Iniciámos
ontem um percurso por sete das maravilhas de Portugal, que não fazem capas de
revistas e raramente aparecem na televisão. As três primeiras foram a
Cinemateca em Lisboa, o Centro de Artes Visuais em Coimbra e o Museu de Arte
Contemporânea em Elvas.
Continuaremos hoje o nosso percurso, com a quarta das maravilhas, mas antes disso, se alguém quiser dar uma vista de olhos ao nosso texto anterior, aqui fica:
https://ifperfilxxi.blogspot.com/2024/05/sete-maravilhas-de-portugal-as-tres.html
Sigamos
desta vez para norte, para um lugar não muito longe do Porto, Leça da Palmeira.
É nessa localidade que fica uma casa de chá, situa-se mesmo junto ao mar, quase
dentro do vasto Oceano Atlântico.
Falamos-vos
da chamada Casa de Chá da Boa Nova, obra projetada pelo arquiteto Siza Vieira,
cuja função original era a que o próprio nome indica, ou seja, servir ao fim do
dia aos seus clientes, um chá quente acompanhado de torradas com manteiga
barradas.
Apenas por
ser essa a sua função, percebemos imediatamente que, apesar de se localizar
junto ao mar, a dita casa nada tem que ver com esplanadas e outros
estabelecimentos estivais, onde em dias quentes se vai tomar uma bebida para
nos refrescarmos ou comermos marisco, nada disso, parece antes ser um abrigo
próprio para nos recolhermos da invernia, do frio, da ventania e do mau tempo.
A Casa de
Chá da Boa Nova ergue-se por entre escarpadas rochas e tem por horizonte um mar
agreste e bravio, sendo por tal natural, que no seu interior nos sintamos
agasalhados e protegidos do extenso oceano que temos pela frente.
O mar diante
da Casa de Chá não é o dos cartões postais, tranquilo, azul, calmo e que
convida a ir banhos, é mesmo o seu exato oposto. É uma imensa extensão de
desconhecido onde se adivinham inúmeros perigos. É um mar que se agita e ruge,
e que continuamente embate nas rochas com força e violência.
A esse
horizonte já algo assustador, acrescenta-se ainda o que há em terra, rochas
ásperas e escuras, que configuram uma paisagem agreste e dura. É nesse
contexto, que a Casa de Chá nos aparece quase como um porto seguro. Um sítio no
qual nos podemos recolher do que há lá fora, onde de dentro, aconchegados e
quentes, podemos observar os elementos enfurecidos enquanto bebemos um caloroso
chá juntamente com umas afáveis torradas.
A Casa de
Chá respeita tanto o mar e a paisagem circundante, que quase não se quer dar a
ver. Insere-se bem no meio das rochas e basta dela nos afastarmos um pouco,
para quase já nem a vermos.
Por assim
ser, a sua arquitetura revela simultaneamente uma espécie de pudor e também um
certo temor, é como se o edifício soubesse que perante a imensidão do mar, o
majestoso céu e a dureza e agrura do solo, ela pouco mais é do que um mero
ponto de abrigo num todo mais amplo. É como se a casa tivesse plena
consciência, que diante da poderosa natureza, convém ter-se sempre um certo
receio e um pouco de modéstia.
A maior
parte dos historiadores defende que o nome de Portugal teve origem na expressão
latina “Portus Cale”, cujo significado é “Porto quente”. Nesse sentido, é bem
possível que a Casa de Chá da Boa Nova possa ser vista como uma metáfora
arquitectónica da essência da nação lusitana.
Com efeito,
assim como os antigos acreditaram que era possível construir um país que apesar
de ter por defronte o mar bravio, pudesse ser um sítio calmo, abrigado e
tranquilo, de igual modo, Siza Vieira acreditou que era possível erguer uma
serena e cálida casa de chá, da qual se avistasse calmamente potentes ondas,
ventos frios e inclementes tempestades.
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