Continuamos agora, o nosso anterior texto, em que quisemos explicar a toda
a gente, a razão pela qual, a arte conceptual, ao contrário do que se possa
pensar, nos fala afinal da vida comum e do quotidiano de qualquer um.
A esse propósito falámos do nada e de um museu que existe em Zurique, o No
Show Museum, ao nada dedicado. Com efeito, há poucas coisas que sejam mais
conceptuais que o nada, e por isso esse museu é perfeito para ilustrar a nossa
presente tese, ou seja, que a arte conceptual reflecte situações comuns e banais,
dessas que sucedem todos os dias.
Como anteriormente referimos, o No Show Museum divide conceptualmente o nada em oito perspectivas distintas, no nosso primeiro texto tratámos das primeiras cinco, hoje vamos falar das restantes três, que são as seguintes:
- O nada como Lacuna: A Arte da Omissão
- O nada como Declaração: A Arte de Não Dizer Nada
- O nada como Noção: A Arte da Pura Imaginação
Comecemos então pela primeira dessas três, O nada como Lacuna: A Arte da Omissão.
Para ilustrarmos esta perspectiva vamos recorrer à
imagem abaixo, que é uma espécie de mapa concebido por Lewis Caroll, o famoso
autor de “Alice no País das Maravilhas”.
Como se pode verificar, o mapa apresenta-nos todas as coordenadas
e pontos cardeais, mas estando nós na posse desses dados, e ainda assim, não
fazemos a mínima ideia de qual o lugar representado no mapa.
Em boa verdade, pode ser um qualquer lugar do mundo,
mas simultaneamente e contraditoriamente, pode também ser lugar nenhum.
Como já se percebeu, há algo que o mapa omite,
mesmo que apresente as coordenadas e os pontos cardeais, o que em princípio
deveria servir para nos orientarmos e sabermos qual o sítio representado, mas
no entanto, não.
Apesar desta situação ser de grande
conceptualidade, a realidade é que é uma experiência relativamente vulgar, no
quotidiano de qualquer um de nós. Experimentem por exemplo, ir a uma repartição
pública tentar obter uma qualquer certidão de que necessitem.
Nós já experimentámos e podemos contar-vos
como é. Se consultarem a internet, vão constatar que nela há informações com
moradas e horários de repartições públicas, que, por acaso, não existem, só que
este último ponto, está omisso.
Vejamos um exemplo. Há múltiplos sites
oficiais, que nos informam que em Lisboa existe uma Conservatória do Registo
Predial na Rua Visconde de Santarém nº 32. Todos os dias, sem excepção, há
imensa gente que para aí se dirige, só que uma vez lá chegada, percebe que essa
conservatória aí não existe há largos anos.
Em conclusão, quem vai à Conservatória do
Registo Predial na Rua Visconde de Santarém nº 32, o que nesse contexto lá
encontra é nada, coisa que constitui uma evidente lacuna para quem quer tratar
de uma certidão.
Inclusivamente, o próprio edifício onde a dita
conservatória antigamente funcionava, há muito que foi demolido e substituído
por um outro, mais moderno e arejado. Em síntese, temos aqui uma situação
conceptual, muito semelhante à do mapa de Lewis Carroll, ou seja, um perfeito
exemplo de O nada como Lacuna: A Arte da Omissão.
Podíamos dar-vos mais exemplos de outras
situações do mesmo género, todavia, preferimos antes deixar-vos a imagem da
obra abaixo, da autoria de Imi Knoebel, um brilhante artista alemão.
Passemos então a uma outra perspectiva
conceptual, das três que acima referimos, O
nada como Declaração: A Arte de Não Dizer Nada.
Esta presente perspectiva, é de longe a mais
fácil de compreender. Com efeito, quem é que não ouve quase diariamente,
assertivas declarações, que, feitas as contas, nada dizem ou significam?
Tais declarações tanto são feitas ao balcão de
uma tasca, como numa reunião, como até na televisão. Vejamos um exemplo
recente. O actual Primeiro-Ministro de Portugal, disse recentemente ao país que
gostaria, que o valor do salário mínimo, fosse de mil e seiscentos Euros.
Até aqui tudo muito bem, todavia, quando
questionado sobre a data em que isso sucederia, o chefe do governo afirmou que
essa actualização salarial, seria calendarizada, quando houvesse alicerces para
tal.
Na verdade, está muito bem visto, pelo Senhor
Primeiro-Ministro. Façamos uma analogia, imaginemos que alguém nos deve um
valor monetário relativamente elevado.
Deve-nos, porque nós, gentilmente lhe
emprestámos a dita verba. Tendo já passado algum tempo, questionamos o devedor,
sobre quando pretende devolver-nos o dito dinheiro, ao que ele responde que irá
calendarizar essa devolução, quando houver alicerces para tal.
Reparem os nossos leitores, que o nosso amigo
devedor, não afirma que nos vai devolver o dinheiro na data X ou Y, o que ele
diz, é tão-somente que se compromete apenas a calendarizar a devolução, e não
mais do que isso, quando houver alicerces para tal.
O que nós depreendemos da expressão, ”isso será calendarizado quando houver
alicerces para tal”, é que provavelmente ficámos a arder com o dinheiro
emprestado, e que o mais certo é dessa verba, nada chegarmos a ver.
Dito isto, e mais uma vez, aqui temos uma
situação vulgar e comum, em que a conceptualidade se mistura com o quotidiano.
Por assim ser, cremos que qualquer um, pelo
menos qualquer um que já tenha emprestado dinheiro a alguém e nunca mais o
tenha visto de volta, estará em condições de compreender perfeitamente a obra
de arte abaixo, cujo autor é o artista conceptual mexicano, Stefan Brüggemann.
Aqui chegados, falta-nos apenas abordar, a
última perspectiva, a saber, O nada como Noção: A Arte da Pura
Imaginação.
Como já calcularão, acerca desta perspectiva,
nada vos vamos dizer, se quiserem, imaginem vocês. Conceptualizem, pois então.






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