INSPIRAÇÃO - Criámos um
guião de aprendizagem cujo título é “Onde
é que está a matéria?”. Nele aparecem figuras tão díspares como Leonardo da
Vinci, Diego Armando Maradona, Marcelo Rebelo de Sousa, Louis XIV e ainda umas
quantas mais. Assim fizemos, porque nesse guião falamos de arte, de
competências e igualmente do regime monárquico e também do republicano.
Para além de
tudo isso, um dos principais objetivos que tínhamos em mente com esse guião era
darmos um primeiro passo, de outros que se seguiriam ao longo de diversas
semanas, no sentido de prepararmos os alunos para uma vista de estudo ao Museu
Calouste Gulbenkian.
Tal é a razão pela qual nesse guião apresentámos peças da coleção do dito museu, e também porque nele há um mapa e uma fotografia aérea dos edifícios da Fundação Gulbenkian, assim como do seu esplendoroso jardim.
Antes de continuarmos, aqui vos deixamos o guião e a respetiva ficha de exploração:
Guião "Onde é que está a matéria"
Possivelmente, haverá muito poucos outros lugares em Portugal ou até fora dele, que tão bem nos possam servir de INSPIRAÇÃO, como a Fundação Calouste Gulbenkian.
O seu
jardim é um dos mais belos e conseguidos que existe. Ao por ele passearmos,
vamos encontrar uma tão vasta gama de sons, odores, frutos, flores, luzes e
cores, que não temos a menor dúvida de estarmos perante uma verdadeira
experiência imersiva, que simultaneamente nos proporciona uma profunda vivência
reflexiva.
Mas se o
jardim da Gulbenkian muito nos inspira, o seu museu não é certamente menos
inspirador. São inúmeras as pinturas, as esculturas, as tapeçarias e as demais
peças que muito nos fascinam, todavia, no contexto do guião “Onde é que está a matéria?”, há uma em
particular que queremos destacar, a pintura “Figura
de Velho” de Rembrandt, uma obra do século XVII.
A pintura não aparece no presente guião, irá surgir noutros que se lhe hão de seguir, mas apesar disso, inspira-o. Logo na sua capa há um detalhe de um autorretrato de Rembrandt, e já por aí, haverá uma óbvia ligação. Mas a principal relação a estabelecer, sucede mais à frente no guião, na ocasião em que nos aparece o celebrado poema de Luís Vaz de Camões intitulado: “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”.
Se olharmos
para a pintura de Rembrandt com atenção, veremos que no rosto, nas mãos e em toda
a postura do velho, temos uma figura de alguém que viveu muitos e diversos
tempos e já viu passar-lhe por diante incontáveis mudanças de vontades.
Quem já foi dar uma vista de olhos ao nosso guião e à respetiva ficha de exploração, terá verificado que nele falamos do dia 5 de outubro de 1910. Claro que a personagem representada por Rembrandt terá vivido num período muito anterior a essa data, mas ainda assim, constituiu uma INSPIRAÇÃO para o guião e, sobretudo, para que falássemos desse e doutros períodos de revolução.
Ao observar
a figura do velho, podemos muito bem imaginar, que ao longo da sua extensa
vida, ele tenha assistido a tremendas mudanças e conturbações, que em essência,
terão sido semelhantes a essas outras que sucederam em Portugal ao passar-se do
regime monárquico para o republicano.
Era nossa intenção que os alunos conhecessem um dos mais belos poemas de Camões, “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”, e que apesar da sua tenra idade, através dele de alguma forma pressentissem o que é a passagem do tempo e as evoluções e transformações que este continuamente consigo traz.
Pedimos-lhes
que tentassem declamar o poema, de modo a assim desenvolverem a sua competência
leitora, nomeadamente ao nível da expressividade. A esse propósito usámos uma
canção de José Mário Branco, na qual o dito poema está musicado:
Para além de
prepararmos a visita de estudo ao Museu Gulbenkian, queríamos igualmente que os
alunos percebessem o que são as competências do “Perfil dos Alunos à Saída da
Escolaridade Obrigatória” e as relacionassem com o seu quotidiano em coisas tão
simples, como por exemplo, arrumar o quarto, ir à mercearia ou trepar a uma
árvore (ver guião e ficha de exploração).
Queríamos
que relacionassem essas competências com o seu dia-a-dia, mas pretendíamos
também que as pensassem como sendo necessárias para se exercer uma qualquer
profissão, como por exemplo, a de futebolista.
