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Kafka vai à escola e escreve ao pai.

 


Regressamos a Kafka. No texto anterior deste blog falámos deste autor e de como a sua rigorosa educação o atrapalhou, fazendo com que seguisse uma vida burocrática e cumpridora, na qual não podia dar voz aos desejos e anseios que sentia em si.

Isto excepto através da sua escrita literária, atividade que exercia quase como um clandestino, e só após ter despachado o serviço no escritório da companhia de seguros onde trabalhava.

 

Quem quiser ler o nosso texto de ontem para melhor compreender o de hoje, pode fazê-lo em https://ifperfilxxi.blogspot.com/2024/04/a-minha-educacao-prejudicou-me-em.html

 

Intitulámos esse anterior texto citando Kafka: “A minha educação prejudicou-me em vários aspetos”. A frase parece ter o seu quê de irónico, no entanto, se conhecermos a biografia do escritor e a sua relação com o pai, percebemos que se aproxima mais da tragédia do que propriamente da ironia.

 

Em 1919, infeliz com o frio acolhimento paterno ao anúncio do seu noivado com Julie Wohryzek, Kafka escreveu durante nove dias seguidos uma longa carta ao pai. A carta continha mais de cem páginas manuscritas e nunca foi enviada.


A carta inicia-se assim: “Querido pai, perguntaste-me recentemente por que digo ter medo de ti. Eu não soube, como de costume, o que te responder, em parte justamente pelo medo que tenho de ti, em parte porque existem tantas razões que justificam esse medo, que eu não poderia dizê-las todas numa conversa minimamente coerente. E se procuro responder-te aqui por escrito, não deixará de ser de um modo incompleto, porque também ao escrever o medo e as suas consequências me atrapalham diante de ti e porque a imensidão do tema ultrapassa de longe a minha memória e o meu entendimento.”

 

Como é claro logo neste início da missiva, Kafka tinha um medo difuso mas muito concreto do pai. Se continuarmos a ler a carta, perceberemos mais à frente que esse medo não estava relacionado com qualquer tipo de violência ou agressividade, mas sim com o receio extremo que Kafka possuía do julgamento negativo que o pai pudesse fazer da sua vida e das suas ações.

 

A autoridade do pai era inexorável, era o pilar que sustentava toda a família. Kafka fala dele descrevendo-o como um homem que “trabalhou duramente a vida inteira, sacrificando tudo pelos filhos, especialmente por mim, e graças a isso eu vivi à larga, desfrutei de completa liberdade para estudar o que queria, não precisei ter qualquer preocupação com o meu sustento e portanto nenhuma preocupação.”

 

Noutros momentos dessa missiva Kafka aborda os métodos pedagógicos do seu pai, sendo numa dessas passagens que começamos a perceber melhor o sentido da sua frase “A minha educação prejudicou-me em vários aspetos”.

 

Um dia, ainda em criança, durante a noite, por mera birra, Kafka pôs-se a gritar por água. O pai mandou-o calar várias vezes, mas Kafka não lhe obedeceu. Então o pai tirou-o da cama em pijama e colocou-o do lado fora da porta de casa, ali o tendo deixado ficar por bastante tempo.

 

Escrevendo sobre esse episódio na já referida carta ao pai, Kafka diz assim: “…talvez não fosse realmente possível conseguir o sossego noturno de outra forma; mas quero caracterizar com isto os teus recursos educativos e os efeitos que eles tiveram sobre mim. A partir daquele momento eu tornei-me obediente, mas fiquei internamente ferido. (…) Anos depois ainda sofria com a torturante ideia de que um homem gigantesco, o meu pai, podia vir quase sem motivo tirar-me da cama à noite para me levar, me pôr fora à porta de casa e me deixar só, eu era portanto para ele, uma espécie de nada.”

 


Mas se a educação familiar de Kafka o fez sentir uma espécie de nada, a educação escolar não o terá feito sentir de modo diferente, razão pela qual, um dia escreveu que “Toda a educação assenta nestes dois princípios: primeiro repelir o assalto fogoso das crianças ignorantes à verdade e depois iniciar as crianças humilhadas na mentira, de modo insensível e progressivo.”

 

No nosso texto de ontem, dizíamos que houve quem interpretasse uma das mais importantes obras de Kafka, “O Processo”, como uma metáfora da vida escolar à época, ou seja, no início do século XX. Vejamos hoje o que isso significa.

 

Mas antes ainda, recordemos a narrativa de “O Processo”. Numa manhã, Josef K., chefe de escritório de um banco, é preso por dois agentes não identificados de uma agência não definida, por um crime não especificado.

Josef K. tenta provar a sua inocência, mas não consegue sequer saber daquilo que é acusado. Confronta-se com uma opressiva burocracia que funciona automaticamente e de um modo desumano, seguindo procedimentos estabelecidos que ninguém questiona.

K. acaba por ser julgado e condenado sem nunca perceber porquê. Inocente ou culpado, para a mecânica judicial instalada e para os funcionários que a serviam, Joseph K. era tão-somente mais um igual a tantos outros, no fundo, uma espécie de nada.

