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Como fazer turismo sem sair de casa - capítulo final


Acabou-se agosto, as férias são já uma carta fora do baralho, venha de lá mais um ano de trabalho. Quem nos acompanhou durante este mês, sabe que não fomos a nenhum lado, que nos limitámos a ficar no lar e a viajar. E não foi pouco o que andámos na nossa série “Como fazer turismo sem sair de casa”, fomos a vinte lugares. Nada mau para quem de casa não saiu.

Como nos filmes, nos livros, nas séries ou telenovelas, também nós neste capítulo final vamos terminar com um “Plot twist”. Para quem não saiba, “Plot twist” é uma surpreendente reviravolta numa narrativa, que muda completamente o resultado final de uma história ficcional.


Apostamos que os nossos leitores já estão ansiosos por descobrirem a excitante surpresa final que esta nossa série lhes reserva, todavia, nós não vamos ser spoilers e revelar-vos já se o culpado é o mordomo, se o galã fica com a mocinha ou se afinal era tudo uma grande conspiração e os maus afinal é que são os bons e vice-versa, pedimo-vos um pouco de paciência.

Para já, vamos revelar-vos as razões por que ficámos em casa nas férias. Ficámos porque na verdade, viajar não é ir passear e correr mundo. No fundo, viajar é conhecermos melhor lugares que ficam bem dentro de nós próprios.
Não acreditam no que dizemos? Sonham antes com luxuosos e requintados hotéis? Se assim é, vamos lá então filosofar só para vos contrariar e vos fazer ver a realidade.

Ponhamos um exemplo: imaginemos que viajámos para um qualquer lugar da terra, andamos a passear e diante de nós se encontra um hotel de grande classe mundial, ou seja, um daqueles poucos com mais de cinco estrelas.
Não é nele que estamos alojados, pois que as nossas posses não chegam para tanto, no entanto, estamos com calor, cansados, apetece-nos sentar e repousar por um momento, assim sendo, porque não entrar?

Em teoria, qualquer um pode entrar e sentar-se no sofisticado vestíbulo do hotel com os seus sofás ornamentados, deixando-se estar a repousar por entre árabes multimilionários e gente fina da mais alta sociedade. Em teoria, pode-se até aproveitar para nos irmos refrescar e recompormos-nos nos seus esplendorosos lavabos. Contudo, a realidade é que na prática, não é tanto num hotel onde acabámos de entrar, mas mais num local dentro de nós mesmos onde iremos descobrir quem somos.

Com efeito, para que nos sentemos confortáveis em tal local, necessitaremos que a nossa auto-confiança, o sabermos quem somos, se projecte ante os numerosos porteiros, os muitos empregados e até perante os encarregados dos lavabos. Temos de nos convencer a nós mesmos e a todos os outros, que onde quer que estejamos no mundo, inclusive neste luxuoso hotel, estamos sempre no lugar certo, que é esse o nosso elemento.

Há quem perante tal desafio interior se retraia, volte para trás, saia do hotel e diga para consigo “ah…isto não é lugar para mim”. Mas os que entram, se sentam e ficam, são os que daí em diante descobrem que afinal os porteiros mais intimidantes, são os que estão no nosso interior.
E com este exemplo, já temos aqui uma espécie de mini-twist, pois fica claro que afinal viajar não é correr mundo, mas sim conhecermos o nosso eu mais profundo.

Abaixo uma imagem do histórico Grand Hotel de Viena, para o caso de alguma vez quererem ir experimentar. 


Quem não gosta de passar férias em casa, o que na verdade precisa de saber, é que para onde quer que viaje, o céu é sempre azul. Há quem sonhe com cidades distantes, mas o que de mais importante há para descobrirmos numa cidade que fica longe, é aquilo que já sabíamos antes sequer de termos saído de casa.

Sobre este ponto não vamos filosofar, vamos antes contar-vos uma história. Um dia, no fim de um domingo frio, caminhávamos junto ao Sena. Era a primeira vez que estávamos em Paris. Chovia e quase tudo se encontrava de portas fechadas.
Já tínhamos visitado os locais “obrigatórios”, a Torre Eiffel, o Louvre e Versalhes. Sem sabermos porquê, seguimos por uma rua perpendicular ao rio e entrámos num qualquer modesto bistrot, cujo único prato que servia era sopa de cebola.
Estava quente, aconchegou-nos. Pensámos então, uma mera sopa de cebola, o Sena, um bistrot, isto sim é verdadeiramente Paris. Soube-nos exatamente ao mesmo que uma outra sopa quente, talvez a uma canja ou a um caldo verde, que há muitos anos, ainda em pequenos, a nossa avó nos tinha servido, também num dia de chuva e de frio.

E cá está, mais outro mini-twist, fomos nós a Paris para comer uma sopa de cebola, só para constatarmos que já muito antes tínhamos comido uma outra igual e termos uma espécie de flashback.

Deixamo-vos um site com as melhores sopas de cebola de Paris, a preços muito acessíveis, mas não tanto como a que podemos cozinhar sem sair de casa:


Dito isto, bem sabermos que ficar em casa tanto nos pode asfixiar como nos pode libertar, mas porquê? Porque pode um mesmo sitio ter tão distintos efeitos? Pode porque a mente também é uma casa e, em primeira e última instância, é nessa em que efetivamente residimos, a nossa habitação permanente. Em todas as outras estamos de passagem, seja lá qual o lugar do mundo em que estivermos.


Aqui chegados, vem então o “Plot twist” final: nestas férias não estivemos nada fechados em casa, passámos por aeroportos, usámos passaportes, fomos à praia, comer fora e tudo o mais. No entanto, ainda assim, conseguimos viajar mentalmente em agosto por lugares onde neste agosto nunca fomos e foi com isso que escrevemos estes nossos textos desta série de verão “Como fazer turismo sem sair de casa”.

Desta não estavam à espera, pois não? Digam lá se não tiveram um choque? É ou não um “Plot twist” final digno de Hitchcock?

Mas mesmo para terminar, Le Grand Finale. Tal como no circo, chamamos à arena todos os vinte que participaram no espectáculo:




















e



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