Ontem, no seu discurso de Natal, o actual primeiro-ministro de Portugal, com toda a seriedade deste mundo, pediu à lusitana noção uma mudança de atitude colectiva, e disse ao país que temos de ser mais como o Cristiano Ronaldo. Disse tudo isto sem se rir.
Como é evidente, nós, neste blog, reagimos com horror a tal pedido, pois se há coisa que nós não somos de todo em todo, é como o Cristiano Ronaldo. O dito futebolista disse um dia o seguinte com cara séria e compenetrada: “Penso que por ser rico, bonito e um grande jogador as pessoas têm inveja de mim".
Ora bem, nós, nem somos ricos, nem bonitos, nem grandes jogadores, e também não conhecemos ninguém a quem possamos causar inveja. Em resumo, nesse futuro país em que todos serão mais como o Cristiano Ronaldo, nós não seremos gente para ser levada a sério.
Segundo pesquisámos, o Cristiano Ronaldo não é apenas rico, bonito e grande jogador, tem também um excelente sentido de humor. É isso o que dele diz a sua companheira, a Georgina.
No relvado, devido à intensidade que coloca no jogo, Ronaldo é sério, mas fora dele é um brincalhão capaz de se rir de si mesmo. Isto também segundo o relato da Georgina, que destaca assim o lado leve e divertido de Ronaldo.
Se os nossos compatriotas acederem ao pedido do actual primeiro-ministro e começarem todos a ser mais como o Cristiano Ronaldo, nós não vamos conseguir acompanhar a nação, ficaremos para trás e acabaremos sozinhos e abandonados, seremos como uns párias desta nossa amada pátria.
Abaixo uma foto de um grupo de rapaziada intelectual do final do século XIX, que se auto-nomeou “Os Vencidos da Vida”. Era um grupo “jantante”, cujas reuniões ocorriam em locais como o restaurante Tavares.
Ficaram para a história por terem um enorme pessimismo relativamente à nação portuguesa. O grupo tinha como membros gente como o Ramalho Ortigão, o Eça de Queiroz, o Guerra Junqueiro, o Oliveira Martins e uns tantos outros.
Nós não sabemos como se manifesta o excelente sentido de humor do Cristiano Ronaldo, apesar disso, estamos desconfiados de que para além de não sermos ricos, bonitos e grandes jogadores, também não possuímos o tipo de humor característico do futebolista.
Com efeito, o nosso tipo humor, não é o próprio dos campeões, mas mais um assim afim aos vencidos da vida. Baseia-se num misto de referências intelectuais e de pessimismo existencial, tudo temperado com um leve cinismo filosófico.
Estamos mesmo em crer, que por muito brincalhão e capaz de se rir de si mesmo, que seja o Ronaldo fora do terreno de jogo, jamais a Georgina descreveria o sentido do humor do grande jogador da bola, como sendo um misto de referências intelectuais e pessimismo existencial, temperado com um leve cinismo filosófico. Ah pois é Georgina, toma lá esta e embrulha.
Como já se terá percebido, e apesar do apelo do actual primeiro-ministro, nós não queremos nada ser mais como o Cristiano Ronaldo. Se porventura ocupássemos o cargo de primeiro-ministro de Portugal, na nossa mensagem de Natal pediríamos ao país uma mudança de atitude colectiva, mas apelaríamos ao povo que todos fôssemos mais como Nova Iorque, mas não mais como o Cristiano Ronaldo.
Nós queríamos ser mais como Nova Iorque, essa imensa cidade que não se leva demasiado a sério. Tal revela-se perfeitamente no tipo de humor que por lá existe. Um humor que se baseia num misto de referências intelectuais e num pessimismo existencial, tudo temperado com um leve cinismo filosófico, mas que, para além disso, tem ainda um toque matreiro, tipo “street smart guy”.
Nós, os deste blog, nesse sentido, já somos um poucochinho como Nova Iorque, mas queríamos ser mais, e queríamos também que os restantes portugueses o fossem. Não sendo possível, mais vale sermos como somos, como o Cristiano Ronaldo é que não, poupem-nos!
Para ilustrarmos a nossa tese, vamos a partir deste momento recorrer aos cartoons da mais típica e antiga revista nova iorquina, a “The New Yorker”.
Há muito quem por cá, por Portugal, publique as suas considerações e opiniões em redes sociais e blogues, e leve muito a sério o que diz e escreve. Como se sabe, não é esse o nosso caso. É certo que este blog existe, mas se há coisa que não fazemos, é levarmos a sério o que dizemos e escrevemos.
A esse propósito, o cartoon que se segue, no qual um cão diz para um outro, que em tempos teve um blog, mas que agora decidiu voltar a dedicar-se exclusivamente a ladrar de forma contínua e sem sentido.
Digam lá, se não seria uma excelente notícia para a lusitana nação, se parte significativa dos que por cá escrevem e dizem coisas, não se levassem tanto a sério, seguissem o exemplo do cão acima, e desistissem de vez de divulgar as suas opiniões e considerações?
A nosso ver seria óptimo, mas claro que isso não vale nem para o actual primeiro-ministro, nem para a Georgina, nem para o Ronaldo, pois esses três são sempre imensamente giros de se ouvir.