 

À época de Kafka, todos os dias na escola os alunos obedeciam sem levantarem quaisquer questões, o professor era uma autoridade inquestionável. Calados e quietos, deviam copiar mecanicamente do quadro o que lá estava e desse modo irem aprendendo.

Copiavam durante anos. Se percebiam o porquê do que copiavam ou não, isso pouco interessava, o que importava era que copiassem e fizessem o que havia para fazer. Desde que se habituassem a fazê-lo, tudo estava bem e os procedimentos seguiam o rumo estabelecido.

 

As frases citadas nos três cartoons que abaixo se seguem, são de uma edição inglesa de “O Processo”, cremos que não necessitam de tradução. Os bonecos representam alunos, exceto no terceiro e último cartoon, em que há dois bonecos maiores, nesse caso serão professores.

 


Uma vez tendo copiado abundantemente todas as matérias do quadro, era suposto os alunos estudarem-nas. Estudar consistia simplesmente em ler repetidamente o que se tinha copiado, para que quando se fosse julgado num teste ou exame, se soubesse responder corretamente e atempadamente a tudo sobre o que se fosse questionado.

 

Independentemente de onde tinha vindo, de quem eram os seus pais, em que condições vivia ou das situações por que teria passado, ao ser julgado num teste ou exame cada aluno era tomado como se fosse um indivíduo isolado do resto da sua vida. Ou respondia a tempo e a horas ao que lhe perguntavam, ou era condenado.

 

Eventualmente o juiz poderia tomar em consideração um ou outro aspeto relativo à vida do aluno, algum fator atenuante, mas isso não era certo, pois como era uso dizer-se “o professor tem a faca e o queijo nas mãos”, e tal era algo que ninguém punha em questão. Havia respeito, pois então.

 

E por haver respeito e por ter a faca e o queijo nas mãos, o professor poderia valorizar de um modo distinto a resposta de um ou outro aluno e enaltecer ou louvar o trabalho de uns poucos, mas isso era algo que só a ele lhe competia e cujos critérios eram um mistério.

 


Tal como os funcionários judiciais retratados por Kafka em “O Processo”, nessa época os docentes também pouco podiam fazer pelos alunos que eventualmente não conseguissem aprender, que não fosse seguir os procedimentos, que inevitavelmente os conduziriam a uma condenação.

 

Os professores viam-se a si mesmo como humildes empregados de um sistema no qual cumpriam as regras, sendo que estas implicavam que todos os alunos sem excepção copiassem o que estava no quadro, fixassem o que tinham copiado e o soubessem repetir no momento certo. Era para que esses procedimentos fossem diariamente cumpridos, que os docentes eram pagos.

 


Sendo este o contexto escolar e familiar em que Kafka cresceu não admira que se sentisse uma espécie de nada. No entanto, como era cumpridor, cumpriu com diligência todas as etapas do processo, inclusive na sua vida adulta, tendo prontamente encontrado um emprego decente numa companhia de seguros no qual continuou a executar aplicadamente os requeridos procedimentos.

 

Não espanta portanto, que se sentisse tal e qual como o personagem do seu conto “A Metamorfose”, ou seja, que se identificasse com um inseto rastejante, como por exemplo, com uma barata.

 


Era através da sua escrita literária que Kafka escapava à sua vida de inseto rastejante. Escreveu autênticas obras-primas da literatura, todavia pediu a um seu amigo de sempre, Max Brod, que caso falecesse este queimasse todos os seus manuscritos.

 

Kafka morreria com 40 anos de tuberculose, mas antes disso escreveu ao seu amigo: “Querido Max, o meu último pedido: Tudo o que eu deixo para trás... na forma de diários, manuscritos, cartas (minhas e de outras pessoas), esboços, e assim por diante, deve ser queimado sem ser lido.”

 

Max Brod não cumpriu o pedido de Kafka, pois caso o tivesse feito, jamais teríamos conhecido um dos maiores escritores de sempre. Contudo, o que esse pedido da Kafka revela é que nem após a morte, ele queria que o conhecessem por algo mais do que por aquele que cumpre, que obedece, que se esforça e faz o que tem a fazer. No fundo não queria que soubessem que era alguém diferente dos outros, quando toda a sua educação tinha sido para ser tal e qual igual aos outros, ou seja, para ser uma espécie de nada, uma mera peça da maquinaria que funciona automaticamente, num contínuo processo que nada nem ninguém pode deter.

 


Mas dito tudo isto, o certo é que os escritos de Kafka eram, e continuam a ser, lidos por muitos. De todos esses, certamente que houve uns tantos, que por os terem lido, conseguiram escapar à maquinaria ou a acordarem metamorfoseados em baratas. Isto, por ao lê-los terem percebido, o que Kafka quis dizer. Por assim ser, e ao contrario do que é uso dizer-se, a sua obra não é pessimista, é sim plena de esperança.

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