a que
conceptualmente, podemos designar como O nada como Invisibilidade: A
Arte do Imperceptível, do Invisível e do Oculto.
Sendo este o contexto,
e mais uma vez, estamos agora todos em situação de plenamente podermos apreciar
uma obra de arte conceptual, como esta abaixo da autoria de Bruno Jakob, que se
intitula “Breath, floating in color as well as black and white”.
Sigamos então para
quinta perspectiva conceptual, a última de hoje: O nada como a
Redução: A Arte do Minimalismo.
Esta é uma experiência
que todos conhecem, ou pelo menos os que pagam IRS. É só olhar para o recibo ao
fim de cada mês, verificar o valor do que foi descontado, para
imediatamente se ter uma sensação altamente conceptual.
Mas fora esta, há
outras experiências comuns que nos fazem compreender O nada como a
Redução: A Arte do Minimalismo. Falemos de carácter mais íntimo.
Imagine-se um ser do sexo masculino, que anuncia entusiasticamente à sua
parceira, a grande dimensão do seu entusiasmo por ela. Todavia, quando se
prepara para o mostrar, apanha uma friagem e, subitamente, esse entusiasmo
reduz-se a quase nada, a uma peça minimalista, ou seja, quase secreta.
E pronto, depois destas cinco, no nosso
próximo texto, abordaremos as últimas três perspectivas que nos restam, a
saber:
- O nada como Lacuna: A Arte da Omissão
- O nada como Declaração: A Arte de Não Dizer Nada
- O nada como Noção: A Arte da Pura Imaginação





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