Foi a esse
propósito que convocámos o Maradona para a nossa seleção de assuntos a conversar
na sala de aula. Dir-se-ia que para se ser futebolista, há que ter competências
físicas bastante desenvolvidas e, uma vez que o futebol é um desporto de
equipa, há também que ter grandes competências ao nível dos relacionamentos interpessoais.
No entanto,
Maradona serviu-nos de INSPIRAÇÃO porque é um personagem transdisciplinar! Com
efeito, as competências que detinha iam muito para além das óbvias, as próprias da
sua área disciplinar, o futebol. As suas altas competências ao nível do
pensamento crítico e criativo e da linguagem são absolutamente inquestionáveis.
“La mano de Dios”, foram essas as palavras, com que após um jogo entre a Inglaterra e a Argentina no Mundial de 1986, Maradona respondeu ironicamente a um jornalista inglês, que o questionava em tom acusatório sobre a duvidosa legalidade da jogada.
A verdade é que durante a partida, Maradona conseguiu
ludibriar toda a equipa de arbitragem e marcou um golo com a sua própria mão.
Na conferência de imprensa posterior ao jogo, justificou-se habilidosamente
atribuindo o dito golo à mão de Deus.
A Guerra das
Malvinas opôs a Inglaterra à Argentina e tinha, à época, terminado recentemente,
tendo os sul-americanos sido derrotados de forma humilhante. A vitória no
futebol como que foi uma pequena vingança, sendo que, por ter acontecido com um
golo batoteiro, ainda mais gozo deu aos argentinos.
Com o passar
do tempo, a expressão “La mano de Dios”
tornou-se um símbolo da Argentina e inspirou canções, livros, séries
televisivas e filmes. Tal e qual como os poetas criam frases que depois todos
usamos diariamente, mesmo que eventualmente não saibamos quem inicialmente as
escreveu, como por exemplo sucede com a expressão “mudam-se os tempos, mudam-se
as vontades”, também Maradona criou uma frase que se tornaria parte do
património linguístico quotidiano do seu país e não só.
Se isso não
é revelador de que, para além das suas competências físicas e desportivas,
Maradona era também uma figura poética e um ser transdisciplinar que possuía elevadas
competências criativas ao nível da linguagem e da comunicação, não sabemos o
que mais poderá ser.
Maradona foi
uma INSPIRAÇÃO precisamente pelo seu carácter transdisciplinar. O que nos
orientou na construção do guião “Onde é
que está a matéria?” foi a ideia de que “a matéria” de cada uma das várias
áreas disciplinares, não é uma coisa estanque, mas que pode ser cruzada e
misturada com “as matérias” de todas as restantes disciplinas.
Parece-nos
que não será uma afirmação temerária, se dissermos que é mais difícil
vislumbrar onde é que está “a matéria” quando são várias as disciplinas
envolvidas, de que quando é apenas uma. Daí a interrogação: “Onde é que está a matéria?”
É bem
verdade que neste guião abordámos temas e conteúdos (a matéria) de História,
Português, Expressão Dramática e de Cidadania, mas o mais que nos interessava
era desenvolver competências como o Pensamento Crítico e Criativo e a
Sensibilidade Estética e Artística.
Ponhamos um exemplo. Ao longo de boa parte do guião abordámos o tema (a matéria) relativo à transição da monarquia para a república, porém, o ponto fundamental que nos motivava não era exatamente esse, mas sim o de que os alunos desenvolvessem o seu pensamento crítico debatendo sobre esse assunto.
Foi por isso
que lhes propusemos uma discussão sobre quais as competências que pensavam ser
necessárias para se exercer o poder em cada um desses dois distintos regimes, e
também porque lhes mostrámos que no continente europeu, em países bem próximos
do nosso, tanto há regimes monárquicos como republicanos. Por fim, realizámos
uma espécie de referendo, monarquia versus república, em que cada qual fez a
sua escolha e a justificou.
E pronto,
estão aqui apresentados os principais motivos que nos serviram de INSPIRAÇÃO
para o guião “Onde é que está a matéria?”.
Podíamos também ter acrescentado figuras como Cleópatra ou Louis XIV, uma vez
que ambas aparecem no guião, mas não o quisemos fazer, para que quem nos lê não
pense que temos tendências pedagógicas megalómanas, Quanto à INTENÇÃO com que
construímos esse guião, isso deixamos para a nossa próxima publicação.
Neste entretanto, recordamos que quem quiser saber mais sobre a nova recente orientação deste blog, o poderá fazer lendo o texto anterior intitulado “INSPIRAÇÃO, INTENÇÃO e DIVAGAÇÃO”, as três graças que partir de agora serão as nossas musas.
https://ifperfilxxi.blogspot.com/2023/10/inspiracao-intencao-e-divagacao.html
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