Tanto em Portugal, como em Nova Iorque, como noutros sítios do mundo, existem reuniões. Quem já participou em reuniões, sejam de trabalho ou de condomínio, sabe perfeitamente, que não raras vezes, estas servem para muito pouco ou mesmo para nada.
Ainda assim, e mesmo quando são de utilidade muito duvidosa, não é por isso que as reuniões são mais rápidas. Muitas vezes prolongam-se indefinidamente, e chega-se ao fim delas, estando-se no mesmo exacto ponto em que estávamos no seu início.
Sabendo todos nós que assim é, por alguma estranha razão, continuamos a levar muito a sério as reuniões, ao que lá se diz ou não diz, e ao lavrar das respectivas actas. Nesse contexto, é refrescante ver o cartoon abaixo da “The New Yorker”, em que quem dirige a reunião, a resume do seguinte modo: “Bem sei que não fizemos nada, mas é mesmo para isso que as reuniões servem.”
Sintetizando, por cá são muitos os que se levam demasiado a sério, bem como também levam o que dizem e escrevem, e são igualmente bastantes, os que atribuem uma imensa seriedade a reuniões e às respectivas actas. Digamos que se Portugal fosse mais como Nova Iorque, ninguém ligaria tanto a tais coisas.
Outra coisa a que se liga muito em Portugal, é a certas expressões, sobretudo se aparentarem um ar de modernidade e forem ditas em inglês. Pensar “out of the box” é um clássico exemplo disso mesmo.
De quando em vez, e a propósito de tudo e de nada, lá nos vem alguém com a ladainha que temos de pensar “fora da caixa”. Para todos esses, aqui fica mais um cartoon:
Eça de Queiroz, um dos membros do grupo “Os Vencidos da Vida”, escreveu o seguinte: “O português nunca pode ser homem de ideias, por causa da paixão da forma. A sua mania é fazer belas frases, ver-lhes o brilho, sentir-lhes a música. Se for necessário falsear a ideia, deixá-la incompleta, exagerá-la, para a frase ganhar em beleza, o desgraçado não hesita... Vá-se pela água abaixo o pensamento, mas salve-se a bela frase.”
O que Eça quis dizer, é que em Portugal dá-se mais valor à forma do que ao conteúdo. Há muito quem incite a que se pense “out of the box”, mas tal não significa de maneira nenhuma, que se pretenda fazer mudanças, inovar, ou dar atenção a ideias diferentes, significa tão-somente, que é bonito e moderno usar-se a expressão “out of the box”.
Mas quem diz essa, diz outras. Por cá também se usam muito frases em que aparecem palavras como “autonomia”, “iniciativa” ou “inovação”, mas só porque fica bem dizê-las, pois frequentemente não correspondem a ideia alguma.
Em Nova Iorque, as pessoas e as instituições fazem coisas, por cá fazem-se projectos. Se outros exemplos disso não houvesse, bastaria referir o caso do novo aeroporto de Lisboa, que já vai em cinco décadas de projectos.
Será provavelmente por causa disso, que o Cristiano Ronaldo e a Georgina só se deslocam a Portugal no seu jacto privado, não fosse dar-se o caso de virem num avião da TAP e esta estar em greve, por causa do projecto de privatização da dita companhia aérea.
Só por graça, vejamos a descrição oficial desse duradouro projecto: “O projecto de privatização da TAP é um evento contínuo com fases distintas: a privatização inicial ocorreu em 2015, mas o actual projecto de reprivatização começou em 2025 e está dividido em quatro etapas, envolvendo pré-qualificação e fases de propostas, conforme publicações recentes de julho, setembro e outubro de 2025.”
Não há dúvida alguma, que projectos são uma coisa que excita imensamente os portugueses.
Falando ainda de aeroportos, o que se constata, é que os madeirenses estão muito mais adiantados relativamente ao continente, pois como que adivinharam o recente pedido natalício do actual primeiro-ministro, para que Portugal fosse mais como o Cristiano Ronaldo, e corria ainda o ano de 2017, e já eles tinham decidido baptizar o seu aeroporto com o nome Aeroporto Internacional Cristiano Ronaldo.
Aqui chegados, e face à mensagem do primeiro-ministro, a pergunta é só uma, o que queremos ou não queremos ser como portugueses. Mais como o Ronaldo? Mais como Nova Iorque?
A questão é equivalente à de Hamlet, o célebre personagem de Shakespeare, que um dia disse “Ser ou não ser, eis a questão”, ou seja, “To be, or not to be, that is the question”.
Terminamos com mais um cartoon nova-iorquino, que para nós encerra a questão. Por muito que a Georgina diga que o Ronaldo fora do terreno de jogo é um brincalhão capaz de se rir de si mesmo, nós preferíamos ser como Nova Iorque, uma cidade que não se leva demasiado a sério, e cujo humor se baseia num misto de referências intelectuais e pessimismo existencial, tudo temperado com um leve cinismo filosófico, e ainda com um toque matreiro de “street smart guy”.









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