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Mamma mia!

Não há coisa que as mães pela liberdade mais gostem de fazer do que proibir. Adoram particularmente proibir livros nas escolas, mas não só, apreciam também bastante, proibir conteúdos nos currículos escolares. Vem isto a propósito de um movimento norte-americano que se autodesigna como “Moms for Liberty”.

As “Moms for Liberty” surgiu como um grupo de mães que se opunha às restrições nas escolas durante a pandemia do Covid 19. As mamãs não queriam as escolas encerradas, máscaras nem vê-las e vacinas muito menos.

Contudo, uma vez passada a pandemia, o grupo continuou ativo tendo atualmente cerca de 100.000 membros. Nos tempos que correm, dedica-se a banir livros das bibliotecas escolares e a tentar que certos conteúdos sejam retirados dos currículos. Se quisermos sintetizar, o credo é este: numa escola, tudo o que, mesmo que apenas vagamente, tenha a mais leve referência a sexo, é para deitar fora.

Aparentemente estas mamãs terão pouco com que se entreter, uma vez que se desdobram em aparições nos meios de comunicação social, fazem abundantes manifestações e intimidam constantemente professores e direções de escolas. 

Para além disso, tentam e conseguem ter lugar em vários órgãos administrativos e pedagógicos das escolas, de modo a poder influenciar e condicionar todas as decisões tomadas. A coisa não é para brincadeiras, pois as mamãs são muito bem apoiadas em termos legais e contam com consideráveis doações financeiras para exercerem e promoverem as suas atividades.

Num destes dias, as mamãs pela liberdade enviaram uma missiva a todas as suas associadas e simpatizantes, em que se dizia assim: “Somente aquele que ganha a juventude conquista o futuro.” Uma mensagem muita inspiradora como se percebe, sendo que, é uma citação literal de um senhor que se chamava Adolf e que foi líder de um movimento que se chamava nazismo. Provavelmente, muitos dos que nos lêem, já terão ouvido falar dele, esteve muito ativo em meados do século passado na Alemanha.

Nos EUA há também um outro movimento, este autodesigna-se “Proud Boys”, que também é um nome bonito. Foi um dos grupos com maior intervenção aquando da invasão do Capitólio. O seu líder, de seu nome Enrique Tarrio, que na sequência da referida invasão foi condenado a vinte e dois anos de prisão, fez a seguinte afirmação: “Moms for Liberty is the gestapo with vaginas.” Saliente-se que o dito é suposto ser elogioso para as ditas mamãs.

A única consequência positiva que conseguimos vislumbrar como resultante das ações desenvolvidas pelas mamãs, é a de ter dado origem a uma abundante produção de “cartoons” nos jornais e revistas. Por exemplo, na imagem abaixo, vê-se um conjunto de tranquilas senhoras, numa espécie de clube de leitura. Apesar de aparentemente o tempo estar ameno, pelo menos a avaliar pelas camisolas de manga curta, ainda assim, não deixaram de acender uma fogueira para aquecer o ambiente.

                                                                                                             

As mamãs pela liberdade gostam de se fazer fotografar como um grupo giro e airoso, ou seja, como umas senhoras muito ativas e dinâmicas, que mesmo enquanto combatem uma feroz batalha pelo bem dos seus filhotes, conseguem encontrar um momento para se divertirem. Todavia, é tudo brincadeiras inocentes e sem maldade. Ó para elas na imagem abaixo, todas tão sorridentes e traquinas a fazerem acrobacias:

Recentemente, uma das três fundadoras e mentoras das “Moms for Liberty”, Bridget Ziegler de seu nome, foi apanhada noutras brincadeiras e acrobacias. Então não é que na noite antes de Natal, conjuntamente com o seu esposo, se envolveu numa brincadeira marota com acrobacias a três! Para além da Bridget e respetivo marido, participou ainda uma outra senhora cuja identidade se desconhece.

De uma destas é que ninguém estava à espera. Tanta conversa sobre moralidade, valores familiares e etc e tal, e vai na volta, precisamente na época de Natal, anda em coboiadas a três, está mal.

A situação foi parar aos jornais e a coisa azedou. As outras duas principais fundadoras e mentoras do grupo de mamãs afastaram-se da Bridget, sendo que muitas associadas e simpatizantes da causa, querem que ela se demita dos seus cargos. Ela diz que não.

Em síntese, está o caldo entornado. Para quem quiser analisar o caso com mais profundidade, aqui deixamos um artigo do New York Times dedicado ao tema:

https://www.nytimes.com/2023/12/16/us/politics/moms-for-liberty-sex-scandal.html

Um dos pontos mais intrigantes e fascinantes do grupo “Moms for Liberty”, é o modo como usam a palavra liberdade para atividades como proibir e banir. Há que lhes reconhecer algum talento lexical, não é qualquer um que consegue fazer proclamações em nome da liberdade, defendendo e praticando o seu exacto oposto.

Mais uma vez, foi um cartoonista quem melhor fez o resumo do caso, aqui fica:

Deixemos agora os Estados Unidos e vejamos o que sucede pelo lado de cá do Atlântico, mais concretamente pela vizinha Espanha. Há uma proposta que tem feito correr muita tinta no lado de lá da fronteira, o PIN parental. Consiste este dito PIN, que pais e encarregados de educação tenham o direito de decidir que os seus educandos não frequentem quaisquer atividades complementares nas escolas, nomeadamente, todas aquelas em que possam ser abordados temas “afetivo-sexuais”.

O Ministério da Educação de Espanha considera ilegal este dito PIN e recorrerá aos tribunais para anular os casos em que eventualmente seja aplicado. O próprio Tribunal Constitucional espanhol já fez saber que este suposto direito reivindicado por uns quantos pais e encarregados de educação, na verdade não existe. Todavia, mesmo esse esclarecimento não impediu que em regiões como em Múrcia ou na Andaluzia o PIN parental esteja a ser aplicado, tudo em nome da liberdade, pois claro.

 

Dito isto, o certo é que o PIN parental já passou para o lado de cá da raia. É ler a notícia abaixo do jornal Observador, para se perceber daquilo que consta:

https://observador.pt/factchecks/fact-check-pin-parental-dispensa-os-alunos-das-aulas-de-cidadania/ 

E pronto, com isto terminamos estas nossas considerações acerca das mamãs pela liberdade. Ontem tínhamos escrito acerca de livros proibidos, também em nome da liberdade, como é evidente. Esse texto complementa o que hoje escrevemos. Se alguém o quiser ler, é livre de o fazer, aqui fica o link:           

https://ifperfilxxi.blogspot.com/2024/01/livros-proibidos.html

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