Passada a primeira quinzena de Agosto, agora a contagem é claramente decrescente, pois já não restam dúvidas que a pouco e pouco, o Verão se encaminha velozmente para o seu fim. Enquanto tal não acontece, nós vamos continuando com esta nossa série de textos dedicados a fitas de Verão.
Para adiantarmos serviço, hoje vamos falar-vos de um filme que não se fica pela primeira quinzena do oitavo mês do ano, e vai logo directo para o seu último dia, “Oslo, 31 de Agosto”. Trata-se de uma obra de 2011, que foi realizada por Joachim Trier.
Logo pelo título da película, percebe-se que aquilo de que se fala é de fins, ou seja, daquilo que já findou ou está mesmo a acabar. Anders tem 34 anos, é um rapaz bonito, inteligente e proveniente de boas famílias.
Esteve ausente da sua cidade durante um bom tempo, em tratamento numa clínica de desintoxicação. Regressa a Oslo e recorda-se dos erros do passado, de quem decepcionou e das oportunidades perdidas. Tem imensas dúvidas e angústias sobre a possibilidade de para si construir um qualquer futuro.
Nesse dia 31 de Agosto em Oslo, Anders reencontra velhos amigos e conhecidos, telefona a antigas namoradas, procura um emprego e revê as ruas e o sítios que antes faziam parte da sua vida.
No início de “Oslo, 31 de agosto”, ouvimos um coro de vozes anónimas que nos dizem frases soltas, isto enquanto ao mesmo tempo, vemos uma série de imagens da capital norueguesa das década de 80 do século passado.
Tais imagens pertencem a um tempo não muito distante do nosso e, por serem ainda tão próximas, há quem nelas plenamente se reveja. Revêem-se todos aqueles que quando elas foram captadas, seriam crianças, jovens ou adolescentes. É esse o caso de Anders.
Em 2011, à data da narrativa da fita, essas crianças, jovens e adolescentes de outrora, teriam sensivelmente a mesma idade que Anders tinha, actualmente, em 2025, terão uma idade compreendida entre os 40 e muitos e os 50 e tantos. São desses, as vozes que ouvimos no início filme “Oslo, 31 de Agosto”.
As vozes falam-nos acerca das suas memórias da cidade e dizem-nos coisas como estas:
O meu pai fumava na cozinha, enquanto bebia café a ouvir o rádio
Recordo-me dos horários dos eléctricos, dos autocarros e do metro, dos longos percursos para irmos a festas bizarras para as quais podíamos ou não ter sido convidados
Lembro-me de como me sentia livre em Oslo, até ter compreendido o quão pequena era a cidade
Continuo a jogar à bola com os mesmos amigos de sempre, desde os seis anos, porque sou de Oslo
Recordo o seu riso
Evoco a sua pele
Tínhamos tanto tempo para nós
Nunca mais o vi
Ele insistia na melancolia, dizia que era mais fria do que a nostalgia
Vejamos então os minutos iniciais de “Oslo, 31 de Agosto”:
Há muita coisa a acabar em “Oslo, 31 de Agosto”, para além do Verão. Pressente-se a todo momento a atmosfera melancólica, que sempre acompanha, os caminhos que nos conduzem a epílogos. Esses passos que se dão em direção a um final, são ainda mais sombrios quando banhados pela fria e hesitante luz do Verão nórdico.
No entanto, tudo tinha começado bem para Anders. Num excerto do filme ele fala-nos dos seus pais. São muitos os recantos de Oslo associados a lembranças dos seus pais.
Recorda o momento em que o ensinaram a andar de bicicleta, quando aprendeu a usar o fio dentário e a arrumar as coisas nos seus lugares. Os seus pais fizeram-no também saber que os feitos intelectuais são superiores às façanhas desportivas, e que a privacidade, até mesmo a das celebridades, não é para ser exposta. Para além disso, prepararam-no para ser um leitor crítico, aconselharam-no a menosprezar a falta de eloquência e informaram-no que ser-se religioso é uma fraqueza, mas quanto a esta última lição, Anders tem as suas dúvidas.
Os pais ensinaram-lhe outras coisas mais, vejamos quais:
O problema de Anders é que não vê no presente, o sentido de comunidade que antes existia. Por onde quer que passe, com quem quer que fale, vê em tudo o que acontece em seu redor apenas superficialidade e conversa fiada.
Tudo à sua volta lhe parece ser lixo e uma enormidade de banalidades. A existência em comunidade sobrevive somente nas suas memórias (e nas dos outros da sua idade), a vida social é agora apenas conversa fiada, lixo, banalidades, sendo aí onde temos de viver.
Anders compara as memórias que possui, que nós, os de determinada idade também possuímos, com a actualidade, e não se adapta. Consequentemente, todo o resto do filme é sobre a rejeição que sente por parte de todos aqueles que antes eram parte da sua comunidade.
Numa das grandes cenas deste filme, Anders está sentado num café e ouve as conversas. Pessoas iguais a tantas outras falam sobre os seus sonhos e ambições, sobre os problemas do dia a dia e acerca de notícias e acontecimentos corriqueiros. Anders tudo escuta como se estivesse a ouvir vozes vindas de um outro planeta:
Como era mais do expectável, “Oslo, 31 de Agosto”, acaba mal. Toda a fita é profundamente triste, e isso é uma característica comum às gentes do extremo norte da Europa. Anteriormente, falámos de tal assunto a propósito de um outro filme, “Um Verão de Amor”, de Ingmar Bergman:
https://ifperfilxxi.blogspot.com/2025/08/neste-verao-querem-la-ver-que-ha-fitas.html
O facto é que os povos nórdicos ocupam sempre os primeiros nos rankings internacionais que medem o índice de felicidade dos países, todavia, se formos ver a sua literatura, a sua arte e os seus filmes, a sensação com que ficamos é que são pessoas muito introspectivas e profundamente melancólicas.
Dito isto, das duas uma, ou bem que a felicidade é mais parecida com a melancolia do que aquilo que habitualmente se pensa, ou então não é mensurável por índices internacionais. Em qualquer dos casos, vale a pena ver “Oslo, 31 de Agosto”.
Terminamos, em breve uma outra fita de Verão neste blog.
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